24 de outubro de 2016

Vejo-te transparente

Vejo-te transparente pelas sombras vermelhas da tarde. Com o olhar atravessando a transparência da tua pele, eu vejo o mar. As pessoas caminhando na praia, a cor morena da areia agarrada ao peito dos teus pés pequenos. E também vejo o sol. O sol a perder-se pela boca aberta dos porões dos navios, que esperam pela subida da maré para seguir viagem. Vejo o ritmo certo com que te chega aos lábios o aroma fresco do coração. O sangue carregado de vida, saindo-te das aurículas, irrigando-te os passos, brilhando-te no olhar.



Há um ribeiro que te corre nas mãos abertas, a água límpida com reflexos verdes dos nenúfares que te florescem por entre os dedos. Um verde único, que nunca se viu nas noites de lua cheia. Que explode à hora do crepúsculo, quando é mais rápido o voo dos pássaros e mais lenta a velocidade da luz. Quando a noite se anuncia transparente, como os cabelos soltos que te trazem o abraço apertado do horizonte e o horizonte morre devagar no conforto fatal do teu peito. E eu, delicadamente, te ponho os braços à volta do pescoço e te sinto o beijo ardente sob o cor-de-rosa do batom.

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