Manifesto
Face
à indescritível situação que atravessam, o povo e o país não precisam nem de
palavras nem de manifestos. Mas precisam ambos, urgentemente, de tomar
consciência da gravidade dos dias que correm e da definitiva falência do regime
político em que cada vez mais chafurdamos. No tempo de uma anterior ditadura,
que proclamava que Portugal era uno e indivisível do Minho a Timor, o país
roubou-me, a mim e a muitos outros, alguns quatro anos de vida. Em defesa da
Pátria, ensinavam os professores nas escolas e sentenciavam os párocos do
púlpito abaixo. Como se isso existisse, como se isso fosse alguma coisa.
Apenas
porque, na década de cinquenta, António Salazar não foi capaz de ver mais do
que um poder pessoal obsessivo e a forma ditatorial de o manter e, se possível,
consolidar. Não lhe sobrou uma pequena réstea de visão política que, pelo
menos, o alinhasse com os ventos da história. Como se sabe, ou como devia
ensinar-se, ele e o regime cairam da cadeira, ambos velhos e decrépitos.
Caetano, apesar dos anos que ocupou a cadeira do poder, de facto não existiu.
Foi apenas uma excrecência do que já vinha da década de vinte, um lavar de
cestos, um canto de cisne.
Abril
de 1974 acabou, assim, por não ter sido sequer uma revolução. Uma chaimite na
rua fez desmoronar o que ainda restava do regime. As coisas foram tão simples,
tornaram-se tão fáceis, que um grupo de capitães acabou por deslumbrar-se e,
sem experiência, ir acreditando nos profissionais da política que foram
surgindo no palco, impulsionados pela ambição do poder pessoal, das mordomias
de estado, do dinheiro fácil e a rodos. Até ser completamente varrido do
expetro político, vilipendiado, desacreditado, deliberadamente esquecido.
E
Portugal integrou-se naquilo que aprendemos ser um continente e hoje é referido
como se fosse um país: a Europa. A Europa é, em boa verdade, um espaço
geográfico que a Alemanha, no século passado, tentou dorminar pela força duas
vezes. E que, quase no virar do século, acabou por dominar à força do dinheiro
e do poder crescente da alta finança. A Europa é uma manta de retalhos, cada um
deles travestido de democracia, e gerido como uma ditadura a partir de Berlim.
E neste projeto a nossa brilhante classe política foi soterrando a esperança da
nossa geração, o futuro dos nossos filhos, a existência como homens livres da
geração dos nossos netos.
A
economia virtual e a ganância de um vale tudo a que chamaram neoliberalismo,
conduziram ao que, eufesmisticamente, se vai chamando crise e que,
progressivamente, vai subjugando gerações. Definitivamente este regime
democrático faliu e ninguém o diz. O país é tutelado por amanuenses e dominado
por agiotas que exploram o juro e unilateralmente fixam as taxas de juro. Nada
mais será recuperado com palavras e, menos ainda, com atitudes passivas deste
povo sem emprego e sem futuro. Mas vestindo calças de ganga de marca e
utilizando telemóveis de última geração.
É
preciso apelar à consciência coletiva, à desobediência e à insurreição. A todos
os níveis, em todos os momentos e em todos os locais. Em nome de uma réstea de
esperança para a geração dos nossos filhos. Em nome de uma maior centelha de
futuro para a geração dos nossos netos!
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