25 de abril – 38 anos depois
Portugal
é este sítio encavalitado no promontório do Cabo da Roca, aqui no cu de judas
da Europa, a quem os “mercados” cortaram o crédito por má conduta e falta de
pagamento e a quem uma coisa chamada troica vai emprestando alguns euros, a
taxas de juros de agiota profissional e servindo de tutor, como tem de ser
feito aos declarados juridicamente incapazes. Apesar disso vai-se reclamando de
país, de democracia e de estado de direito.
E
de facto o sítio tem uma constituição e os habituais orgãos de soberania. A
constituição tem tido as costas largas e sido, na palavra sábia de quem a
redigiu e a fez aprovar, o entrave ao crescimento económico e ao enriquecimento
dos que já eram ricos com a constituição do Portugal uno e indivísivel,
aprovada em Santa Comba Dão, e hoje, apesar de tudo, o são ainda mais. Dos
orgãos de soberania pouco se sabe do que fazem e nada se sabe sobre para que
servem. Ou, de outra maneira, fazem muito pouco e não servem para nada.
Desde
logo, a presidência da república. Que a sensatez perversa do acordo ortográfico
levou a que se escrevesse com minúsculas, à exata dimensão da sua importância.
Tem sido, por sistema, um cargo ocupado por gente reformada, forçada pela
exiguidade das pensões a socorrer-se de um extra que ajude a pagar a conta da
eletricidade, produzida em Espanha. Uma vez por ano o palácio é aberto ao
público – entendendo-se por público duas dúzias de criancinhas e respetivos
progenitores – para que possam verificar o verniz dos soalhos, o estuque dos
tectos e a mudança dos cortinados. E olhar de soslaio para o fato (terno, para
os nossos irmãos de Vera Cruz) coçado do presidente, com as calças curtas, os
sapatos cambados e o equilátero nó de gravata feito há anos para lá do canal da
Mancha e para o garbo da D. Maria, também respondendo por primeira dama.
A
Assembleia da República, porque o regime se diz republicano na voz do Dr.
Soares que anda há mais de 80 anos a tentar fazer-se ouvir e a acumular fortuna.
E cujo nome se escreve com maiúsculas não pelo que valem os deputados mas
apenas pelo número deles: 230, fora chefes de gabinete, assessores,
administrativos, motoristas e respetivos ajudantes. A maioria dos deputados
completa um mandato sem dizer uma palavra, muito menos sem a tentar escrever, e
sem ter uma ideia que não seja para a negociata e para a trapaça. A grande
maioria passa as sessões plenárias a ler or jornais desportivos, a passar pelas
brasas, a jogar ao “solitaire” quando a instrução é superior e a faltar ou a sair
mais cedo, a pretexto do trabalho político. Sempre feito em restaurantes
recomendados pelos guias gastronómicos e nunca no contacto com as abjetas
populações que os elegeram e que, muitas vezes, nem ao sábado tomam banho. Por
falta de dinheiro para pagar a conta da água e comprar uma barra de sabão azul.
O
governo, que deve ser escrito com minúsculas, talvez Arial tamanho 6 ou 7, e de
forma abreviada, para poupar no abecedário e passar no exame trimestral da
troica, sobre a austeridade e os afluentes do Mondego. É uma sucessão alternada
de Santos e Pecadores sem que ninguém saiba um nota de música, mas que se vão
revezando no palco, como personagens burlescas do Sr. La Féria, que aspira a
produzir um espetáculo musical com os Lusíadas, levá-lo à cena no casino,
convidar o ministério para a estreia e pregar o calote aos fornecedores, para
não fugir à regra e manter a estabilidade dos atrasos nos pagamentos. O governo
tem ministros esforçados, que são ou foram trabalhadores estudantes, fazem
exames académicos aos domingos, licenciam centros comerciais na barra do rio
Tejo, compram submarinos que não flutuam e ainda menos submergem e os mandam
subir o rio Douro, até Barca de Alva, para garantir a segurança das populações
e manter o castelhano em respeito. Como D. Nuno Álvares Pereira.
Os
tribunais! São os responsáveis pela administração da justiça, pelo
armazenamento de toneladas de papeis velhos a que chamam processos, atados com
um baraço, destinados à reciclagem. E pela captação ecológica, em baldes de
plástico, da água que cai dos tetos quando chove e as Águas de Portugal se não
oponham, por violação do monopólio. De resto ocupam edifícios a que a
megalomania dos concelhos chama palácios e não servem literalmente para nada. A
não ser para provar a inocência do Sr. Carlos Cruz, avisar a D. Fátima
Felgueiras que é época de praia em Copacabana e absolver o Sr. Isaltino Morais
de uma série de trafulhices entretanto prescritas. Porque, como se sabe, um
ladrão – que, naturalmente, não é o caso! – como um homicida deixam de o ser
passados uns anos. E o facto não impede, por elementar justiça, que se
desempenhem cargos públicos, se arrecadem os respetivos proventos e se discurse
nas cerimónias comemorativas do 25 de abril. Amen!
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