Dia da Mãe
Todos
os anos, por inícios de maio, quando se alongam as horas dos dias claros e o
amarelo das giestas rebenta pela berma das estradas, a hipocrisia consagra um
domingo a todas as mães. Como se um dia, mesmo de domingo, desse sequer para
pronunciar com dignidade suficiente um nome cuja amplitude vai para além do
universo que conhecemos.
Mãe
são três letras que não cabem em nenhum papel, em nenhuma parede, em nenhum céu
estrelado. Um som que vai muito para além das frequências que o ouvido humano é
capaz de entender. Um sol que brilha
muito mais do que aquele que nos ilumina e se cansa quando chega à linha
do horizonte, com o cair da tarde.
Sei
que a minha me deixou sozinho, na beira do caminho, quando a minha vil
ignorância me levou a pousar-lhe suavemente a mão sobre a testa, como se fosse
uma carícia, e a senti fria como o gelo da ausência que é cada vez mais a minha
única constante da vida. Daí para cá não se me secaram as lágrimas, não me se
interrompeu a orfandade, não me sobraram momentos para um sorriso breve. Todos
os afectos foram promessas que não existiram ou não passaram disso, um buraco
negro, que se alarga a cada dia, é a única perspectiva com que me partilho.
Não
me lamento, mas sei que me não cabes em nenhuma palavra, em nenhum choro, em
nenhuma recordação. Mãe é um conceito demasiadamente grande para mim, não se
acomoda num dia, vai para lá da eternidade, nem sistema solar, nem via láctea.
Que mesquinhez pequenina quer agrilhoar uma tal grandiosidade à dimensão de
umas curtas horas? A não ser a hipocrisia?
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