Um amor para sempre
Vi-te de relance sob a
luminosidade da manhã de Abril, como raio que incendiasse o sol. Regressei com
o olhar à silhueta do teu corpo esguio e deixei-o percorrê-lo lentamente, ponto
a ponto. A forma longilínea, o perfil esbelto, a perfeição desenhada com o
rigor de mestre. Tomei-te inteira em minhas mãos, com o carinho de quem toma
nos braços a delicadeza frágil de um primeiro filho. Deslumbrei-me, sem
pestanejar e não me cansei de te percorrer a elegância e o silêncio quieto. É
assim o fascínio.
Acaricio-te lenta e
repetidamente, não sei quantas vezes, sem nenhum enfado, sempre uma vez mais. E
por uma atrevo-me, há uma capa preta, debruada a ouro, a cobrir-te o dorso, que
te oculta o brilho dos olhos, como se ameaçasse afastar-te para longe de mim.
Uma pequena estrela, certa e regular, enfeita-te a testa, imóvel e superior ao
pescoço longo e esguio. Retiro-ta com um golpe único e certeiro, sem nada de
intempestivo, sem sinal de grosseria. Por ti, nem reages, nem um gesto ou um
sorriso, nada. Persistem a elegância contida, o silêncio cúmplice, a
expectativa das cenas ainda por vir.
Deponho descuidadamente a
capa sobre a mesa e isso te exibe a plena nudez do tronco erecto. Sem uma ruga,
macia, indiferente à profundeza do olhar com que te julgo a forma lúbrica do
corpo. Estendo a mão direita, aquela com que melhor desenho todas as palavras
que não sei se te direi. Sobre a mesa, também, a brancura cândida que lhe cobre
o tampo, lençol por estrear das núpcias por que esperas desde sempre. Enlaço-te
pela cintura fina, suavemente, como se à sala chegassem os acordes melódicos de
uma valsa. Parece-me que te descubro um trejeito breve sob as pálpebras e uma
certeza húmida chega ao tom róseo dos teus lábios. Não resistes, deixas-te
levar.
Rodopiamos com passos rápidos
e certos sobre a brancura virgem do lençol de linho. Um arabesco, duas voltas,
uma pausa. A marcação do compasso ternário, como se ambos fossemos um rio azul,
doce e tranquilo, correndo sob as pontes, tecendo as margens. Na ponta dos
dedos sinto o calor morno e sensual do teu corpo nu, as palavras que se
desenham com paixão em cada linha. E umas sobre as outras vão arrumando a
estrofe, tamborilando a métrica na síncope das sílabas, descobrindo a rima no
ritmo harmónico do sussurro. Construindo o poema seguro e certo com o rigor da
estrela que te veste a fronte, estilizada paixão de adolescência.
Montblanc, uma paixão de
adolescente. Um amor para sempre.
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