Os incendiários da estrada
Quando os incêndios dispararam, no Verão passado, toda a gente estava de férias. A começar pelo governo, pela oposição e pela Assembleia da República. Todos tiveram dificuldades em perceber a situação e tarde se voltaram para ela. Não revestia, naturalmente, a importância da inauguração de um qualquer estádio de futebol. Mesmo que fosse apenas para que, para já, se treinasse o ministro Arnault, como hoje aconteceu no de Faro e Loulé. Alguém disse mesmo que as consequências dos incêndios tinham sido irrelevantes, apenas um reduzido número de pessoas tinha perdido a vida. A grande maioria continuava felizmente viva.
Agora, sem a divulgação dos resultados dos milhentos inquéritos em que somos pródigos, pela calada e à má fila, o governo proclama que os culpados são os incendiários da estrada, vulgarmente conhecidos por automobilistas e perseguidos pela brigada de trânsito por excesso de velocidade.
As circunstâncias em que os condena são transparentes e normais, à semelhança de tudo o que usualmente faz. Só que, desta vez, estranhamente, dou por mim a aceitar a situação e a manifestar-me solidário com ela. De facto somos os culpados, e incluo-me porque também ando, às vezes, nas estradas. Outras, como a maioria, limito-me a engrossar as filas de espera e a fazer gincana no meio das obras permanentes que a Brisa vai tentando realizar para nosso conforto e comodidade. Enquanto pagamos as portagens por inteiro.
Portanto a responsabilidade está bem atribuída. Porque de facto as estradas andam muitas vezes pelo meio da floresta, esmagam insectos, assustam animais, derrubam árvores, pintam de negro a serra d’Aire e Candeeiros. Criam condições para que ocorram acidentes, haja mortos e feridos, se percam viaturas com prejuízo para os proprietários e para as companhias de seguros. Com que benefícios? Apenas o do ministro das obras públicas cortar uma fita e percorrer o troço inaugurado sem radar a controlar-lhe a velocidade.
Depois uns cêntimos de aumento no preço dos combustíveis nem aquecem, nem arrefecem. Assim por assim, já estamos habituados a que isso aconteça com tudo. E, pelo menos, no preço dos combustíveis não somos de certeza os últimos da Europa. Era o que faltava, pelintras!
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