30 de dezembro de 2004

Angola e petróleo

Em primeiro lugar. Correspondendo amavelmente a um convite que lhe enderecei o Dito Cujo veio de visita ao Cabo Raso. Foi e será sempre bem-vindo quem, como reza um velho adágio, vier por bem. O blogue é público, os comentários estão e estarão abertos, quem tiver a gentileza de por aqui passar pode ler o que entender e deixar os comentários que lhe aprouver. À semelhança, aliás, do que eu próprio vou fazendo pelos recantos da blogosfera que já fazem parte da minha carta de prego. Mais do que deixar o seu comentário este amigo - seja-me perdoada a liberdade! - deu-lhe inclusivamente a exposição de um post autónomo. Ambas as acções se agradecem.

Em segundo lugar. Quando em Outubro de 2003 me aventurei nesta estranha coisa dos blogues não sabia nem o que eram e repetidamente perguntei para que serviam. Recordo-me de ter deixado um comentário num post do Barnabé e de ter ganho uma visita e, creio, o meu primeiro linque na coluna da esquerda - mesmo que ali não haja nem colunas do centro e muito menos da direita! - do blogue milionário. Não quer isto dizer que hoje saiba, mas pelo menos sempre são menos as dúvidas. E, em minha opinião, um blogue também serve para isto. Para trocar impressões, manifestar ideias, defendê-las. Por mim, e por temperamento, tentando a ironia e o sarcasmo relativamente a cada um dos pouco esperançosos dias que vivemos. Sem perder de vista a utopia e o sonho, sendo que este comanda a vida e, isso deixando de acontecer, a vida fina-se.

Em terceiro lugar. Um esclarecimento de índole estritamente pessoal. Angola não me é um país de todo estranho. Não sendo angolano de nascimento morrerei sendo-o do coração. Quase que lá dei os primeiros passos, frequentei as diversas escolas, tive os meus namoricos, nasceram-me os filhos. Bebi água do Bengo, comi cacussos pescados nas lagoas do Panguila e grelhados nos fogareiros do Letra. Fiz, deixei e conservo amigos. Uns do lá de cá, outros do lado de lá. Frequentemente repito uma curta frase de Camus em que se diz que em África o mar e o sol são de graça. Para acrescentar que é preciso conhecer África para entender a densidade de uma tão curta frase.

Em quarto lugar o comentário e o post do Dito Cujo, propriamente ditos. Não foi minha intenção sugerir que as receitas do petróleo fossem ou pudessem ser igualitariamente distribuídas por cada angolano. Creio ter corrido o risco de ser mal entendido e de, de facto, o ter sido. Mas essas receitas, públicas ou privadas, são geradas em Angola e era em Angola que deveriam ser aplicadas. O que é que o Estado angolano de facto arrecada, quanto fica retido no exterior à ordem de particulares, quanto entra nas contas do Estado são pormenores com que me não preocupo muito face à dimensão do descalabro. Não são José Eduardo dos Santos e o seu mais próximo círculo de amigos que o arrebanham todo mas são, seguramente, os que arrebanham a maior parte. A administração em funções é corrupta? Sem dúvida, da mesma forma que o seria outra se fosse diferente e o será certamente a que se seguir a esta.

Conheci bem o enclave de Cabinda, na altura com cerca de 120.000 habitantes, e o campo petrolífero do Malembo, sendo certo que toda a exploração, concessionada à Gulf Oil, era "offshore". A exploração estendeu-se a território angolano propriamente dito e, ao que sei, os jazigos foram sendo progressivamente localizados ao longo de quase toda a orla costeira. Quanto aos diamantes, cuja exploração esteve entregue à Diamang, em regime de exclusividade, na zona da Lunda, foi repartida - como aliás acontece com o petróleo - por outras empresas enquanto, como se sabe, o triunfo foi do garimpo e o enriquecimento do cacique.

Não creio que deva o sacrificado povo angolano aspirar a ficar rico. Como o não deve aspirar o povo saudita, iraquiano ou venezuelano. Angola é um país potencialmente rico com um povo extraordinariamente pobre, concentrando-se nas cidades, esgravatando as lixeiras à procura de sustento e deixando morrer crianças à míngua de alimento. Como a Suiça é um país pobre, sem recursos naturais, com um quarto do seu território coberto por neves eternas, cujo povo acaba por ter um invejável nível de vida, com as necessidades primárias perfeitamente satisfeitas.

Em penúltimo lugar. Coincidimos no essencial e não vislumbro, pela minha parte, divergências de maior. O investimento - já agora, lá como cá, salvaguardando aspectos específicos - deve de facto ser feito no futuro, naquilo que não dá votos nas próximas eleições, naquilo que reduz um pouco a capacidade de compra dos melhores champanhes franceses, naquilo que reduz os índices de mortalidade infantil e que prolonga a esperança matemática de vida para lá dos 40 anos.

Em último lugar. Quero referir o último parágrafo apenas para salientar que expressamente, e no bom sentido, o ignoro. Porque nunca o pensei, não o penso e não virei a pensá-lo. As opiniões de quem o pensa são, a meu ver, perfeitamente dispensáveis: estão completamente a leste dos problemas, devem ser pura e simplesmente menosprezadas.

A questão é complexa. O raciocínio e o alinhamento defeituosos. Um blogue é escrito assim: no fim da navalha, pendurado no trapézio sem rede de segurança. Se for preciso outros posts haverá para corrigir ou acrescentar factores que possam contribuir para melhorar o conjunto. Desculpo-me por isso. E sem favor ou reconhecimento tomo a liberdade de incluir o Dito Cujo na minha lista de linques.

1 Comentários:

Às 10:31 da tarde , Blogger mfc disse...

Olha, um grande (enorme) 2005.
...com tudo de bom !

 

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