Não chega que o sonho comande a vida
Não chega que o sonho
comande a vida, não chega que a água cristalina dos regatos jorre das
nascentes, não chega que os rios encorpem o caudal e corram para o mar. É
preciso que a vida se confunda com o sonho, realidade e utopia, um vendaval de
cabelos soltos esvoaçando ao vento como bandeiras desfraldadas em cada manhã. É
preciso que a água cristalina alimente as fontes de granito, abandonadas e
secas, como emoções que não inundam os olhos magoados e sentidos. É preciso que
o oceano suba pelo leito dos rios, sal e água doce, peixe e alimento, certeza
mais do que esperança, o pão a nascer nas savanas de África.
Não chega que o teu olhar
sereno e tranquilo, carregado de promessas, se conforme com a beleza simétrica
que os espelhos te devolvem. É preciso que o sintas pulsando ao ritmo a que te
bate o coração, vida e sentimento, a blusa cedendo à firmeza com que se te
ergue o peito pleno de ternuras. Não chega que se te crispem as mãos, os dedos
entrelaçados, os lábios cerrados e sem pintura, a bússola sem se deter,
procurando o norte. É preciso que as mãos se te encham de flores e de certezas,
desenhando cada curva suave do teu corpo como se retocasse uma obra-prima que
nenhum artista foi ainda capaz de reproduzir.
Não chega que o teu sorriso
procure a cor indefinida dos meus olhos e me encha os pulmões do oxigénio com
que vou somando os dias, como se fosse um convite para a descoberta de quantos
brasis ainda há por revelar nas dobras de cada mapa. É preciso que a tua boca
sejam só palavras sussurradas ao ouvido, o perfume inconfundível do teu corpo a
preencher-me cada poro, os teus dedos soltos e esguios a desenhar afectos no
emaranhado dos meus cabelos e no fogo incandescente do teu desejo.
0 Comentários:
Enviar um comentário
Subscrever Enviar feedback [Atom]
<< Página inicial