As mulheres
As mulheres! De lenço na
cabeça, avental à cintura e tamancos nos pés, a face trigueira à custa do estio.
Debruçadas nos lavadouros públicos, esfregando ceroulas encardidas, coradas ao
sol fugidio de novembro. Um sorriso acanhado no fundo melancólico do olhar,
ensinando línguas nas salas de aula das escolas públicas, a foice na mão
direita segando as searas de trigo maduro, catarinas eufémias de um país por
inventar, vermelho de sonhos e de um fustigante vento norte, sem pão para as
crianças estendidas à porta.
As mulheres! De cabeça
descoberta, sentadas nos salões dos cabeleireiros, os cabelos de molho na
espuma dos champôs vindos de Paris, saias acima do joelho, frequentando
universidades e fazendo ditados, perseguindo a independência económica e o
abono de família para os filhos. Aprendendo a conduzir automóveis e a fazer
manobras de marcha atrás, subindo ladeiras íngremes e descendo rampas sem fim
que desembocam nas margens abruptas dos rios, onde se debruça a preguiça dos
pescadores desportivos.
As mulheres! Envergando
bandeiras desfraldadas nas tardes frescas de outono, com palavras de ordem
clamando por dignidade, os cabelos soltos caindo para poente, a levar maior
beleza ao por do sol e ao voo estridente das gaivotas, planando sobre um mar
chão espreguiçando-se na areia fina e seca do dia tranquilo. Sapatos de salto
espreitando pelos tornozelos, sentando-se à volta da mesa dos restaurantes, um
peixe escalado na travessa, o verde da alface a cair-lhe das bordas, algumas
garrafas de vinho branco tinindo de sede nos copos de vidro, a algazarra do
riso a encher a rosa-dos-ventos. Um grão na asa!
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