O terramoto de 1 de Novembro
Em
conferência de imprensa, pela voz do seu porta-voz, conselheiro, deputado,
chefe do grupo parlamentar, presidente e amanuense, o partido Jabasta anunciou
hoje ir chamar o governo ao parlamento, com carácter de urgência. Salienta e
lamenta com veemência não o ter podido fazer ontem, dia do infausto
acontecimento, por ter sido feriado nacional, estarem encerradas as repartições
públicas e paralisado o mais básico e necessário expediente, sem a cautela de
serviços mínimos. Ao mesmo tempo reclama a modificação das normas legais porque
a salvação da pátria não pode esperar pelo nascer do sol, o peito dos patriotas
não consegue conter-se sem ver subir a frequência cardíaca e a legitimidade do
governo não deve ser artificialmente prolongada, à custa do oxigénio de garrafa
e do aparato intrusivo dos cuidados intensivos e das batas brancas.
Mais
ainda acha o partido que é importante saber onde parava o governo do reino, à
hora a que foram interrompidas as missas, chamados os bombeiros e mobilizados
os meliantes e os vadios, sabido que é estar ultrapassada a época balnear e os
banhos de mar nas praias da costa. Como entende ser importante saber o que
fazia sua majestade el rei pelo largo descampado da Ajuda, ao desabrigo, longe
do recato e do conforto da alcova, quando é certo que nem o paço dos marqueses
de Távora fica em caminho ou nas redondezas e não é uso de sua majestade
fidelíssima ir a orações ao convento de Odivelas. Para mais quando o tempo era
incerto, com vento desabrido e um griso a ameaçar borrasca próxima. Não pode o reino
expor na via pública a segurança e a independência nacionais quando, mesmo
liberto do mouro, o castelhano espreita de Badajoz e cobiça o ouro que ainda
chega de Minas Gerais e o sermão que o padre António Vieira deixou pelos
sertões do Maranhão.
E o
ministro de sua majestade, o arrogante fidalgote Sebastião José, atarracada
figura de peito cheio de vento e de padres-nossos, olhos faiscando de ambição, sem
linhagem e sem títulos de nobreza? Onde o levava a sua sege enquanto ruía o
paço da Ribeira e se quebrava em muitos cacos o vaso de noite de el rei nosso
senhor? Pois, a congeminar ideias que levassem os seus irmãos a serem a sua
polícia de costumes e a atentar contra os jesuítas e a santa madre igreja,
pelos brasis fora. E a mandar erguer provisória e apressadamente uma real
barraca onde precariamente pudesse repousar a real pessoa, sem o serviço dos
seus fiéis e dedicados criados. Mal tendo quem lhe enfiasse um frango assado em
cada bolso da jaqueta, com que pudesse ir mastigando o tempo e matando a fome,
dando estalidos com a língua e lambendo os nobres dedos.
0 Comentários:
Enviar um comentário
Subscrever Enviar feedback [Atom]
<< Página inicial