30 de junho de 2013

Domingo de manhã

Porto. Domingo, manhã de verão. Os termómetros a prometerem mais de 30 graus centígrados. As ruas desertas às oito da manhã, uma brisa fresca que corta a canícula que desce e ocupa todos os espaços. A mesma cidade, perdida no tempo, só ruínas, destroços e palavras ocas de políticos por correspondência. Que prometem a morte à memória da cidade e a ressurreição às carreiras deles, sem esforço, sem trabalho e sem risco.



É cedo para a vida que há de retomar se na segunda feira de manhã, os bancos abertos, os cofres vazios, o contribuinte a transpirar euros para a crise e para a desemprego. É cedo até para a missa de quem usa velhos hábitos de ir à igreja todos os domingos, curvando a cabeça e esperando pela hóstia. Quantas igrejas tem a cidade? Muitas, tantas que nunca serei capaz de nomeá-las todas. Grandiosas, ricas, monumentais. Desprezadas também, à falta de cuidados e de restauro. Fica um nome apenas: Santa Clara, com a sua talha dourada e a vontade de D. João I, a casar se na Sé, do outro lado da rua. No cimo da Penaventosa, um nome a que me rendo, um princípio que me fascina, uma história que se esquece.

Nas esplanadas vazias um ou outro casal de idosos acoita-se à sombra dos guarda-sóis, troca olhares, enreda-se no namoro, nunca é tarde para nada. Há sempre um amor por que se esperou a vida toda e que surge exatamente esta manhã, fugindo à frente do calor e da brisa que lhe ameniza o ímpeto e as intenções. Passeio aqui, passeio acolá, um ou outro grupo de jovens, descalços, senta-se no piso já quente do pavimento. Despertam da noite que não dormiram, com a memória da muita cerveja consumida ainda a transbordar dos copos e das vozes. Magros e doentes, esquecidos até pelo calor que já sobra, há passageiros da droga que vagueiam à procura de destino. Hão de encontrá-lo num portal fechado, onde dê alguma sombra. E hão de dormir pelo dia fora, os rostos e a ressaca contra o fresco do cimento.


Assim, domingo de manhã, com  a cidade deserta, fica me a sensação de que as ruas me pertencem por inteiro. Posso ocupar as sombras, escolher o percurso, atravessar as ruas, ignorar os semáforos. Regressar a casa, resguardar me do calor, ingerir líquidos como mandam. E lamentar esta pena de cidade, sem pessoas e sem vida! Só destroços e promessas ocas...

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