13 de dezembro de 2013

Cais deserto

Numa estação de caminhos de ferro há um cais deserto que se prolonga muito para lá de onde o olhar alcança. Um cais deserto é sempre a ansiedade de quem espera, as lágrimas de quem fica, a solidão da distância a que mora a ausência de quem parte. Geometricamente as linhas a perderem-se para além da curva do horizonte, marcando encontro com o infinito, para além do sonho e da esperança., onde fica o paraíso e onde todos os encontros, finalmente, são para tudo e para sempre.

Um cais destes, deserto de pessoas e de comboios, sem o ruído metálico das rodas travando nos carris, e sem os passageiros apressando-se com as bagagens, é um fascínio doloroso que não cabe em nenhuma fotografia, por mais extenso que possa ser o papel e abrangente a objetiva. Os dias soalheiros, mesmo de inverno, ainda que seja noite, podem trazer a esperança à ansiedade de quem está e de quem espera pelo comboio que chega e pela pessoa que desembarca com o passo seguro de quem trás destino certo e o olhar sereno, cheio de promessas e do verde permanente das colinas.


Quem se apeia pode trazer no sorriso o brilho luminoso dos dias claros, a primavera florescendo nos cabelos com uma manhã de sol, os dedos das mãos prontos para a ternura, o passo firme e curto ajustado aos grandes percursos que, sem pressa, se fazem pela vida fora. A sua presença, de repente, enche a solidão do cais de lés a lés, de azáfama e movimento, vida, embarques e desembarques, uma só pessoa a submergir o silêncio, a empurrar a desesperança para além de onde os comboios nos fogem do horizonte.


Para lá da porta da estação fica um outro mundo onde, a dois, sob a iluminação deserta das ruas frias, se constrói a certeza do futuro imediato, se dão as mãos e se partilham sonhos e desejos. Enquanto pelos dias longos de verão se trocam prendas e se fundem corpos, certezas de marés cheias e águas mornas, como se a solidão do cais já não sobrasse para nenhuma despedida. O mar é como o sol, a praia coalhada de gaivotas tendo-o na ponta dos bicos: quando nasce, é para todos.

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