Duas lágrimas sobre o orvalho da manhã [Mais uma lágrima tombando com o nevoeiro]
[O texto
que se segue é de há três anos e foi uma evocação saudosa às memórias de minha
Mãe. Que ali esteve quando Fátima era só Cova da Iria, um “bajanco” de água da
chuva no cimo da serra agreste, as azinheiras sobrevivendo no meio do horizonte
de pedra. E porque hoje o local é um sítio deserto, escapando-se suavemente
entre o nevoeiro que desce, como se fosse uma cortina que se fechasse. Volto
não alterando o texto, mas apenas acrescentando-lhe mais essa imagem. E mais
uma lágrima, tombando com o nevoeiro.]
Duas
lágrimas sobre o orvalho da manhã. O sol atravessando as copas perenes das
azinheiras. Algumas nuvens brancas riscando a serra. E quase cem anos de
permeio. E tu menina, feliz no teu vestidito novo e pobre de chita barata.
Correndo pelo carreiro, quando te é curto o passo, para acompanhar a marcha de
mulheres adultas, a quem a tua mãe te confiou: não me percam a rapariga.
Duas
imagens e a proximidade a que me ficas, na larga distância dos anos. Da Cova da
Iria não resta quase nada, nem o nome. Desapareceu o charco na cova do terreno,
as pedras que emolduravam a serra e, mesmo as azinheiras, vão escasseando na
beira estreita dos caminhos. Pararam por desuso, ao abandono, os moinhos de
vento da Fazarga e da Ortiga.
Hoje
fizeram santos os pastorinhos que morreram crianças. Sabes, não é importante.
Cada mulher é canonizada com cada filho que dá ao mundo. Aos anos que te tenho
neste altar que trago na cabeça, minha Mãe. Apenas por isso te trago aqui!
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