28 de junho de 2008

O País



De regresso, moderado e lento, vejo que o País continua caótico. Graças a Deus e a Sócrates. Pretencioso, cheguei a pensar que poderia melhorar com a minha ausência. E carrilar definitivamente se eu conseguisse um exílio em Bruxelas como impedido do Dr José Manuel Barroso e, como ele, me afastasse. Pura ilusão! Tudo continua na mesma, para pior. A única coisa que segue, imparável, na senda do progresso é a crise. Crise daqui, dali e dacoli. Ao arrepio do ministro da economia, dos seus arrepiantes decretos a por-lhe termo e dos muitos cavalos dos seus automóveis de serviço. E não só.

De resto, pouco ou nada mudou. De Bruxelas o Dr Barroso assegura aos seus amigos que o País só não é dos mais desenvolvidos do mundo porque ele próprio se impediu de completar o mandato e, de seguida, o seu compadre Santana foi posto na rua exactamente quando preparava em S. Bento a última ceia com as debutantes da linha, para dar início às festividades comemorativas. De cócoras, a neutralidade Suiça treme só de saber que ele o diz e teme sentir-se ao nível do Biafra se ele o fizer. A norte a Noruega maldiz a sorte madrasta de ter recusado a União Europeia e o governo irlandês pede desculpas pelo referendo e pelos resultados a que este levou, seguramente sem efeito e sem futuro. Porque a Europa é mais uma moradia unifamiliar, num loteamento de arrabalde, projectada para os lados do Fundão, do que uma cruz mal desenhada pelo eleitor irlandês num boletim de voto.

Entrementes pode parecer que o País terá perdido um seleccionador de futebol, o que não é verdade. O homem até é brasileiro, não ratificou o acordo ortográfico, tem apelido meio italiano e escreve o nome horrorosamente com um e: Felipe. Como se isto pudesse ser questão a incluir no programa "Em bom português", nos exames finais do ensino secundário ou nos chás de menta da socialite de Cascais. O País nem sequer perdeu um jogo com a Alemanha, um conjunto de rapazes altos, louros e brutos que, ao abrigo das leis europeias, às vezes vão a repouso ou a outras porcarias aos apartamentos da Quinta do Lago. O País pura e simplesmente foi espoliado quando a pessoa indicada para convocar os jogadores adversários e nomear os árbitros está, como se sabe do Minho a Timor, subaproveitada a dirigir a Câmara de Gondomar. Uma terra que se não sabe bem onde fica, tinha há poucos anos apenas um estreito carreiro que a ligava ao Porto e ao Sr Pinto da Costa e exibia a incompreensível notoriedade de realizar um concurso anual de sopa de nabos.

A educação continua confiada à mesma senhora ministra, uma espécie zoológica rara mas inteligente, ainda por classificar, e que acumula reformas. Como funcionária, em milhares de euros. Como política em centenas de decretos e milhares de disparates que nem mesmo os primatas mais dotados de Sete Rios, com a melhor das boas vontades, conseguem entender. Apesar dos três períodos escolares, do rigor dos exames de avaliação e dos seis frascos de Centrum. Proclamou a senhora ministra, e bem, que os alunos têm direito ao sucesso, a aprender sem o auxílio de livros, a prescindir e mesmo a denunciar os professores sem experiência e sem currículo como o Dr Louçã. Determinou ainda, e bem, que fossem excluídos da correcção dos exames todos os professores cujas notas, por eufemismo, se afastassem da média mais que um indefeso cagagésimo, fosse por defeito, fosse por excesso. No próximo ano, testados os procedimentos e rodados os carros de alta cilindrada do seu gabinete, a senhora ministra, à altura já zoologicamente classificada segundo se espera, determinará também a exclusão dos professores cujas notas se afastem e cujas notas se não afastem de todas as médias. Cada aluno terá direito ao sucesso que desejar, feito à sua medida, como os fatos que os alfaiates antigamente costuravam. Para rigor e perfeição do sistema!

11 de junho de 2008

O Jorge. O regresso.

O Jorge é um amigo de longe, no tempo e na geografia. E, por isso, não se explica. Por mais longos que sejam os silêncios entre nós, abriu-me a mão sempre que precisei dela. E eu, como a generalidade dos outros, apenas me lembro de Santa Bárbara quando se ouvem os trovões. Foi assim um ano atrás, quando lhe liguei a pedir ajuda. Foi assim há nove meses quando minha mãe me deixou orfão, e ainda hoje me parece que foi ontem. Foi assim quando por aí afixou um comentário a querer saber de mim. Trocámos mensagens de mail em menos de meia hora, falámo-nos em cerca de uma. Fez, mais uma vez, o que sempre tem feito. No dia seguinte, ou ainda no mesmo, lágrimas salgadas vieram-me aos olhos só de pensar nisso, só de o contar a quem estava perto de mim. Os tempos modernos de um feroz e injusto neo-liberalismo, seja lá isso aquilo que o ministro das finanças disser que é, não são fertéis em amizades que não abracem o interesse material, de preferência convertível em euros. E amizades destas são hoje parte de uma pre-história que a minha geração, felizmente, viveu. Despreocupada e feliz. Foram tempos de negritude. Foram tempos de humanismo.

O regresso, para o qual quero arranjar força e motivação. Fará, para já, com que o Cabo Raso entre em obras de restauro ou, como é de uso corrente e se calhar do acordo ortográfico, de requalificação. À capa de tal palavrão, dois celebrados arquitectos nortenhos e um invertebrado economista, transformaram a Avenida dos Aliados, na invicta cidade, numa autêntica pedreira com um tanque de lavar roupa a meio a que pretenciosamente chamaram espelho de água. Sem nunca terem passado por Mateus. O Cabo Raso começou por ser um divertimento, e feliz seria eu se conseguisse que o fosse para mim e para alguma meia dúzia de incautos leitores que, por desígnios do destino, aqui hão-de aportar. O reinício começa pela escolha de um novo modelo e pela consequente eliminação de todas as ligações que existiam. Esse facto não significa o abandono de nada nem de ninguém e uma lista de ligações, provavelmente menos extensa, irá sendo progressivamente construída. Porque, apesar de tudo, eu "conheci" pessoas neste meio de que gosto muito e cujo trabalho tenho em grande apreço. Não vou enumerá-las, para além de inconsequente isso seria deselegante ou grosseiro. Mas vou fazer por poder continuar a contar com elas. Porque também elas, todas, podem contar comigo.

Obrigado Jorge. Um apertado abraço!