16 de novembro de 2003

Dr. Fernando Gomes, cronista

O Dr. Fernando Gomes, ex-presidente da Câmara de Vila do Conde, ex-presidente da Câmara do Porto, ex-ministro da Administração Interna e Deputado desde sempre, assina em cada domingo que passa uma crónica no Jornal de Notícias. Assinalada por uma pequena fotografia com alguns doze anos de idade e salientando, em letras pequeninas, o cargo à sombra do qual se crê que actualmente subsiste. Compreende-se que a sua condição de deputado não mereça maior destaque do que aquele que o corpo oito oferece. Realmente ser deputado não é, nos dias que correm, cartão de visita que se apresente a ninguém. Sendo apenas 230, os milhões de eleitores que lhes garantiram lugar no hemiciclo ignoram-nos, vaiam-nos, desprezam-nos e insultam-nos. Poderia pensar-se que esse tipo de tratamento seria injusto ou, pelo menos, equívoco e que, por isso, despertasse reacções contrárias. Mas não, cada nova personagem os carrega de mais e mais expressivos qualificativos e lhes dedica ainda maior indiferença.

O Dr. Fernando Gomes, como cronista, é aquilo que segundo se diz tem sido em todas as outras funções: faz-se pagar porque é com o maganão que se compram os melões e se frequentam as marisqueiras. De resto, não tem uma ideia que seja, mesmo pequena, mesmo inofensiva. Ao contrário, exibe a sua atávica arrogância endémica e descarrila facilmente para o disparate. Desde que pressinta as luzes de um qualquer projector faz pose de Rock Hudson a que faltam quarenta centímetros de altura e ajeita o capachinho que lhe transforma o luzídio cruto da cabeça em atraente cabeleira, presa por arames e segura à força de lacas e fixadores. Para além disso destila ódio com a mesma cadência, de relojoaria, com que um alambique do Douro antigamente produzia aguardente.

Este domingo sai, venenosamente, em defesa do secretário geral do seu partido que, certamente, melhor aplaudiria o seu silêncio sobre o assunto. E quando toda a gente diz que é preciso que o alarido cesse à volta do processo da Casa Pia lembra-se ele de o desenterrar. Mas é isso apenas um pretexto porque o jornal lhe não paga certamente por páginas vazias. No fim era inevitável o P.S. sobre a inauguração do estádio do Dragão, uma peça de retórica que se transcreve e que inclui o beliscão:

Hoje inaugura-se o magnífico Estádio do Dragão. Já aqui antes escrevi sobre a importância da renovação urbana que esta infra-estrutura desportiva suscitou. Mais do que um estádio de futebol temos, por via dele, o começo de uma profunda alteração numa zona desqualificada da cidade. As duas avenidas e a praça envolvente são, como é público, apenas uma pequena amostra. O Porto está de parabéns. Só é pena que quem representa a cidade não o tenha, a tempo, percebido.

O Dr. Fernando Gomes habituou-nos, infelizmente, a vender a alma ao diabo. A prazo e a prestações, correndo mesmo o risco do crédito mal parado. Desde que daí recolha alguns benefícios de ordem pessoal. Ainda nas últimas eleições autárquicas ficou para a história o seu negócio com o rival da concelhia do Porto, arquitecto Gaspar. Deixou a este a liberdade de escolher para a vereação os familiares, os amigos e os parceiros do jogo da sueca desde que lhe fosse reservado o primeiro lugar da lista. Depois passou os meses e o período de campanha a apregoar que era apenas candidato a presidente da câmara. Um cargo para cujo preenchimento nunca houve, somo se sabe, eleições específicas. Acabou derrotado, de forma inglória, ao primeiro assalto, indo ao tapete e ali ficando, até que o juiz desse por terminada a contagem de protecção. Levantou-se a custo, com a cara feita num bolo e o corpo dorido para o resto da vida.

Nunca, até hoje, se conformou com a derrota. Aproveita cada momento para diminuir o adversário que lhe acertou, sem apelo, um soco directo nos queixos e o pôs de borco. Ainda na edição de hoje, com a mesma sem vergonha de sempre, vem dizer que o presidente da Câmara de Gaia seria um óptimo candidato a presidente da Câmara do Porto. Já não aspira a ganhar nada, coitado. A sua vitória já só é a derrota de quem ele não suporta, desde que se verifique. Toda a gente se ri quando invoca como obra sua o Porto 2001, capital europeia da cultura. Que deixou os mais importantes largos transformados em buracos cheios de águas pútridas e o “ex-libris”, a Casa da Música, apenas pronta para inaugurar, se não houver atrasos, em 2004. Depois de ter custado algumas vezes mais do que inicialmente se previra.

O que me move contra o Dr. Fernando Gomes? Ora!, rigorosamente nada. Antes pelo contrário: sempre gostei de circo e me diverti imenso com os palhaços. De modo genérico apenas me revoltam a arrogância, a mediocridade, o convencimento, a presunção, a falta de princípios. Não tem aquele deputado, quanto a estes atributos, a importância que possa parecer nem a que eventualmente possa deduzir-se do texto. Ele é apenas um cromo de uma caderneta de colecção. Que está cheia. Dele só não gosto mesmo é do capachinho!

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