9 de setembro de 2019

Doze anos, minha Mãe


Doze anos, minha Mãe. E as tuas mãos nas minhas mãos, o teu sorriso nos meus olhos, a tua serenidade no meu peito. As palavras que me faltam e o caminho de regresso que percorro. Já não conheço a estrada que me leva e já não me acenam as árvores que lhe cresciam nas margens. A aldeia são as mesmas casas vazias no fundo do vale. Mas esta desabrida canícula de Setembro chegou corrida a ventos fortes e trouxe com ela as chamas do inferno. Desapareceu o verde dos pinheiros e as cinzas ainda fumegam pelas encostas.

Apesar de tudo, não deixa de fazer-se a Festa Grande. Com os mesmos enfeites, singelos e simples, em papel de seda. A mesma banda, que vem de fora, tocando por entre o pó que se levanta sob a inclemência do sol, até ocupar o palco ao lado daqueles dois carvalhos centenários. A procissão atrás, com o pálio à frente, protegendo o padre – que também vem de fora, para dizer a missa, para a festa e para o que for preciso – e acrescentando dignidade ao cortejo. Depois, cabisbaixos e tristes, os homens dentro dos seus fatos de domingo, suportando o peso dos andores. E as mulheres, quase velhas, arrastando os pés e carregando à cabeça o desequilíbrio esguio das fogaças.

Tudo se arruma à volta do adro, procurando o fresco da sombra sob a copa das árvores. No melhor sítio armei a cadeirinha para te sentares e mantenho-me a teu lado, como se te guardasse. O teu sorriso é uma explosão tranquila que inunda o local, toda a gente te conhece, toda a gente traz palavras doces nas mãos com que te toca. Como a Gata, com aquele azul tão longo a encher-lhe os anos e a sair-lhe dos olhos. Aquele azul tão grande que atravessou o mar ainda antes de o ter visto. Sinto-te feliz sem precisar de to perguntar. Compro um bolinho que mais tarde iremos partilhar. No palco a banda começa a fazer-se ouvir no compasso simples de uma marcha. Porque no meu caminho, silencioso e triste, a dor e a saudade também se tocam alto!