Uma chuva de primavera
Uma chuva de primavera,
fresca e verde, ocupando os dias e afagando os plátanos da praça, de copa ainda
mal composta, como véus de noiva atrás dos quais se encobre um sorriso feliz e
breve. O voo atarefado das cegonhas, carregando os gravetos para o acabamento
grosseiro e rústico dos ninhos, onde os ovos serão crias que um dia destes
amanhecerão voando, como senhoras absolutas, sob o azul de um céu sem nuvens.
Uma multidão transbordando do recinto, acenando lenços brancos, como se eu ali
estivesse sozinho e só, uma rosa vermelha presa aos lábios, saudando a tua
chegada coberta por um manto alegre de papoilas e de ervas. E tu me fosses todas
as papoilas e toda a vida que me faltam.
Uma toalha branca sobre a
mesa, posta para o jantar, um livro aberto ao acaso, todos os poemas de amor
espreitando-te pelo decote estreito da blusa, como uma promessa de uma viagem
ao futuro. Um futuro alegre e longo e sempre cheio de papoilas e de ti, sem
nenhum tempo que lhe sobrasse, as estrelas escorrendo-te pelos cabelos soltos,
esvoaçando ao vento. E o livro sobre o prato, como uma iguaria que se serve em
folhas soltas, sem condimentos nem ervas aromáticas, mas que se saboreia em
pequenos fragmentos que nos entram pelos olhos e nos chegam ao coração. Uma voz
rouca, entorpecida pelos sentidos com que levo um beijo simples à tez suave do
teu rosto, uma luz difusa pousando-te no ombro.
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