9 de abril de 2015

Conversar com Deus

Agora seria o meu momento para conversar com Deus, uma única vez. Não para Lhe pedir nada, não para Lhe dar nada, mesmo que eu precise de tudo e Ele não precise de nada. Mas, chegado à minha idade, à minha condição e ao meu estado, e a este beco insalubre e triste em que a vida – e a vida são as pessoas e as circunstâncias que elas próprias criam! – me encurralou, seria bom que, como diz Mário de Carvalho, trocássemos algumas ideias sobre o assunto.

Não posso compreender nem aceitar nenhum Deus, de oriente a ocidente, de norte a sul, de Mercúrio a Plutão, em todo o espaço cósmico, conhecido ou não, que acima de todas as coisas, se preocupe com o bem do seu numeroso rebanho, seja omnisciente, omnipresente e omnipotente e, passivamente, assista e permita que os elementos desse rebanho se enganem, se atropelem, se traiam, se roubem e se matem livremente e sem oposição, como discípulos de um qualquer deus menor e desprezível.

Gostaria muito de poder interpelá-Lo sobre algumas questões essenciais e elementares. Porque não me pesa a consciência de ter feito tantos e tão grandes males que possam justificar a desconsideração, a ignorância e a hostilização com que cada vez mais sou contemplado e sinta cada dia como o verdadeiro inferno com que se ameaçam os pecadores e se assustam as criancinhas. Não tenho sete palmos de terra onde cair morto. Não vivi e não vivo à custa de ninguém. E procurei ajudar os outros, solidariamente, fossem quem fossem, para além de todos e quaisquer laços que nos unissem.

E, se assim tem sido, se assim continua a ser, será que não terei, ao menos, direito aos meus sete palmos de terra? Sem lamentos, sem dor, sem lágrimas e sem flores de ninguém?


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