24 de fevereiro de 2016

Acordei esta manhã às nove horas

Acordei esta manhã às nove horas, como se fosse inverno e chovesse, e chovia. Toda a noite um suor frio a transbordar-me do corpo, um sono profundo a afastar-me do sonho, como se a vida se elevasse no horizonte e não houvesse nevoeiro. Mas na penumbra com que o dia se anunciou, com a humidade a escorrer pelas paredes do quarto, de que ainda resta alguma memória branca da cal, o relógio estava parado à cabeceira da cama, cansado de tudo. Os ponteiros imóveis sobre o tapete, como se já não houvesse tempo para andar e eles, definitivamente, tivessem desistido de dar ordem à vida das pessoas e levar alimento à boca das crianças, sem horas nem minutos.

Levantei-me sem que ouvisse nenhuma música e sem que o calor morno da tua respiração me levasse o perfume ao fundo das narinas. Estava vazio de tudo o copo onde diariamente deixo alguma água com que possa matar a sede. Que já vem de domingo e que me dá, apesar de tudo, alguma razão para pensar nos dias qua ainda faltam para acabar a semana, sem ter como os medir. Não consegui, ainda assim, pedir-te que me estendesses a mão que me não dás, se o não fizer. E por isso a mantiveste imóvel e silenciosa, agasalhada sob um sorriso lento que te pende do olhar, sem te chegar à garganta onde sufocas o grito que não chega a nenhum lugar. Mesmo assim me apetece fazer-te perguntas ternas, como se fosse tempo de sementeiras, os dias futuros aguardando pelo verde das searas, e eu pudesse esperar por respostas trazendo à eira a fartura das colheitas, algures quando chega setembro.


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