2 de novembro de 2022

O terramoto de 1 de Novembro

 

Em conferência de imprensa, pela voz do seu porta-voz, conselheiro, deputado, chefe do grupo parlamentar, presidente e amanuense, o partido Jabasta anunciou hoje ir chamar o governo ao parlamento, com carácter de urgência. Salienta e lamenta com veemência não o ter podido fazer ontem, dia do infausto acontecimento, por ter sido feriado nacional, estarem encerradas as repartições públicas e paralisado o mais básico e necessário expediente, sem a cautela de serviços mínimos. Ao mesmo tempo reclama a modificação das normas legais porque a salvação da pátria não pode esperar pelo nascer do sol, o peito dos patriotas não consegue conter-se sem ver subir a frequência cardíaca e a legitimidade do governo não deve ser artificialmente prolongada, à custa do oxigénio de garrafa e do aparato intrusivo dos cuidados intensivos e das batas brancas.



Mais ainda acha o partido que é importante saber onde parava o governo do reino, à hora a que foram interrompidas as missas, chamados os bombeiros e mobilizados os meliantes e os vadios, sabido que é estar ultrapassada a época balnear e os banhos de mar nas praias da costa. Como entende ser importante saber o que fazia sua majestade el rei pelo largo descampado da Ajuda, ao desabrigo, longe do recato e do conforto da alcova, quando é certo que nem o paço dos marqueses de Távora fica em caminho ou nas redondezas e não é uso de sua majestade fidelíssima ir a orações ao convento de Odivelas. Para mais quando o tempo era incerto, com vento desabrido e um griso a ameaçar borrasca próxima. Não pode o reino expor na via pública a segurança e a independência nacionais quando, mesmo liberto do mouro, o castelhano espreita de Badajoz e cobiça o ouro que ainda chega de Minas Gerais e o sermão que o padre António Vieira deixou pelos sertões do Maranhão.

E o ministro de sua majestade, o arrogante fidalgote Sebastião José, atarracada figura de peito cheio de vento e de padres-nossos, olhos faiscando de ambição, sem linhagem e sem títulos de nobreza? Onde o levava a sua sege enquanto ruía o paço da Ribeira e se quebrava em muitos cacos o vaso de noite de el rei nosso senhor? Pois, a congeminar ideias que levassem os seus irmãos a serem a sua polícia de costumes e a atentar contra os jesuítas e a santa madre igreja, pelos brasis fora. E a mandar erguer provisória e apressadamente uma real barraca onde precariamente pudesse repousar a real pessoa, sem o serviço dos seus fiéis e dedicados criados. Mal tendo quem lhe enfiasse um frango assado em cada bolso da jaqueta, com que pudesse ir mastigando o tempo e matando a fome, dando estalidos com a língua e lambendo os nobres dedos.

0 Comentários:

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]

<< Página inicial