20 de janeiro de 2004

O Metro e as casas de banho

Quase sou tentado a dizer que a situação me persegue como uma fatalidade. Sempre! Quando começo a acomodar-me, a sentir-me mais tranquilo, a encostar-me ao conforto de já ter visto tanto desconforto e a pensar que pouco ou nada há já que possa surpreender-me, de repente, a depressão sobrevem-me. Sinto-a como a frustração que de facto é porque, afinal, o país me surpreende de novo. Corro à farmácia, sem receita médica, a valer-me de conhecimentos antigos e da persuasão que o engenheiro Guterres punha nas palavras, - penso eu, coitado de mim! - a comprar calmantes e comprimidos de ludiomil para dormir.

O Metropolitano de Lisboa. Sem casas de banho!Ainda agora, quando tudo parecia correr tão bem! Quando o major Loureiro, pequenino porque nem os múltiplos cargos que exerce o fizeram crescer mais, esbracejando como é seu hábito, dizia com gritos de muito zangado que o futebol era o que o país tinha de mais exemplar. Quando passados dois dias o mesmo, pela interposta intervenção do filho, elogiava na sala de imprensa do novo estádio da Luz a actuação do árbitro que se limitou a expulsar-lhe dois jogadores. Quando o treinador Mourinho publicamente dizia que o resultado de um a zero ao Braga valia mais do que ser o melhor treinador da Uefa que ele e os seus amigos tinham escolhido pela internet e depois pimba, vai lá ganhar-lhes por três secos. Quando tudo isso me deixava indiferente de todo vêm as casas de banho do Metro de Lisboa. Todas encerradas por falta de segurança.

E qual seria a falta de segurança, questionei-me naturalmente. Isto porque pensava que ninguém, de bexiga cheia ou com cólicas de eminente descarga diarreica, pudesse ser perigoso fosse para o que fosse e fosse para quem fosse. Afinal a fonte - que não a das Sete Bicas, que é na Senhora da Hora! - do Metropolitano de Lisboa adiantou, em segredo e sem revelar o nome, que aquelas instalações eram sobretudo usadas para actos de vandalismo, toxicodependência e mendicidade, pondo em causa a segurança dos utentes. Quer dizer, estava um gajo lá fechado dentro, à rasca de todo, espremendo-se, e vinha de lá um vândalo a rasgar-lhe as calças por debaixo da porta e a cortar-lhe a biqueira dos sapatos. Ou punha-se-lhe um toxicodependente a fumar marijuana à porta ou um mendigo a pedir a moeda para o copo. Só podia ser e, inseguro, não creio que alguém consiga arrear o calhau com a pontaria devida, por mais apertado que esteja. O que também, naturalmente, acabaria a vandalizar as paredes e a pintura, danificando o património da empresa, que é pública.

No Porto, e nem eu pensava que iria chegar aqui e ao desempenho do major como gestor, a situação é diferente porque as estações são à superfície. O Metro do Porto, como metro que é, corre pelas entranhas da terra, tão fundo como na estação do Parque, em Lisboa, para não irmos nem mais longe, nem mais fundo. Depois volta à superfície, quando se encontra com as estações, por causa das casas de banho cuja construção, assim sendo, se não justifica e deixa a obra - de construção - com menores custos e mais curtos desvios. Quanto aos passageiros em aflições, encostam-se disfarçadamente a qualquer parede ou, furtivamente, agacham-se dois metros adentro de qualquer túnel que esteja à mão e baixam as calças. Os pormenores não foram descuidados e, de novo, as coisas surpreendem-me. O que virá a seguir, sabendo-se agora que quem for para o mar se deve aviar em terra. A menos que passe pela estação da Casa da Música, que essa até tem casa de banho. Para os violinistas!


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