O trigo vai crescer para cima
Em mil novecentos e
cinquenta e sete, nas margens do antigo e famoso rio Tibre, os mais altos
responsáveis de uma mão cheia de países, sentaram-se à mesma mesa, posta para o
almoço com talheres de prata e copos de cristal. E decidiram solenemente,
batendo com a mão convicta no peito descaído, como se estivessem na basílica de
São Pedro, desmentir as teorias verdes e absurdas de Bertolt Brecht. Com a
maior e celebrada das imaginações e na mais elegante e bela das caligrafias, chamaram
ao farto repasto “Tratado de Roma”, instituíram comunidades, debruçaram-se
longamente sobre a excelência do menu e decretaram, com as faces carregadas e o
ar circunspecto e responsável que, doravante, em todas as searas o trigo
cresceria para cima. Posto o que, decididos e ágeis, ensaiaram a pirueta,
fizeram o pino e, de cabeça para baixo, assinaram os tratados.
O futuro foi de mulheres
engravidando sob o olhar competente e virgem do clero e dos ministros, com uma
só comunidade unindo-se à beira Tejo e expandindo-se para além das margens do
Danúbio, ao som azul e rosa das valsas de Strauss. Cresceu para além de todos
os dedos que enfeitam o grotesco corpo humano, sempre sujeita à mais do que
igual e inteligente supervisão das ordens de Berlim. Novas verdades se
escreveram nas paredes e outras certezas despontaram no horizonte, do mesmo
lado de que nasce o sol. Inventando os mercados para descobrir o sucesso e
aumentar os lucros da alta finança, saber que é preciso mais esforço para menor
cansaço, menor salário para melhor vida, menos lugares para mais emprego e
nenhum desesperado presente para toda a desesperada falta de esperança no
futuro. E feita a cambalhota, assim vamos: quanto mais se escavam as covas para
enterrar os mortos, mais os buracos crescem para cima e mais depressa se sobe
para o paraíso.
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