Biografias e mulheres romancistas
De quase nada a quase rei
Gosto de biografias e não as
considero literatura menor. São até bem exigentes no que respeita aos dados
históricos que utilizam, mesmo quando romanceadas. Este ano trouxe-nos uma, a
meu ver, perfeitamente excepcional, de José Cardoso Pires, um escritor maior da
língua portuguesa, tão maltratado em vida e tão ignorado depois de morto.
Quase com o ano a
extinguir-se completo a leitura da de Sebastião José. Um homem que marcou o
século XVIII português – tendo chegado até mais longe – como executor político
do mandato de D. José I. Controverso e contraditório, foi todo poderoso até que
lhe falecesse o amo e acabasse os seus dias no desterro de Pombal. Os dias do
seu longo governo continuam presentes, na bela baixa pombalina erguida depois
do terramoto e no beco do chão salgado onde os Távoras foram supliciados.
Desta biografia – e pessoalmente
não li outras – ressalta o profundo trabalho de investigação, que varre as suas
passagens por Soure, Londres e Viena, antes de regressar ao país e de ascender
ao poder. Que depois é, a meu ver, desperdiçado no propósito de revelar o homem
manipulador, sem escrúpulos e tirano que, mesmo tendo enriquecido, não passou
nunca do fidalgote, depreciativamente olhado nos corredores da corte. Mas foi
assim e foi mais do que assim. Tão pouco ele terá sido apenas o natural
responsável pela reconstrução de Lisboa – ele, que era o poder – ou pela
execução dos Távoras e do jesuíta Malagrida.
Paulina Chiziane – uma aproximação
A surpresa do prémio Camões
com que foi distinguida, – não venceu, inexactos utilizadores da língua
portuguesa, o prémio não é um concurso de pesca! – especialmente por me ser de
todo desconhecida. E negativa, por preconceituosa, a insistente referência a
ser a primeira mulher moçambicana a escrever um romance. Porque afinal isso é
tão natural como José Craveirinha ter escrito um poema nacionalista ou Mia
Couto ter escrito um conto e “inventado” um novo adjectivo, tenha ele sido o
primeiro ou o vigésimo romance.
“Balada de amor ao vento”
liberta alguns laivos de um certo realismo mágico, alguma assimilada – passe a
expressão, sem propósito depreciativo – cultura europeia e, acima de tudo, a
pureza e a ingenuidade de um continente como África. O que faz da aproximação
uma agradável surpresa, a seguir com outros títulos da autora das margens do
Índico, que me traz alguma da originalidade que, como leitor, procuro sempre.
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