A Justiça
Nada
em Portugal é tão consensual como a Justiça e a fé na Senhora de Fátima como
único meio capaz para superação da crise. A Justiça tem a importância de um
ministério e a credibilidade de um vendedor da Feira da Ladra, sem ofensa para
este ou para a emérita feira. A ministra proclama que, com ela, ninguém está
acima da lei e os suspeitos asseguram
que também ninguém está debaixo dela. A Constituição classifica os tribunais
como um orgão de soberania e o governo, - outro orgão de soberania sob tutela
de um triunvirato de amanuenses estrangeiros - encerra-os, contesta-lhes os
métodos e discorda grosseiramente das suas decisões.
Há
dias o Tribunal Constitucional, no seguimento de pedidos de partidos políticos
da oposição e do presidente da república – outro orgão de soberania, com morada
fiscal em Belém e ausente em parte incerta – declarou inconstitucionais algumas
normas do orçamento do estado para 2013. Logo o braço direito do saudoso
ministro Relvas, que exerce as funções de primeiro-ministro, veio publicamente
comunicar que não concorda com a decisão, que os juízes – alguns indicados pelo
seu próprio partido – são ignorantes, inexperientes e de raciocínio obtuso, e
que comprometem definitivamente o futuro do país, a descida do preço dos combustíveis
e os lucros que o Pingo Doce acumula nas praças de Amesterdão e nos bancos da
City.
Aventou-se
de novo a possibilidade de exumar D. Afonso Henriques do seu merecido descanso
em Coimbra, para o questionar sobre o assunto e chamá-lo à Assembleia da República
– outro orgão de soberania onde se saboreia o melhor e mais barato bitoque do
país – para saber se as decisões do Tribunal Constitucional se enquadram no
espírito dos acordos feitos com os Cruzados para a conquista de Lisboa aos
mouros. A questão está pendente do ministro das finanças, necessária para a
aquisição de um martelo pneumático e de um berbequim, já adjudicados àquele
deputado da terceira fila, por ajuste directo. Para acelerar a inquirição, o
pagamento da comissão e o arquivamento do volumoso e inútil relatório.
Finalmente
hoje uma notícia positiva, relativa a um desembargador da relação, apesar de um
tribunal inferior o ter condenado a pagar a uma clínica uns “tratamentos de
modelação corporal para redução do abdómen” (sic). É naturalmente positivo que o
distinto desembargador se preocupe com a sua imagem – como aliás de há muito
faz a D. Lili Caneças, vulto incontornável da cultura nacional e da venda de
cremes para as rugas do pescoço – porque isso se reflete na imagem da Justiça,
ela própria. O ministério, agradecido, deveria suportar essa despesa do seu
próprio orçamento, mesmo que fosse precisa a autorização do ministro Gaspar.
Não são muitos os magistrados que se preocupam deste modo com a sua figura, a
imagem pública do seu tribunal e os resultados da equipa principal do Benfica!
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