A quarta-feira a descer pela escadaria
A quarta-feira a descer pela
escadaria, para o adro da igreja, como se fosse domingo e a missa tivesse
acabado, com o abraço fraterno para o vizinho do lado e a hostilidade do punhal
escondida na manga para todos os outros em volta. As cenas bíblicas nos painéis
de azulejos dispersos pelas paredes a que chega a luz filtrada e colorida dos
vitrais, um Cristo sempre pregado ao cimo de uma cruz, esperando pelo
arrependimento e pela ressurreição.
O céu coberto de
guarda-chuvas abertos sob uma chuva pontual e certa, a caminho do inverno, sem
doutrinas no horizonte, o dia sem protecção, com o sol escorrendo pelas
calçadas que ainda restam pelas ruas da cidade, a noite a nascer a ocidente
onde morrem todas as ideias e se enterram todas as esperanças. Um tempo óptimo
para me aconchegar ao borralho, a assar castanhas na cinza que vai sobrando na
lareira, enquanto me sinto tão rural como Fernando Pessoa na Brasileira do
Chiado e me visto de Álvaro de Campos para ler, sem enganos e sem interrupções,
uma completa Ode Triunfal dos dias claros que regressam pela primavera.
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