5 de março de 2009

O regresso

Poderia ter voltado pura e simplesmente porque se me esgotara a preguiça ou porque me regressara o bom senso. Mas não, nem uma coisa, nem outra. A crise não fez com que uma entregasse a alma ao Criador. Tão pouco que o outro renascesse das cinzas e tivesse ressuscitado ao fim de meses de ausência. Mas é todavia por causa da crise que regresso. Atento às palavras do presidente da república, de momento no estrangeiro, colaborando na demolição do muro de Berlim e aos incentivos do primeiro ministro, regressado da sua excursão à feira de Espinho.

A crise, de facto, é como a Toyota: veio para ficar. E é importada, como aquela marca e como reafirma o primeiro ministro. Fosse ela indígena, de esquerda ou de direita, e bem o guarda Augusto lhe teria malhado como é seu hábito, seu gosto e sua competência de ministro. E até de nada valeu que o seu colega Manuel tivesse sobrevoado a autoestrada, a mais de 200 à hora, para chegar ao Terreiro do Paço a tempo de assinar a portaria decretando o seu falecimento, muito antes do seu nascimento. A crise, sacana, é como os gatos: tem sete fôlegos, mais os que não foram inventariados. E, assim sendo, com ela apenas lucra a Servilusa, Cangalheiros, Sa.

A crise justifica tudo e atinge todos. Impôs alojamentos pouco convenientes a banqueiros muito inteligentes e melhor sucedidos. Afectou de modo irreversível a memória, outrora privilegiada, de ex-ministros e conselheiros de Estado. Levou os lucros da Galp a níveis mais pornográficos do que o carnaval de Torres Vedras, embora com o contributo de administradores de alto gabarito, com tirocínio na direcção de autarquias falidas e de ministérios com polícias. Alterou dicionários, substituindo vigarice e fraude por imparidade e contabilidade criativa. Levou o Banco Central Europeu a descer taxas de juro e os bancos da Rua do Ouro a aumentar aquilo a que, em mirandês, chamam "spread", continuando os clientes do crédito habitação escravizados para a vida. Inspirou o licenciado Sócrates a lançar um pacote de medidas Complex II que vai permitir, finalmente, que eu deixe de carregar comigo o boletim da vacina contra a febre amarela. Uma doença terceiro mundista que se usa na Guiné Bissau. Onde ainda mata, a par com a cólera, a raiva, as bombas com detonação remota, as catanas e as antiguidades que dão pelo nome de G3!

1 Comentários:

Às 11:16 da tarde , Anonymous Anónimo disse...

Belíssimo regresso! Já era hora!
Que preguiçoso me saíste! Se não fosse terrível, até diria: abençoada crise!
Fátima

 

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