Um abraço e duas linhas de ternura
É
este sol frouxo, do fim desta manhã de inverno, geometricamente
emoldurado pelas retas paralelas da linha férrea que me vai trazer o
comboio que virá do infinito, com paragem marcada nesta cais deserto
onde me acotovelo com o meu silêncio e esta tua longa ausência
agreste, sem limite e sem medida. E serás tu a encher cada canto do
mesmo cais em que me perco, raio de sol brilhante e único,
enchendo-me os bolsos de esperança e a vida de sentido, a caminho de
um destino para lá do horizonte onde se esboçam nuvens brancas, sem
chuva nas entranhas.
Afago-te
os cabelos soltos, cheirando ao perfume do dia claro, e bebo-te o
sorriso alegre que trazes pendurado na face feminina, os braços
abertos para o abraço apertado que acolherá o beijo que se desenha
na ternura túmida dos teus lábios, oferecendo-se ao sol que se vai
escoando por detrás da elevação quase rasteira das colinas que te
embelezam o peito onde pulsa um coração de dimensão tamanha.
À
passagem pela cidade em que te encerras sinto a quase solenidade de
um convento austero e antigo a que te acolhes, despojada de fortunas,
os pés descalços para a caminhada que faremos de mãos dadas, um
amor seguro e fértil brotando do suor nervoso que nos escorre pelos
dedos. E sem medo nem das palavras nem da distância a que se
projetam, toco com suavidade cada momento dos teus dias e cada
bocadinho minúsculo do teu corpo franzino de rapariguinha. Enquanto
te sussurro ao ouvido um arrepio que te faz estremecer e quase te
paraliza: não deixes que te perca na curva que o rio faz antes do
açude, enquanto o atravessamos ignorando rápidos e correntes.
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