11 de março de 2019

Artur do Cruzeiro Seixas


Conheci circunstancialmente Artur do Cruzeiro Seixas em Luanda, quase seguramente no primeiro semestre de mil novecentos e sessenta e três. E isto no decurso de uma exposição colectiva de pintura na qual, para além de outros que não conheci ou que não recordo, também participavam ele e o meu amigo Eduardo Pires Júnior.  Lembro-me que a exposição se realizou numa sala de rés-do-chão, num edifício do lado esquerdo de quem subia da Mutamba para o antigo largo de Serpa Pinto. Cruzeiro Seixas era, por essa altura, Conservador do Museu de Angola, na Rua de Nossa Senhora da Muxima, naquela cidade.

Eu era um jovem sonhador, compulsivo leitor acima das minhas possibilidades, que pensava que ia escrever poemas para a posteridade, mesmo antes de haver Mark Zuckerberg e Facebook que os pudessem espalhar pelo mundo. E recordo-me que, por esses dias, houve qualquer agitação com a Pide de triste memória que, de um dia para o outro, prendeu meio mundo, facto de que fui informado, segundo creio, pela mulher do Eduardo. Eu era tão insignificante que nem me assustei e nem fui incomodado. Mas aquela possibilidade de contacto com gente mais velha do que eu, de talentos já firmados, e naturalmente com quem muito poderia ter aprendido, acabou por se gorar. Não soube nunca quem foram todos os detidos, mas sei que, no seguimento disso, foram dar ao Tarrafal, sentenciados creio que todos a quinze anos de prisão, António Jacinto, Luandino Vieira e António Cardoso. Entretanto fui eu chamado ao cumprimento do serviço militar obrigatório, o que mais ajudou à dispersão.

Alguém me disse que Pires Júnior tinha ido para o Brasil, por lá se fixara e por lá continuara a sua vida. Nunca mais soube dele e nunca tive oportunidade de confirmar a versão. Venho a saber muitos anos mais tarde que Artur do Cruzeiro Seixas vive e Vila Nova de Famalicão onde, coisa linda, está com 98 anos de vida feitos. Retenho na memória o verdadeiro deslumbramento incomparável dos seus desenhos à pena, a segurança e o rigor geométrico do traço, o conteúdo provocante e surrealista do motivo.


A Fundação Cupertino de Miranda, detentora de grande parte do acervo do artista, vai inaugurar no dia 29 do corrente a exposição “Cruzeiro Seixas: ao longo do longo caminho”. Nesse dia quero estar em Vila Nova de Famalicão, depois do evento ter chegado ao meu conhecimento via Luísa Tavares.


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