17 de fevereiro de 2004

Arranja-me um emprego


O Dr Manuel Monteiro é aquele rapaz magro, de óculos grossos e olhos míopes encovados nas órbitas, que militou na juventude do CDS até ser presidente. Dedicou-se ao partido, desleixou os estudos, foi subindo na hierarquia. Não se sabe como nem quando teve uma aberta, foi tirar o canudo, neste país sem se ser doutor não se consegue ser coisa nenhuma na vida. Nem vereador!

Por limite de idade, no partido, passou aos seniores. Ensaiou palavras de ordem, slogans eleitorais, fez o esquisso de cartazes, foi eleito deputado, chegou de novo a presidente. Sempre com o seu inseparável amigo de peito, Paulo Portas, a dar-lhe a sombra protectora e o itinerário para o paraíso. Até que este, cansado da sacristia e aspirando ao sabor requintado dos doces de convento se rebelou. Em Braga, terra de tão antigas tradições cristãs, à vista do cónego Melo. A revolução triunfou, o Dr Monteiro perdeu o emprego, não recebeu a indemnização que lhe era devida e incompatibilizou-se com o patrão.

Fez a travessia do deserto do Sahara, para lá e para cá, sem um cantil de água com que pudesse dessedentar-se, sem um camelo que lhe pudesse dar descanso às pernas, sem um oásis onde, para além de piscinas de águas tépidas pudesse haver algumas odaliscas para o relaxamento. De regresso a casa recebeu, às dez da noite, uma chamada telefónica de um conhecido banco da nossa praça a oferecer-lhe um crédito pessoal em condições que nem sequer dá para acreditar. Aceitou, mas sob condição: não poderia nunca revelar à Deco que condições eram essas, de que beneficiava.

Meteu ombros à tarefa de fundar um partido novo em tudo. Na designação, nos estatutos, nos militantes, no projecto. Até ele iria mudar. Começou pelos óculos e da roupa interior nada se sabe, mas há quem assegure que usa boxers com o twetee estampado, a amarelo, na braguilha. Começou por se candidatar a presidente do novo partido e, de seguida, a eleger-se.

Daí para cá, realmente, tudo mudou. O Dr Monteiro é imparável e onde as câmaras de televisão chegam apenas um conhecido adepto do Futebol Clube do Porto consegue chegar-se à frente antes dele. Quase todas as semanas consegue beneficiar de seis linhas num dos jornais que se publicam. Na manhã do último domingo, à saída da missa, foi mesmo cumprimentado com deferência por dois casais de reformados. A filha de um vizinho do andar de baixo trata-o carinhosamente por padrinho e o porteiro do prédio onde mora insiste em curvar-se à sua passagem e em trata-lo por "senhor presidente". Dá-lhe alento!

Já anunciou ser candidato à junta de freguesia, à câmara municipal, ao parlamento europeu. De novo à presidência do partido, - como querido líder - ao parlamento nacional. Sem ninguém lhe pedir nada não quis correr o risco de se esquecer e anunciou o seu apoio a um dos candidatos, que não existem, à presidência da república. Nos últimos dias reafirmou o seu apoio ao candidato que, só Deus sabe, há-de ser ou não ser. E adiantou que se não fosse, ele próprio avançaria com a sua candidatura. Espera-se a reacção do herege Santana Lopes que, se for muito mais burro do que é permitido por lei, há-de optar por se manter na arena. Para ser tratado abaixo de cão na TVI e seguramente humilhado nas urnas pelo Dr Monteiro. Enquanto, em fundo, o Sérgio Godinho continuará a cantar o "arranja-me um emprego".

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