Onze anos minha Mãe
Hoje queria a tua mão de
regresso aos caracóis dos meus cabelos
Mas está um dia de sol
Com o céu azul e um calor
como se ainda fosse o mês de agosto
Os meus caracóis
desfizeram-se com os ventos da vida
Os cabelos embranqueceram de
espanto
E foram rareando na
longitude da espera
Não sei nada de ti
Nem como me deixaste num outro
domingo de manhã
E dei com a tua face
petrificada com silêncio dos meus beijos
Na eternidade que senti no
frio eterno do dia seguinte
Mesmo que a tua memória me encha
o peito
E me acelere o ritmo
cardíaco
Eu estou mais sozinho
Mais entregue à roleta da
vida
Como se esta fosse a sala de
jogo de um casino onde perco sempre
Deixei de fazer o mesmo
caminho todas as semanas
Quando já sabia de cor todas
as curvas da estrada
E conhecia todas as árvores
que me acenavam das bermas
Mas o caminho deixou de
fazer sentido
E entrar numa sala vazia da
tua presença
Ocupada por pessoas cada vez
mais distantes da vida
Como se o sol fosse deixar
de nascer em cada manhã
Olhando-me com um sorriso
triste no fundo dos olhos
Encovados e desertos de
esperança
Como se eu deixasse de
pertencer ao que lhes restava do corpo
E à sombra das árvores do
jardim
A que me acolhia com a tua
mão magra entre as minhas
Só para ver-te sorrir
A olhar para um melro a
passear-se sob o brilho do dia
Procurando alguma semente
perdida no verde da relva
E ver ainda a curiosidade
quase infantil do teu olhar baço
A seguir-lhe o bico amarelo
e os passos inquietos
A beleza antiquíssima e alva
dos teus cabelos
Com os caracóis curtos em
desalinho
Resistindo à força do vento
e ao peso do chapéu
A proteger-te da violência
do sol
Comigo a querer-te sempre e
só para mim
Estreitar nos braços o teu
corpo franzino
Tisnado pelo verão e seco
pelo comprimento dos anos
Com a pele enrugada a
perder-se na longa distância da idade
Como se afinal nunca
houvesse fim para nada
E a eternidade fosse uma
caminhada que se faz passo a passo
Voltando-se sempre aos
locais onde deixámos a infância
1 Comentários:
Que lindo.
Abraços
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