6 de fevereiro de 2024

Talvez fosse Setembro

Talvez fosse Setembro quando, depois do cacimbo, os dias começam a aquecer. Ia a meio a tarde tranquila e eu, do primeiro andar, podia ver o trânsito fluindo à volta do largo. Não sei se a visita foi ou não anunciada, de tão surpreendente que seria para sempre. Fosse-o ou não, isso seria irrelevante naquele momento e em todos os outros pelos anos fora. Quando entraste não sei o que aconteceu, mas ali perdi a memória de tudo sem que, com isso, adquirisse consciência de nada. Nada me privou da voz, não senti que o sangue se me tivesse acelerado nas veias, não creio que o calor do dia tivesse subido de repente. Mas invadiu-me uma calma que me era estranha, um fascínio tranquilo que me trazia um mundo novo que eu nunca antes descobrira ou imaginara. A nossa vida, de todo, mudava ali, para um longo percurso sem destino e sem tempo definido.

Penso que não houve palavras, nem eu fui capaz de dizê-las nem tu tão pouco tiveste tempo para escutá-las. Calados, ambos descobríamos, de repente, que os sentimentos mais espontâneos não precisam de palavras, não exigem esclarecimentos, não carecem de justificações. Nem sequer precisam de tempo. Por encanto, nunca antes nos víramos e concluíamos que sempre nos conhecêramos, que sempre estivéramos juntos em toda a parte. Silenciosa, nem sequer te mexeste quando me levantei e fui lentamente ao teu encontro. Mantiveste firme a tua figura jovem e franzina, de sorriso ligeiro, como se o mundo tivesse parado para que nos olhássemos nos olhos. Olhamo-nos, e ficaste à espera do abraço e do beijo terno que depositei sobre os teus lábios finos e juvenis. Foste estendendo a mão pequena para que eu a encontrasse e para que a pudesse estreitar contra o meu peito. Foi um beijo definitivo, para sempre, por mais distantes que, a partir dali, fossem os nossos caminhos e os nossos destinos. Num dia futuro, decerto, teria de haver uma nova tarde e um novo Setembro, algures, fosse quando fosse, fosse onde fosse. Aquele encontro fora único e eterno. E o que é eterno é para sempre!

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