Não faltes com a tua voz ao meu alvorecer
Não faltes com a tua voz ao
meu alvorecer. A seguir a ti o dia pode construir-se sobre todas as coisas. A
tua mão trazer ao parapeito da janela o rumo inquieto dos teus dedos. Libertar
os beirais para a azáfama diligente dos teus olhos. Dar aos ponteiros do
relógio o brilho do aço polido do corrimão da escada. Agasalhar a manhã que
atrasa o desfile magnífico das camélias. E soltar o vento nas areias junto ao
mar, onde repousa o sargaço sem apanha. Não penses nas águas que já passaram
sob as pontes. Já não são nem chuva nem granizo. Só degelo, a levar os
glaciares à latitude onde o equador corta o mundo em duas partes. Como se fosse
uma laranja madura, sem sementes e sem sumo.
Não te escondas aquém de
quanto queres, como se esperasses pela noite. A vida anda inteira pelas ruas,
sem necessidade de crepúsculo. Nada adianta que te vistas, pensa na luz que se
te liberta da garganta com cada pergunta que te faço. E não hesites nas
respostas, porque há sempre um momento para tudo. É aí que se liberta toda a
intimidade que tentas proteger. E que todas as dúvidas se desfazem. Tudo o
resto são caminhos de cor, ladeados pela frescura dos aloendros. As bagas
vermelhas decorando os ramos heróicos do azevinho. Enquanto persiste o frio
solitário do inverno.
0 Comentários:
Enviar um comentário
Subscrever Enviar feedback [Atom]
<< Página inicial