O país fora de prazo
O país habituou-se e habituou-nos a funcionar assim: fora de prazo. É uma questão congénita, atávica, nada pode acontecer dentro dos limites. Perde o sabor, reduz-nos a adrenalina, equipara-nos a louros nórdicos que funcionam a horas, como relógios suiços. Temos que começar assim o dia para que este corra bem, levantarmo-nos mais tarde, ficarmos encravados nas filas de trânsito ou apanharmos os transportes públicos com atrazo para também chegarmos atrazados aos empregos, aos encontros profissionais ou de amigos, até mesmo a outros encontros, mais ocasionais e mais fortuitos.
Não é uma questão pessoal, é definitivamente a única consciência colectiva que adquirimos em novecentos anos de história. Essa é uma das características que mais nos identifica como país, é um dos nossos sinais particulares que nenhuma micro-cirurgia consegue remover. Funcionamos sempre a correr, mesmo para irmos em último lugar. Apresentamo-nos anualmente nos serviços de finanças a entregar as declarações fiscais no limite ou mesmo fora de prazo e dizemos que isso é ser português. Mas, já antes disso, e todos os anos, é também português o desaforo das próprias finanças alterarem todos os impressos que temos que preencher e porem-nos à venda - porque nada é gratuito - quando já deveriam estar entregues.
É espantoso - e perfeitamente anormal - que o professor Manuel Antunes, em Coimbra, consiga que os seus serviços façam uns milhares de cirurgias e não tenha listas de espera, sendo um serviço público. A cura de todos os males, ensinam-nos os nossos mais diversos responsáveis, é a opção pelo que é privado. Tudo o que é público é mau e ineficaz, à custa do contribuinte. A solução: privatizar! E assim tem sido ou assim foi que se privatizou a Portugal Telecom, a EDP, a Brisa e por aí fora. Para que os lucros revertessem por inteiro a favor de privados, para que passassem a funcionar pior para maximizarem resultados e para que nós, contribuintes, continuássemos a pagar o que de facto dava e dá vultuosos prejuízos. Exemplos? A CP, a Carris, a STCP, a TAP e chega.
Se a rotina não é cumprida o país preocupa-se e o cidadão amedronta-se. Pensa que, de todo, a Espanha já tomou conta de tudo e já nada nos salva de comermos as suas batatas e as suas cebolas, de vestirmos os seus trapos e de calçarmos os seus xanatos. Pensamos que o país já é Olivença de Monção a Vila Real de Santo António, sob administração castelhana. Ainda agora! No processo da Casa Pia com que acabou o ano velho e se iniciou o ano novo. Com alguma antecedência em relação ao termo do prazo legal o Ministério Público deduziu a acusação contra uma conhecida série de arguidos. Mesmo assim, depois de ter pessoas detidas preventivamente há mais de dez meses, sem culpa formada. Segundo transcrição do Público de hoje, já Mário Ramires, no Expresso de ontem, proclamava que o Ministério Público tinha sido célere. A celeridade aumenta-nos perigosamente a frequência cardíaca, faz-nos suar em bica, põe em risco a prudência com que estamos habituados a pedir licença a um pé para mexermos o outro. Podemos fazer mal e tê-lo feito devagar. Mas nunca corremos o risco de o fazermos bem e de o termos feito depressa. Por causa do "stress" que, por lentidão, ainda não conseguimos traduzir para português!
Não é uma questão pessoal, é definitivamente a única consciência colectiva que adquirimos em novecentos anos de história. Essa é uma das características que mais nos identifica como país, é um dos nossos sinais particulares que nenhuma micro-cirurgia consegue remover. Funcionamos sempre a correr, mesmo para irmos em último lugar. Apresentamo-nos anualmente nos serviços de finanças a entregar as declarações fiscais no limite ou mesmo fora de prazo e dizemos que isso é ser português. Mas, já antes disso, e todos os anos, é também português o desaforo das próprias finanças alterarem todos os impressos que temos que preencher e porem-nos à venda - porque nada é gratuito - quando já deveriam estar entregues.
É espantoso - e perfeitamente anormal - que o professor Manuel Antunes, em Coimbra, consiga que os seus serviços façam uns milhares de cirurgias e não tenha listas de espera, sendo um serviço público. A cura de todos os males, ensinam-nos os nossos mais diversos responsáveis, é a opção pelo que é privado. Tudo o que é público é mau e ineficaz, à custa do contribuinte. A solução: privatizar! E assim tem sido ou assim foi que se privatizou a Portugal Telecom, a EDP, a Brisa e por aí fora. Para que os lucros revertessem por inteiro a favor de privados, para que passassem a funcionar pior para maximizarem resultados e para que nós, contribuintes, continuássemos a pagar o que de facto dava e dá vultuosos prejuízos. Exemplos? A CP, a Carris, a STCP, a TAP e chega.
Se a rotina não é cumprida o país preocupa-se e o cidadão amedronta-se. Pensa que, de todo, a Espanha já tomou conta de tudo e já nada nos salva de comermos as suas batatas e as suas cebolas, de vestirmos os seus trapos e de calçarmos os seus xanatos. Pensamos que o país já é Olivença de Monção a Vila Real de Santo António, sob administração castelhana. Ainda agora! No processo da Casa Pia com que acabou o ano velho e se iniciou o ano novo. Com alguma antecedência em relação ao termo do prazo legal o Ministério Público deduziu a acusação contra uma conhecida série de arguidos. Mesmo assim, depois de ter pessoas detidas preventivamente há mais de dez meses, sem culpa formada. Segundo transcrição do Público de hoje, já Mário Ramires, no Expresso de ontem, proclamava que o Ministério Público tinha sido célere. A celeridade aumenta-nos perigosamente a frequência cardíaca, faz-nos suar em bica, põe em risco a prudência com que estamos habituados a pedir licença a um pé para mexermos o outro. Podemos fazer mal e tê-lo feito devagar. Mas nunca corremos o risco de o fazermos bem e de o termos feito depressa. Por causa do "stress" que, por lentidão, ainda não conseguimos traduzir para português!
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