28 de janeiro de 2005

Galhardetes

Em artigo que ainda não li, o professor Freitas do Amaral parece ter anunciado que ia votar PS nas legislativas do próximo dia 20. Creio que assim a modos de, quando confrontados com dois males, manda o bom senso que se escolha o menor deles, não vá a gente aleijar-se mais do que o necessário. E quanto a isso, estamos conversados, já que se não podem exigir outros candidatos, outros programas ou mesmo outras eleições.

Os galhardetes não se fizeram esperar. Primeiro da boca de José Sócrates, um género de homem tipo Barbbie, em que tudo parece de plástico, vazio e distante como nesses robots de brincadeira com que a canalha com maior poder de compra entretém os seus momentos. Deve ser defeito meu, mas as palavras, para além do sentido, devem também levar alguma coisa de sentimento. As dele têm o sentido oficial do que o partido entende como correcto e a emoção forte da indiferença com que nos atendem nas urgências dos hospitais e nos receitam aspirina para os males da próstata. Não me inspiram nenhuma confiança, não têm vida para além das cordas vocais que as produzem. Mas adiante! Sócrates, como eu dizia antes, veio logo agradecer o apoio, salientar a coerência e a independência do professor, invocar a devoção que manifestava em relação aos interesses do país, à retoma e ao controlo das contas públicas. Da mesma maneira que, ainda antes de ontem lhe criticava o inverso. Os boatos ou as notícias - que a diferença é cada vez mais difícil de estabelecer! - logo divulgaram o almoço numa chafarica da Rua das Pretas, o tinto do Redondo, o café Delta. E adiantaram a possibilidade do professor ser ministeriável, como o é o Dr. Mário Soares e a sua excelsa esposa. Ou até mesmo a candidatura a Belém, para suceder ao Dr. Sampaio, caso o engenheiro Guterres ande a pregar o socialismo e a cantar a internacional, não aceite as mordomias do cargo e não suporte o teor de cloro da água do jacuzzi que vão instalar para massajar os pés e aquecer o dito.

Vão em sentido inverso as pronúncias de um Dr. Relvas, a quem a chatice do cargo no governo e o esforço patriótico parece não terem feito emagrecer, que salienta o passado do professor como um dos pais da democracia, condição ainda não invocada pelo Dr. de Gaia e Menezes - o investigador oficial das paternidades! -, mais por questão de agenda do que esquecimento. Ao mesmo tempo recorda que isso era no tempo em que ele não escrevia biografias de Afonso Henriques nem se entregava à escrita de dramas para os palcos da capital e parecia regular bem de tudo, incluindo da cabeça que, muito o entristece, está apanhada de todo por um esquisito vírus de efeitos mais devastadores do que se fosse simples Alzheimer. Na altura, para além de alguns ganchos, limitava-se a ser lente e a morar na Quinta da Marinha, vendo televisão aos serões, de pantufas calçadas.

Com o mesmo ar tristemente consternado se pronunciou também o primeiro-ministro do governo versão sem açúcar e quase sem calorias do CDS/PP, ainda estupefacto e de olhos esbugalhados, não querendo acreditar que aquele fosse o mesmo professor que ele pessoalmente conhecera quando se iniciara como paquete e rapaz de recados. Porque não sei quando pedira a sorte grande pelo Natal que não saíra e agora pedia a taluda do carnaval que, mesmo em euros, com o pacto de estabilidade a fazer de puta, também não vai conseguir que saia. Sugere que, em coerência, lhe apoie o irmão da próxima vez, invista nisso todo o aforro que tiver, porque o rapaz tem filhos a criar, pode falar da vida com outra propriedade. Ele não, só sabe pôr tudo a dar lucros de fazer inveja aos banqueiros e espíritos santos do país, de comprar helicópteros com as pás empenadas e submarinos que já trazem marinheiros no convés. Aos fins de semana entrega-se à jardinagem nos canteiros da fortificação para não dizerem que só se interessa por feiras e mercados e que nada sabe sobre a beldroega.

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