21 de março de 2013

Dia mundial da poesia


A poesia não se escreve, não se diz, não se soletra. A poesia acontece. E não acontece hoje porque a Unesco assim o decidiu em novembro de 1999. A poesia está connosco antes de sermos feto, apenas óvulo ou espermatozóide  iniciando-se nos carreiros da vida, acontecendo antes de acontecer. Acompanha-nos quando nascemos, no conforto caro de uma casa de saúde, na vulgaridade de uma maternidade, na imensidão de uma savana de África. Onde a poesia acontece com todos os animais no seu habitat, convivendo sob a extensão sem limites que o sol estende como tapete comum, à beira dos rios, no silêncio dos lagos, na areia escaldante dos desertos.


Não se é poeta porque se quer, porque se conseguiu um editor, porque dois leitores que nos não percebem nos são caninamente fiéis. Porque vida de poeta é vida de cão, de meter o rabo entre as pernas e ir por aí, recusando o caminho para o aceitar logo de seguida. Poesia é métrica, é rima, é verso, estrofe, uma série de conceitos com que os poetas se não preocupam e com que convivem sem se darem conta. Poeta não tem nome, mesmo que se chame Camões, Pessoa, Andrade, Ferreira, Aleixo, Campos, Natália, Bandeira, Alegre, Régio, Sofia. A poesia jorra, como o vinho que se bebe, a aguardente que arde na garganta,  o Guardador de Rebanhos que se espalha pelas folhas de papel que se soltam da memória e se arrumam no vazio das gavetas.

Poesia não é sentimento, nem calendário, nem dia certo, nem noite de lua cheia com namorados ao luar sem verem a poesia do eclipse e a sonharem com a poesia da lua nova. Poesia não é livro, jornal, internet ou rede social. Não é Villaret, Viegas, ramo de oliveira, revolta, religião ou prece. Oração ou santuário, sacristão, padre, bispo ou papa. Freguesia, concelho, país amordaçado, cântico heroico, percurso épico. Não é para comer, beber, petiscar, palitar os dentes, piscar o olho. E come-se e bebe-se e petisca-se e sente-se. E entranha-se como um tumor com que se morre e com que se vive, que se extrai e que se renova. Não é de hoje, nem de ontem, nem de amanhã. Nem deste século, nem do outro, nem de sempre. Mas de sempre e de todos os dias.

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