19 de outubro de 2004

A quase eslovaca saúde dos portugueses

Ouço numa qualquer emissora de rádio, daquelas que o destino e o marketing, para mal dos nossos pecados, põem sempre perto de nós, que na Europa apenas os trabalhadores da Eslováquia descontam mais do que os portugueses quando se encontram doentes. Quer dizer, recebem menos comparativamente com o que lhes é pago quando estão sãos como um pêro de Alcobaça.

No caso português isso nem comove nem preocupa. O português é, por ascendência e pedigree, mais do que saudável. Habitualmente nasce escorreito, mesmo que numa ambulância que presumivelmente se encaminhava com a mãe, em trabalho de parto, para uma maternidade ou um centro de saúde. Não padece de doenças congénitas e é temente a Deus como muito bem recomenda aquele italiano que o Dr José Barroso quer como comissário. A tísica foi um problema de saúde pública, foi quase extinta com a repressão que lhe foi movida pelo estado novo, está mais ou menos de volta sem que se possa dizer que tenha voltado a ser problema que roube espaço à importância da habilidade para a horticultura da D. Cinha.

Mesmo não sendo muitas vezes incluídos nas estatísticas, os casos de sida são diminutos. Ainda que os portugueses, por convicção e patriotismo, não utilizem preservativos. Melhor do que isso: abstêm-se! Não caiem nas calçadas, não metem os pés nos buracos das ruas, não têm nevralgias com o dia de S. senhorio ao dia oito e os hipermercados do engenheiro Belmiro, avisadamente, não vendem a crédito e não aceitam cheques que não sejam visados.

O português é tão saudável que o ministro da saúde reduz a comparticipação nos medicamentos, o Dr Cordeiro acha que as farmácias acabarão a vender revistas do coração e a aceitar apostas do totoloto e a fasquia para ingresso nas faculdades de medicina é intencionalmente alta para prevenir o desemprego futuro. Os poucos jovens médicos que terminam o internato alistam-se nos médicos sem fronteiras e viajam pelo mundo a prescrever vacinas contra a febre amarela e gotas para o nariz.. Os hospitais não têm listas de espera, a não ser de médicos à procura de primeiro emprego ou de um contrato a prazo por seis meses. Mesmo a limpeza é realizada por empresas externas e, pior do que isso, há muito pouco para limpar. Os doentes portugueses são poucos, recebem mal e são exemplarmente asseados.

Só por isso e só agora, por ironia do destino, descubro porque se usa dizer "vai morrer longe". Em Portugal, com tão resoluta saúde, é de facto difícil morrer-se. Como na Eslováquia, somos uma sociedade saudável que não necessita de grandes subsídios quando adoece. Apenas porque não adoece!

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