Mãe
A estrada de terra batida
chegava ao bairro vinda de longe, já cansada do caminho. E ali se aquietava um
pouco, numa curva suave e longa, antes de seguir para mais longe, para o Kuando
ou para o Bailundo. De um lado debruando a margem da mata de eucaliptos, do
outro limitando o casario que se ia estendendo para o pequeno ribeiro que,
ainda distante, corria entre o caniço. Era numa casa térrea que funcionava a
escola primária, repartindo o quadro preto da sala de aulas com o balcão da
loja ao lado, onde um barril de vinho repousava sobre o balcão, aguardando a
abertura da torneira e o enchimento do copo de vidro.
Ali tive uma carteira de
madeira – sim, de madeira, talvez mesmo de girassonde – com um tampo suavemente
inclinado, que se levantava, com um tinteiro a meio e dois rasgos para os lápis
de cada um dos lados. O tinteiro era regularmente abastecido de tinta e, como
os outros, utilizei para as minhas primeiras letras uma pena de madeira em cuja
ponta se encaixava um aparo metálico que se mergulhava no tinteiro para o
alimentar, sempre que isso era necessário. Faculdade minha, nunca sujei os
dedos com tinta, nunca esborratei o papel e com alguma facilidade me habituei a
desenhar regularmente as letras e a fazê-las redondas e agradáveis à vista. Sem
erros no ditado e sem rasuras nas cópias e nas contas.
Foi assim e ali que aprendi
a desenhar-te o nome, numa letra redonda e limpa que a professora me elogiava.
E foi assim que fui pondo em cada letra o brilho tranquilo do teu olhar, a
suavidade do teu sorriso envergonhado, a humildade magnânima de teu feitio e do
teu avental de riscado. Mesmo contigo distante de mim, é esse prazer lúdico que
conservo: sentir nos dedos o toque único da primeira pena, depor em cada letra
o alto sentido do meu amor que vem de sempre. Tanto fui aprendendo com tanta
gente e mais ainda tenho para aprender com outra tanta. Mas foi ali que eu
aprendi a escrever, num cursivo redondo e limpo, a palavra MÃE. Para dizer-to
hoje!
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