5 de janeiro de 2004

O futuro está na educação dos filhos

Como sempre, tarde e a más horas, - parece que era domingo e já passava das nove e meia da noite! - alguns portugueses começam a perceber que a melhor forma de preparar o futuro dos filhos é investirem na sua instrução. E, exactamente por isso, começaram na noite de ontem a acumular-se em filas, ao frio e ao relento, como se fossem novos sem abrigo, ilegais e vindos de leste, às portas do Colégio de Nossa Senhora do Rosário. Inexperientes e desprevenidos, nem uma garrafa de bagaço levaram consigo e as organizações particulares que, a meio da noite, distribuem uma sopa quente, limitaram-se a ignorá-los por acharem que estavam bem vestidos demais.

A corrida à escola, para preenchimento de um formulário de pre-inscrição, tem razão de ser. Em primeiro lugar, como se sabe, as escolas são poucas e os analfabetos muitos, mesmo que a maioria destes saiba soletrar, devagarinho, muitas das palavras com que se confronta diariamente e, com dificuldades, rabiscar o nome em caracteres que, quase sempre, parecem hieroglifos. Mesmo que utilizem automóveis de topo de gama com o pequeno tijolo da via verde visivelmente colado no vidro da frente.

Depois porque o ministro das escolas não tem, definitivamente, nenhuma queda para o lugar. À semelhança do que acontece, aliás, com a maioria dos seus colegas de governo que nem cunhas sabem meter. Mas assim é porque quando as pessoas acorrem às portas das escolas a querer inscrever os filhos já ele, muitas vezes, por lá passou antes a encerrá-las por falta de alunos, argumentando com os fracos índices de natalidade. Quer dizer, os portugueses têm às vezes assomos de consciência, perdem tempos preciosos em manifestações a favor da paz, gastam um dinheirão em tintas e depois ainda arriscam a integridade física a trepar pelas paredes acima para escreverem "make love not war", de que muitas vezes não sabem o sentido mas que acham giro. Depois, está visto, quando dispersam das manifestações ou fogem apressadamente à frente do polícia de giro - quando o há e, naturalmente, este giro é outro! - passam por uma taberna qualquer onde já é tão difícil encontrar o bolinho de bacalhau e o reconfortante copo de três e recolhem a casa para se sentarem à frente da televisão a ver quando a D. Teresa Guilherme casa ou a mulher, doméstica, os chama para o jantar.

Mas não fazem aquilo que recomendam nas frases que escrevem nas paredes apenas, creio eu, porque as não percebem. Mas não fazem filhos e, por si, contribuem mais para a redução dos índices de natalidade do que os elevados índices de mortalidade infantil que o INE divulga e o correspondente ministro, como o treinador que perde o jogo, solenemente declara, em conferência de imprensa à hora a que os telejornais se iniciam, que estão errados. Ponto final.

A ginástica da economia familiarInstruir os filhos, é claro, custa dinheiro e este, frequentemente, bastos sacrifícios. Ainda me recordo de, poucos anos atrás, imaginar as grandes dificuldades porque passaria o Sr. Manuel Damásio, na altura a exercer o cargo não remunerado de presidente do Benfica, para pagar o colégio dos filhos, ter carro e manter em dia - suponho eu também! - as contas da electricidade, da água e do telefone. Tudo à custa do salário mínimo que auferia e que, se fosse hoje, certamente acabaria a cair no cesto dos atrasados. É claro que não podia andar nem em Ferraris ou em Rolls-Royce e limitava-se a andar de Mercedes, modestamente. A mulher via-se muitas vezes coagida a recusar convites para festas simultâneas e, algumas outras, a ter de usar a mesma estola e a calçar os mesmos sapatos mais que uma vez. Mas valeu a pena o sacrifício. Leio hoje que a própria Sra. Damásio revela que a sua filha mais velha, além de benfiquista, já é filósofa. Que o segundo, sendo também já benfiquista, está a finalizar economia para ajudar na gestão do magro salário do pai. E finalmente que o terceiro, também já benfiquista - o que deve ter sido uma maldição que atingiu a família, na Quinta da Marinha! - é o benjamim. E naturalmente se prepara para não fazer nada e continuar a viver a expensas do pai.

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