4 de novembro de 2004

Velha senhora abandonada sem abrigo

É triste completar a vetusta idade de 127 anos e estar na rua, sem telha que a abrigue, exposta à canícula de sucessivos verões e aos frios de desfiados invernos. É triste ter servido tudo e todos, mesmo quando os anos lhe começaram a pesar e as forças lhe foram faltando. É triste ver-se contemplada com o título de monumento nacional quando a aristocracia já vivia de lembranças, recordações e falta de liquidez. É triste ser escarnecida por miúdos de sapatilhas rotas e narizes ranhosos, atirando-lhe pedras e insultos. É triste que mesmo a seu lado, do alto do seu novo-riquismo, a sua nova vizinha tivesse permitido que o professor Edgar Cardoso lhe tivesse mijado para cima em plena cerimónia de inauguração. E que continue a desdenhá-la dia a dia, hora a hora, há mais de 13 anos.

A ponte de Maria Pia completa hoje 127 anos de vida. Sem glória, sem préstimo, sem utilização. Foi abandonada como traste velho que se não quer. Teve-se em 1996 a ideia de criar um comboio turístico entre a Alfândega do Porto e a estação de General Torres, em Gaia. O orçamento para a empreitada era de 8 milhões de euros, previa-se a entrada em funcionamento em 1998, a tempo da Cimeira Ibero-Americana. Essa data foi depois adiada para o ano de 2000 que, pelo calendário que se usa na Câmara Municipal do Porto, ainda não chegou. Nem se sabe se algum dia chegará.

Em 1997 um empresário alemão, louco e fugido a qualquer desconhecido hospício das margens do Reno, apresentou um projecto para uma linha de eléctrico que ligasse o Palácio de Cristal ao Convento de Santo António, em Gaia. Não passaram à história, nem o alemão, nem o projecto. Na Câmara não se falam línguas, ninguém sabe linguagem gestual, o entendimento é coisa de surrealistas. O máximo que se sabe é ceder terrenos, assinar licenças de construção, arrecadar emolumentos e assobiar para o lado.

O PDM do Porto chegou a incluir uma circular de eléctrico entre esta cidade e Gaia, cruzando a ponte. A ideia foi abandonada, chegou a falar-se no metro mas conclui-se que não tinha condições. O metro há-de um dia cruzar o tabuleiro superior da ponte de Luiz I, os eléctricos hão-de cruzar a ponte de Maria Pia com o mesmo garbo com que descem a Rua de 31 de Janeiro e com o mesmo risco radical com que aterram na Praça de D. João I. O projecto mais recente é o da adaptação do tabuleiro da ponte a pista ciclo-pedonal. O protocolo foi assinado em Março passado pelo ministro das Obras Públicas, as câmaras do Porto e Gaia e a Refer. O ministro mudou, os presidentes das câmaras não se falam, a Refer é um sorvedouro de dinheiros públicos de tal forma que é o cidadão que tem de pagar os ordenados aos administradores e garantir as mordomias inerentes àquilo a que chamam a dignidade dos cargos.

2 Comentários:

Às 5:42 da tarde , Anonymous Anónimo disse...

Deveriam tratar as pontes com mais respeito. Elas unem mundos.

 
Às 5:43 da tarde , Anonymous Anónimo disse...

Deveriam tratar as pontes com mais respeito. Elas unem mundos.

avery.blogspot.com

 

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