17 de março de 2004

Os políticos não apresentam as declarações de fortuna por vergonha

Muitas vezes me tenho feito a pergunta. No silêncio intranquilo a acabrunhado de não querer ser inconveniente em relação a quem me representa, a troco de um ordenado medíocre, com reforma para subsistir apenas ao fim de uma dezena de anos de dedicado e intenso trabalho, tendo como mordomias apenas algumas viagens de comboio e alguns convites para o futebol. Fazendo-o desinteressadamente, sem me conhecer e sem saber quem eu sou, o que faço ou até onde moro. Perante o país, o mundo e as regiões autónomas da Madeira e dos Açores. Mesmo hoje ouso pôr a questão, mas faço-o num sussurro, escrevendo as inquietações em letras pequeninas, despercebidamente, ilegíveis para qualquer míope com duas dioptrias, quando julgo ter encontrado parte da resposta.

São os nossos políticos a fazer as leis que, na sua iluminada perspectiva, mais e melhor acautelam os nossos interesses de cidadãos comuns. Fizeram algumas, que não revogaram, sobre a obrigatoriedade dos detentores de cargos políticos apresentarem, anualmente, manifestos da sua acumulada miséria, porque ninguém acreditaria que fossem ricos. Mantém-se o hábito, sem penalização, de seguir a tradição do país e de não o fazerem apenas pelo prazer do ilícito e do risco. Como se fossem todos os elementos da academia de Coimbra, reunidos em plenário ao ar livre, na Praça da República, a virar-nos os rabos, baixarem as calças e mostrarem os cus alvos e mimosos onde se poderia ler, de cu a cu, escrito a marcador vermelho sobre as nádegas de leitão pronto para a matança: não pagamos!

Creio ter hoje descoberto, finalmente, grande parte da resposta. Quando o professor Marcelo Rebelo de Sousa - o mesmo daquela série semanal da TVI que passa aos domingos à noite, a meio das notícias, e que põe meio país de olhos no televisor e outro meio com pânico de olhar para ele - abre o livro e conta, de fio a pavio, o que ganha, como o ganha e onde o gasta. Depois disto eu próprio seguiria os mesmos procedimentos dos políticos. Por vergonha não apresentaria o tal manifesto, perfeitamente arrasador. Alguém compreenderia que um político eleito pudesse levar seis meses para ganhar aquilo que o professor Marcelo arrecada num mês? Claro que não, porque é uma ignomínia. Um atentado à condição de político. De nada tendo valido, até hoje, as reclamações do Dr Almeida Santos sobre o assunto. E ainda diz que são líquidos de descontos e lhe sobra tempo para os torneios de ténis, de Wimbledom a Roland Garros! Porra que é mesmo javardar os gajos!

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