23 de abril de 2018

Um barco pendurado do tecto

Um barco pendurado do tecto
Pela hélice de quatro pás
Com o motor fora de borda caindo-lhe da popa
E a luz dos candeeiros da rua
A afogar-se no brilho molhado do asfalto
Como se houvesse chuva que tivesse sobrado dos incêndios
Enquanto a tua nudez se projecta na parede do quarto
Como o silêncio que ainda resta da madrugada
E se picasso ainda pintasse a guernica
Sobre uma bandeira da catalunha
Onde se destacasse o rigor geométrico da tua silhueta.

Há sempre uma bandeira mergulhada num tanque de roupa
À espera do sol e da barrela
Como se as águas que correm nos rios
Lavassem todas as coisas
E tirassem todas as nódoas que o álcool deixa na ressaca
Para depois poder ser palete tela pincel esboço
Corpo inteiro beleza obra de arte
Lugar permanente em galeria de museu

É com as mãos limpas que irei acariciar os teus cabelos
Com as unhas cortadas rentes
E o teu pescoço de girafa esticado para a colheita dos rebentos novos
Nas pontas dos ramos
Como vinho tinto com mais de quatorze graus de graduação
E um universo de nevoeiro libertando-se das narinas
Com o barco à deriva e a âncora solta
Nadando como um peixe vermelho de águas fundas

As minhas mãos percorrendo a intimidade das tuas pernas
Como o simples começo da tua alma
Sob o tecido fresco da manhã
Que te veste de transparência e de desejo
Procurando o que de mais secreto tens para guardar
Nos escondidos segredos do teu corpo inteiro
A posição instintiva de decúbito dorsal de quem ama
Todo o alvoroço da cama com as roupas em desalinho
Aguardando pela arrumação
E pelo sol em chamas atravessando as frinchas da janela





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