12 de março de 2013

Madrugada


Se pela madrugada a tua mão me escorrer lentamente pela face, devo ter o sono leve e o espírito desperto. A noite é dada a todos os equívocos, até todos os gatos são pardos, uma cor baça que não consta dos compêndios. Depois, pela madrugada, com o sono solto, todos os gestos têm a dimensão do sonho e a distância inalcançável a que ainda fica o verão. E eu não quero sentir a tua mão fria pousar-me na fronte febril, a prometer-me destinos que ficam para lá deste minúsculo sistema solar onde não cabe mais do que um inverno.


O sono é este poço sem fundo em que mergulho, sem químicos que anoiteçam os dias, apenas cedendo a um cansaço antigo a que me entrego sem resistência e sem propósito. E do qual acabo por emergir todas as manhãs, à força das horas que caiem dos relógios e me forçam a que abra os olhos e lhes remova a ramela com que a noite me trouxe o sono e me sacrificou a esperança. A rotina é sempre esta, com os dias a caírem pelo tempo e a falta de uma mão carinhosa que chegue com o sol que entra pela janela, macia e morna, a afagar-me os cabelos e a acariciar-me os lábios cerrados. A madrugada há de ficar para lá deste sol que anuncia o verão. Quando esse sol nascer.

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