Contradições da democracia
O
vocábulo democracia é, só por si, um longo e nebuloso equívoco. Socorro-me de
um dicionário vulgar, da Porto Editora, edição de 2010, incorporando já o
acordo ortográfico: “sistema político em que a autoridade emana do conjunto dos
cidadãos, baseando-se nos princípios de igualdade e liberdade”. Depois adianta
dois conceitos opostos por simples 180 graus, direta: situação político-administrativa
em que o poder é exercido diretamente pelo povo”. Democracia representativa:
“situação político-administrativa em que o povo governa através de
representantes seus, periodicamente eleitos”.
Reportemo-nos
apenas ao sítio em que vivemos, enquanto aguardamos pelo visto para emigrarmos,
não se sabe nem para onde, nem para fazer o quê. Mas como recomenda o senhor
Passos Coelho e o seu governo regional. O nosso sítio é Portugal, de Vila Real
de Santo António a Melgaço, incluindo a Porcalhota, a ilha do Corvo e o
protetorado da Madeira, incluindo o pico do Areeiro e o Curral das Freiras. A
democracia não é direta e, ignorância minha, essa situação não se verifica em
lado nenhum. A democracia também não é representativa nem o povo governa
através de representantes seus.
Primeiro
estamos todos incluídos num caldeirão composto, para já, por 27 países e onde
caímos como o joão ratão, que se chama União Europeia. E que, sendo uma
ditadura, impõe a cada estado-membro ou candidato, que seja uma democracia. É
mais ou menos como dizer que o branco é a ausência de todas as cores e,
simultaneamente, a presença de todas elas. E o mesmo se diga do preto, porque é
indiferente e a ordem dos fatores é arbitrária. E onde, cantando e rindo, temos
andado convencidos de que viveríamos eternamente como uma ucraniana jovem a
expensas de um industrial textil do vale do Ave, velho e falido, que pagaria o
aluguer, a luz, a eletricidade e os preservativos, mesmo que desnecessários.
Depois
a nossa democracia é exercida não através do povo, de que em tempos se disse
que unido nunca mais seria vencido, mas através de organizações sem rei nem
roque a que se convencionou chamar partidos políticos. E que a classe política,
constituída pelo conjunto de cidadãos que vivem à conta do zé pagode, sem
regras e sem horários, dizem ser essenciais. Acontecendo que cada um deles é
menos democrático do que o Benfica, onde o voto do presidente em exercício não
vale o mesmo do do sócio que pagou o seu bilhete, carrega uma bandeira, canta,
grita e insulta os árbitros e as famílias.
Ainda
hoje, no jornal que compro diariamente para ajudar o engenheiro Belmiro de
Azevedo a superar a crise, um senhor chamado Eduardo Cabrita, certamente muito
respeitável e menos respeitado, candidato a uma coisa chamada federação
distrital do PS de Setúbal, se manifesta preocupado com a falta de
credibilidade que está a rodear a vida interna do partido e anuncia a sua
intenção de travar os “sindicatos de voto”, seja lá isso aquilo que for. E diz
que apenas devem votar os militantes que tenham pelo menos um ano de inscrição
partidária.
Muito
democraticamente, como diz o dicionário da Porto Editora, baseando-se nos
princípios de igualdade e liberdade. Mas pouco, apenas q.b. como nas receitas
de culinária!
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