28 de fevereiro de 2005

E de palhaços?

Agora estão outros no circo e não contem comigo para números de trapézio.
[Alberto João Jardim, citado no Público]


De acordo Dr., até porque os números de trapézio podem ser perigosos para a sua idade e para a sua massa corporal. Para evitar falarmos em obesidade. Mas um número que fosse executado na pista, sem nenhum risco de queda, assim de palhaços, para divertir as crianças? Estará o Dr. já disponível? Agradecemos resposta urgente para mandarmos fazer os cartazes de propaganda e para os mandarmos colar pelas paredes. A cobrir outros que apregoavam o amor a Portugal e a utilidade não sabemos de quê!

26 de fevereiro de 2005

Promoção da virtude

A campanha eleitoral de engenheiro Sócrates insistiu no slogan ambíguo e vazio da crença: é preciso voltar a acreditar. A autoria, como se sabe, não foi dele. Que para tão profundos princípios não há engenharia civil que chegue. O autor foi o Sr. Luís Paixão Martins e o seu grupo económico foi o responsável pela condução a nível do país, de concelho em freguesia. Como serviço pago, obviamente, que o Sr. Martins tem família e cão para sustentar e dele dependem ainda os seus colaboradores e as suas famílias, incluindo as empregadas domésticas e as mulheres a dias.

Boneco de António Martins, in Grande ReportagemSobre a crença, é preciso voltar a acreditar em tudo, como se tivéssemos permanentemente a soprar-nos aos ouvidos o ex-bancário, agora bispo e proprietário do cinema Vale Formoso, Edir Macedo. Acreditar nos méritos do Sr. Trapattoni como treinador e na qualidade da equipa principal do Benfica para ganhar o campeonato. Acreditar na despoluição da ribeira dos Milagres e nas declarações do Sr. Madail sobre as dívidas do futebol ao fisco. Acreditar que o engenheiro Sócrates, uma vez empossado como primeiro-ministro, conseguirá a conversão do Dr. Soares e de sua excelsa esposa, relatando-lhes o último segredo de Fátima. Acreditar que a salvação da economia familiar está no euromilhões e não na porcaria de um qualquer emprego, com o código do trabalho tal como está ou ao gosto do Sr. Ludgero Marques.

É preciso voltar a acreditar na virtude e promovê-la. Não acreditar no vício e combatê-lo. Com zagaias, canhangulos, armas automáticas e rezas que peçam chuva. Inclusive com alguidares de azeite a ferver derramados sobre a aleivosia dos viciados que nos sitiam. Como, com tão belo efeito, se fez na tomada de Lisboa aos mouros. Por mais que o equilíbrio das contas públicas aconselhe a redução de ministérios e a reciclagem de assessores, este é mais importante do que seria o do Sr. Bagão Félix se o CDS/PP tivesse ficado a mais de um por cento dos trotskistas e conseguido eleger o Sr. Nobre Guedes como deputado por Coimbra. É precisa, é imperiosa, é inadiável a criação do ministério da prevenção do vício e da promoção da virtude. E confiá-lo a este homem sem mácula, que desconfia da serpente, não mete o dente a nenhuma maçã e usa barbas apenas para disfarçar. Um homem que não cede à vontade de comer carne, mesmo que tenha adquirido a bula, e que se alimenta de chicharros alimados, lentamente passados pelas brasas, acompanhados com salada de alface. E ele sabe, como economista, os proveitos morais que a pureza e o seu estado casto trazem ao país. Por favor, nomeiem-no. A bem do pacto de estabilidade e crescimento. Pela erradicação imediata do tesão e da punheta!

25 de fevereiro de 2005

Rabos de palha

Não são bons indícios para começo engenheiro Sócrates. O trabalho publicado na revista Visão já me pusera de sobreaviso. Por uma razão simples: quem envereda por uma vida pública não deve esconder nada, não deve ter nada para esconder, deve abdicar da sua vida privada. Porque esta vai ser acompanhada, vasculhada, devassada nos mais pequenos e insignificantes pormenores. E ninguém foi coagido a optar por essa exposição. Ela é voluntária e assim sendo deve ser transparente, sem nada na manga. O que naturalmente não dá liberdade de acção a que se lance a calúnia, se semeie a difamação, se propague o boato.

Em termos pessoais a questão complica-se. Desnecessariamente! Porque merecem tanto respeito o professor Freitas do Amaral como o mais anónimo dos septuagenários agricultores que ainda subsistem no país, analfabetos, de enxada às costas, cavando diariamente o sustento do dia seguinte. Que habitam, por ironia, o meio rural de onde provem o engenheiro Sócrates. Mesmo que ele seja, apesar da origem, um privilegiado. Devia fazer-se acompanhar da humildade sadia que pulsa nos corações do campo, devia orgulhar-se dela, não se envergonhar e não esconder nada relativo ao seu passado. Revelar que escola primária frequentou, onde fez o exame do ensino primário, quem lhe ensinou catequese, onde fez a primeira comunhão. Com que idade sucumbiu às setas de Cupido, como foi o primeiro namoro, que estabelecimentos de ensino frequentou, em que anos o fez, que classificações obteve. Mesmo que tenha beneficiado das célebres passagens administrativas tiveram que lhe apontar um dez no livro de termos, se é assim que se diz ou que se dizia. Esta trapalhada não ajuda o engenheiro Sócrates e muito menos a relação dos portugueses com ele. E é logo ele que a alimenta, no site do seu partido. É um evidente sinal de menoridade e, como diria o diácono dos remédios, "não havia necessidade"!

Depois esta relativa ao seu chefe de gabinete. Luís Patrão já foi chefe de gabinete de António Guterres e Secretário de Estado da Administração Interna. De onde saiu vociferando, depois de ter sido forçado a demitir-se no âmbito dos problemas com a Fundação para a Prevenção e Segurança e com o ministro Armando Vara. Um partido que obtém uma maioria absoluta com 45% dos votos expressos, tem que estar preparado para assumir responsabilidades. Para isso deve dispôr de quadros qualificados, competentes e honestos. Que o sejam e que o pareçam, como a mulher de César. Por razões comezinhas o primeiro-ministro indigitado entrega o primeiro ouro aos bandidos. Não é sensato, não é racional, nem sequer é político. Mas não tenha dúvidas de que é muito mau indício! Corrija, rectifique, esclareça, porque está muito a tempo de o fazer. Evite começar a criar o atoleiro tão cedo: tem pela frente uma legislatura para o fazer.


24 de fevereiro de 2005

O candidato que sabe demais

Luís Filipe Menezes era, até esta tarde, um homem que sabia demais e que era ignorado. Até ter apresentado a sua candidatura à presidência dos cacos que Santana Lopes deixará a título de herança. É lamentável que o PSD e o país tenham sistematicamente ignorado tão premonitória personalidade. Que está na política sem precisar, porque tem uma profissão. Que se candidatou a deputado garantindo ir exercer o mandato e que promete candidatar-se a uma câmara como presidente do PSD. Promete a reformulação do sistema político porque o conhece. Promete proeminentes militantes porque já subscreveu outras propostas. Promete ganhar eleições porque já as ganhou. Há oito anos que governa o município da margem esquerda do rio Douro com o sucesso que se conhece, que ele apregoa, que o Futebol Clube do Porto confirma e que o Dr. Rio contesta por egoísmo pessoal. Promete marchar sobre a área metropolitana de Lisboa, sem ajuda nem de cruzados nem de Pacheco Pereira, e reconquistá-la, autarquia a autarquia. Propõe a eleição directa pelos militantes, de forma mais democrática do que se elegem os presidentes do Benfica ou do Sporting onde, como se sabe, alguns sócios são mais sócios do que outros.

À maneira de Mourinho foi moderado e humilde na apresentação da candidatura. Não prometeu a vitória nas eleições do passado dia 20 nem a participação na Liga dos Campeões do ano passado. Mas foi advertindo o PS para que se cuide porque serão devastadores os efeitos da sua vitória. Onde tem andado este supremo salvador de partidos, autarquias e países? Como foi possível deixá-lo andar a perder-se por ignotos sítios, como médico de família, receitando comprimidos para as dores de cabeça e injecções para as hemorróidas? Quem foi que o deixou emigrar a fazer serviço de periferia junto de comunidades de emigrantes? Por onde tem andado que apenas aos fins de semana e a coberto da noite ousa, sob anonimato, frequentar as marisqueiras de Matosinhos a degustar uns camarões de Moçambique? Deus escreve direito por linhas tortas e mais vale tarde do que nunca. Aí está ele, recuperado ao grupo de contra-revolucionários que Otelo se propõe ainda remeter para o Campo Pequeno. Depois de concluídas as obras e inaugurado o centro comercial.

23 de fevereiro de 2005

Mr. Bush goes to Germany

George W. Bush está hoje de visita à Alemanha. Para evitar o afluxo de curiosos, os pedidos de autógrafos e as sufocantes lambuzadelas de beijoqueiros, foram adoptadas medidas excepcionais de segurança. Isso permitirá ainda manter o dito W. Bush longe do contacto directo com vírus e bactérias a que o seu organismo possa não oferecer suficiente resistência. Desconhece-se ainda se a delegação alemã com quem manterá conversações será previamente esterilizada e forçada a usar máscara e bata branca. As ruas por onde passará foram rigorosamente encerradas ao trânsito de veículos, pessoas, mamíferos e outros animais, incluindo aves e invertebrados. Mesmo os serviços de meteorologia foram intimados a eliminar qualquer brisa, pingo de chuva, bruma ou ameaça de nevoeiro. Forças especiais de segurança, armadas até aos dentes, incluindo próteses, ocuparam telhados, sotãos, vãos de escada, estabelecimentos e passeios. Subterraneamente distribuiram-se por condutas de saneamento, impedindo os maus cheiros de chegar à superfície e ratos e toupeiras de se lançarem na perigosa aventura de escavar galerias onde quaisquer dejectos pudessem ter acolhimento. Apenas os painéis de boas vindas, envergados por cidadãos que, por precaução, foram mantidos fora de vista, amordaçados e de olhos vendados, se puderam agitar ao vento com o calor da mensagem: Not welcome Mr. Bush!

22 de fevereiro de 2005

A Internet

Chame-se-lhe choque ou plano tecnológico, à escolha. Mas o país vai ter muito que pedalar para se colocar ao nível dos mais avançados da União Europeia. O quadro que se apresenta, elaborado a partir de dados disponíveis no Eurostat, coloca-nos em 15º lugar na Europa a vinte e cinco, considerando os dados relativos ao ano de 2004. Os países em relação aos quais esses dados não foram disponibilizados não têm que necessariamente estar situados depois de nós. A Holanda apresenta dados muito superiores relativamente a 2002 e 2003 e é pouco ou nada provável que estejamos à frente da Bélgica ou da Suécia sobre os quais esses dados não existem.

No cômputo final ficamos muito aquém das médias da Zona Euro, da Europa dos 15 e da Europa dos 25. E o plano não se esgota na aquisição e distribuição indiscriminada de computadores e de ligações, com preços proibitivos, pelos lares portugueses. Muitos dos quais, convém recordá-lo, não dispõem de saneamento básico, não estão ligados a redes públicas de abastecimento de água e movem-se em zonas de pobreza ou limítrofes. Desprezando mesmo quaisquer considerações sobre a fronteira dessa pobreza e sobre os critérios que a limitam.

21 de fevereiro de 2005

Pelo Porto



Por uns momentos e por diferente razão voltemos ao acto eleitoral de ontem. Apenas por causa do concelho do Porto. Aparentemente a circunstância passou despercebida, mas não deixa de ser espelho da realidade. Entre 2002 e 2005 o Porto perdeu 7.249 eleitores, correspondentes a 3 por cento do eleitorado. A comparação, freguesia a freguesia, consta do quadro acima. A variação, em termos absolutos, vai de um aumento de 34 eleitores em Ramalde a um decréscimo de 1.254 no Bonfim. Em termos percentuais o crescimento é de 0,1% em Ramalde e o decréscimo maior de 12,8% na Sé.

Tanto se tem falado na Porto Vivo, no Metro na Avenida da Boavista, no Palácio do Freixo que muito mais - e muito mais importante - se tem deixado passar como se fosse uma circunstância menor. A Porto Vivo é apontada como a solução miraculosa que a vereação tirou da cartola e a reconstrução - ou o neologismo requalificação - anuncia-se de imediato para a Praça de Carlos Alberto. A bem da indústria da construção civil, do ajuste directo e da especulação imobiliária.

Mas as pessoas, creio eu, sempre precederam as cidades. São as pessoas que as constroem e não o inverso. Em Carlos Alberto, e genericamente na área a abranger pela Porto Vivo, as pessoas serão escorraçadas do seu poiso de muitos anos, sem garantias de regresso. Como se fosse Esparta, o Porto decreta o desenraizamento dos seus habitantes, aumenta-lhes a depressão, apressa-lhes a morte. O Porto que é uma cidade velha, decrépita, ao abandono. Os prédios em ruínas estão por aí, de Santa Catarina a Sá da Bandeira, do Bonfim a Santo Ildefonso, da Sé a Cedofeita.

Não sendo sociólogo e não tendo pretensões, o primeiro problema do Porto é uma questão de demografia. É, depois disso, uma inumerável série de décadas de abandono, sem cuidados primários e sem preservação. O Porto, tal como está e se tiver o mínimo de bom senso, envergonha-se de ser património mundial. E tem razões para isso. As obras são de fachada, pagas com o dinheiro dos contribuintes como gostam de dizer os políticos. Enquanto se ultima a Casa da Música deixa-se que as Fontaínhas vão pela ribanceira abaixo.

Não sou entendido no assunto e não tenho responsabilidades políticas ou sequer profissionais que se relacionem com isto. Mas respeito o meu passado, venero as minhas origens, orgulho-me de quem teve a visão de mandar abrir as ruas por onde me passeio ou plantar as árvores a cuja sombra se acolhem, no Verão, sexagenários grupos de sueca. Por isso me dói tanto a destruição e o abandono daquilo que é património colectivo. Daquilo que, de facto, deveria ser respeitado como património mundial.


Post scriptum (à cause des mouches!) - o nosso vizinho O Vilacondense, que visitamos diariamente e que tomámos a liberdade de incluir num grupo de "links" com o sub-título "Praça Nova", deu-se ao cuidado de fazer esta mesma comparação em relação aos concelhos limítrofes do Porto. Onde o número de eleitores, no mesmo período, invariavelmente aumentou. O que permite consolidar as conclusões deste "post" e, eventualmente, extrair outras. Também concludentes!

Rescaldo

Rei morto, rei posto. Não importa chorar sobre leite derramado. Mas fiquem, a título de rescaldo sem a profundidade da esperada análise de Luís Delgado, algumas curtas considerações.

Bloco de Esquerda - Tenha calma, Dr. Anacleto. Seja sensato. Fale sempre sóbrio, de bebida, triunfalismo e excitação. Pense duas vezes antes de dizer que o Bloco foi quem mais cresceu, deixe para os outros a demagogia suicida. O Bloco teve de facto mais 214.619 votos do que em 2002. Mas o PS teve mais 517.519 e mesmo a rudimentar aritmética do engenheiro Guterres é capaz de concluir que 517.519 é maior que 214.619. O Bloco teve mais 5 deputados e o PS mais 18 e, pela mesma aritmética, 18 ainda é meios que 5. Dão-se por irrelevantes os 4 mandatos que ainda faltam da emigração, mesmo que todos viessem a ser eleitos pelo Bloco. Em termos de mandatos o Bloco tem mais 5 deputados: cresceu 166,7%, o PS tem mais 18 que correspondem a cerca de 17,6%. Mas aí, como apenas o engenheiro Guterres não sabe, 2 são 50% de 4 e 10 são apenas 5% de 200. Embora 10 seja maior do que 2.

PCP/CDU - Jerónimo se Sousa provou que o mesmo catecismo pode ser ensinado de maneira diferente e é isso que também faz a diferença entre os professores que nos ensinam o português e a matemática do nosso descontentamento. Pena que não mude o conteúdo, que se não opte por outro alfabeto, que não haja novas ideias. Mas esse é o grande problema do caso português, incluindo as faixas mais intelectualizadas como as que militam ou gravitam próximo da órbita dos comunistas.

CDS/PP - Os reformados e as feiras e mercados não veneram Paulo Portas e agradecem mais depressa dez euros para a compra de batatas do que dois submarinos que custam um balúrdio e que não servem para nada, nem sequer para levar seja quem for à urgência do hospital de S. José à procura da mezinha para a gripe.

PPD/PSD - Como, à sua maneira, gosta de referir Santana Lopes. Perdeu em todo o lado, apenas garantindo a liderança em Leiria e na Madeira. Sendo igual a si próprio, quando chegou a hora da verdade nem coisou, nem saiu de cima: tiveram de o apear. Perdeu a sua luta contra os poderosos o que se deve, em minha opinião, à infiltração de um membro da família Espírito Santo no seu próprio governo a coberto de ministro dos artistas bem instalados na vida e da atribuição de subsídios para a ópera popular em S. Carlos. Além disso, de há muito que a comunidade internacional condena a utilização de crianças nos conflitos armados: não ocorria a ninguém aquela ideia peregrina do menino-guerreiro. Sensato, como sempre, apenas o Alberto João do bananal: como se compreende que, com mais 15.000 votos, tenha os mesmos deputados que o PS? Deveria ter 3,6 e o PS alguns 2,4, com um deputado sendo laranja até às partes baixas e rosa daí para baixo. Quanto às ditas pudibundas poderiam ser bicolores para satisfação de toda a região.

Partido Socialista - Ganhou em todas as frentes e renovou-se em tudo. Tanto que nem o hotel escolhido para quartel general foi o mesmo e, tirando o próprio José Sócrates que espalharam pelas paredes do país, não se viram caras conhecidas. Apenas apereceram sósias imperfeitos - a clonagem ajudaria muito à qualidade das cópias! - de Jaime Gama, Jorge Coelho, António Seguro, António Costa, Maria de Belém, mas sem se manifestarem disponíveis para ministros. Talvez por dificuldades de fabrico não me apercebi da presença de sósias de Edite Estrela, perfeitamente inimitável, e de Almeida Santos remetido à curta reforma e a um exíguo T2 em Coimbra. Quanto a Sócrates, lê a cábula na perfeição, mas nota-se que não sabe o que ela diz. Seria melhor que se dedicasse ao estudo, deitasse as cábulas para o lixo, deixasse para as estrelas de telenovela o que lhes pertence e se ocupasse do palco a que está obrigado.

20 de fevereiro de 2005

O voto contra

Pronto, está feito! Não tão bem feito como poderia estar, mas está feito. A maioria absoluta entregue ao PS vai representar tempos difíceis: o sacrifício dos pequenos, a supressão de direitos, a colocação indiscriminada de militantes e apoiantes.

Uma coisa é certa: a abstenção reduziu-se porque os eleitores correram às urnas. No essencial para votarem contra. Muito mais do que um voto a favor seja de quem for o voto de hoje foi contra a coligação de Santana e Portas. Que perdeu. Mas fica a dúvida que dilacera: quem ganhou o quê?

Dever cívico

Quer dizer, salta um gajo cedo da cama ao sábado, como sacrílego, atira-se à auto-estrada do norte quase de madrugada, aquieta-se ao ruído monótono dos pneus comendo asfalto e às muitas manchas amarelas que as acácias floridas espalharam na paisagem. Sai em Fátima, desce a Ourém, almoça e sobe de novo a serra para o petisco que engane o burguês hábito da janta e para a pernoita. Corre ao santuário que a noite está fria mas sem vento, atravessa ruas desertas, mira vitrinas fechadas, depara com a capelinha ao abandono de peregrinos. Acende duas velas como contributo para a iluminação do recinto e como prece por um país que medre e pelos amigos que acreditam.

Retorna hoje ao percurso de regresso, com a auto-estrada vazia de excursões para o estádio do Restelo. Acelera, pisando o pedal e a concentração, que este sol na tromba, vindo do lado esquerdo, é mais traiçoeiro que uma emboscada patrulha da brigada de trânsito. Corre a cumprir aquilo a que chamam dever cívico, depois de ter recebido, via SMS, a sacrossanta inspiração como se fosse uma voz de comando a mandar apresentar armas. E chega a esta mui nobre, leal e sempre invicta cidade. Vai à Avenida Camilo, àquilo que foi o Liceu de Alexandre Herculano, onde se concentram não sei quantas mesas de voto da freguesia do Bonfim. A trapalhada é indiscritível, automóveis a monte, condutores a buzinar com a digestão por fazer e a azia a subir-lhes até à boca, arrumadores com que o Dr. Rio tinha acabado todos repescados, ocupadíssimos, hoje é mais caro doutor, com sua licença não aceito moedas dessa cor, pode por aqui, em cima do passeio, de esguelha, direito, atravessado, como lhe der mais jeito. Não se preocupe, não há polícia, se houvesse já nos tinha corrido como perigo público.

Nas traseiras da Câmara, em plena Praça da Trindade, nas barbas de toda a vereação, a cena é a mesma. A freguesia é que é a de Santo Ildefonso: histórica, deserta, decrépita. Nenhuma ordem por perto, a não ser a da Santíssima Trindade. A polícia? Descansa! Esfalfou-se durante toda a semana a bloquear automóveis e a multar os descuidados dos parcómetros, isso é que dá o guito. O resto? Como dizia o Pedroto: tudo a monte e fé em Deus. Porque se não houvesse fé tinha deixado o dever cívico para as calendas!

19 de fevereiro de 2005

Reflexão

Com vossa licença, perdoe-se-me o mau feitio, o arrufo e a grosseria. Mas exactamente agora, quando são passadas as zero horas de sábado, 19 de Fevereiro de 2005, completam-se duas semanas de merda. Durante este período nem a agricultura beneficiou, o tempo continuou frio, a seca persistiu, as sementeiras continuaram por fazer. Os nabos passaram a cortiça subterrânea, as cenouras perderam a cor e o alfobre. A concorrência entre feirantes intensificou-se, os lugares passaram a ser ocupados pelo grande capital, as bancas de venda de enchidos viraram grandes superfícies. Que editaram folhetos policromos, colaram cartazes por detrás do açougueiro, puseram música pimba a inundar os locais com potências que estilhaçaram vidros e derrubaram telhas dos prédios vizinhos.

Procurou-se impingir ao inadvertido cliente todos os trastes avariados e sem nenhum préstimo como os que se adquirem nas lojas dos trezentos. Mesmo oferecendo o crédito expedito pelo telefone, sem burocracia e sem formalidades, a taxas de roubo e a pretexto de perseguir a qualidade de vida que os europeus merecem e de fazer progredir os lucros da banca à razão de vinte por cento ao ano. Agora, cansados os feirantes e falidos os clientes, impõe-se que o dia de amanhã seja de reflexão. Para que os primeiros concluam que, afinal, os lucros ficaram abaixo daquilo que legitimamente esperavam e para que os segundos confirmem que não ganham para pagar as prestações e alguma coisa vai ter que ficar para trás.

A campanha eleitoral, oficialmente, finou-se. Depois de se ter iniciado de parto prematuro, sem crime e sem castigo, de ter libertado um contínuo e forte odor a esterqueira e de ter mantido, superiormente, um indigno nível abaixo de cão, vai a enterrar como o rei momo em quarta-feira de cinzas. Deixando o país mergulhado na Quaresma, obrigado a respeitar o jejum e sem dinheiro de sobra para adquirir a bula. Os pequenos partidos foram ignorados, remetidos a uma vegetativa existência marginal e limitaram-se a ocupar os tempos de antena, por vezes à custa de paspalhos, sem jeito, sem recursos e sem discurso. Ainda assim, à custa de dois automóveis emprestados e de megafones recuperados à sucata, o Dr. Monteiro promete a mudança do sistema e viagens à lua ao preço que a TAP cobra para nos levar de Pedras Rubras à Portela de Sacavém.

Dos outros, daqueles que o estado subvenciona sem nunca falar na má aplicação do dinheiro dos contribuintes, teve-se ainda menos do que se esperava. Os que aspiram a chegar primeiro ao cimo do Alpe de Huez, como Armstrong, falta-lhes sebo nas canelas e a massa encefálica na caixa dos pirolitos. Não assumiram compromissos, não tiveram ideias, não estenderam projectos. São todos, logo à partida, perfeitamente inimputáveis, ninguém exige responsabilidades a um tonto. Todos viram sempre a ramela no olho do vizinho, mas nunca se olharam ao espelho. Apregoaram virtualidades, reclamaram a beatificação, remeteram os adversários directamente para o purgatório, mas não foram à missa, não solicitaram os favores da Virgem e, por precaução, esqueceram-se de passar pelo confessionário.

Hoje, ao menos, será dia de menor ruído e a poluição sonora não irá além dos limites da lota, para os pregões que salientem a qualidade da xaputa e a frescura do chicharro. Amanhã as coisas, garantidamente, mudam de novo. Voltará o mau cheiro das suiniculturas das margens do Liz, a ocupação selvagem da serra da Arrábida, a destruição do maciço calcário da serra de Aire e de Candeeiros. A bem do interesse nacional, da globalização e da competitividade na construção civil. De uma a cinco assoalhadas!

18 de fevereiro de 2005

A intoxicação

O dia amanheceu cinzento. Varrido pelas nuvens baixas e pelo nevoeiro denso das sondagens dispondo sobre os resultados das eleições que hão-de ser. Soprando como vento em redemoinho, forte e sem sentido determinado, rodando como galinha tonta, oscilando como os propósitos patrióticos dos políticos medíocres que conduzem o país. Sete, segundo ouvi na TSF, onde um comentador político se pronuncia como se pilotasse uma aeronave sem instrumentos de navegação e sem ver a pista. Como no jogo da lerpa, vai lá no escuro, mesmo sem ter trunfo e sem ainda conhecer a mão.

Todas elas são exercícios erráticos de ciências ditas sociais. Carregando a exactidão da dízima infinita e o rigor austero do governo do Dr. Santana. Todas encomendadas por alguém e ostentando a mesma isenção com que se comporta o independente ministro Bagão. E ninguém acredita que o Sporting tenha corrido a contratar um avançado para, na próxima época, chegar ao Funchal e perder com o Marítimo apenas por dois a zero. Contrata-se alguém ou alguma coisa para ganhar, não para perder por menos ou para perder por poucos.

Todas as sondagens, ao que parece, escalam pela mesma ordem os dois partidos mais votados. Com maior ou menor diferença entre eles. Depois, daí para baixo, é a alternância como na superliga. Quem está em terceiro aqui surge em quinto acolá e inversamente. Mestre-escola que traiu a vocação, o Dr. Portas, a alimentar-se a pescada cozida com legumes para aí há seis meses, explica o que as sondagens significam. O povinho, pouco que as euforias já foram há trinta anos, benze-se e pasma com a sabedoria e a inteligência de rapaz tão novo, que ainda nem casado é.

Sugerem-se eminências pardas de maiorias absolutas, mais ponto, menos ponto. As maiorias absolutas são o paradigma do espírito antidemocrático: quem as obtém cilindra os adversários e sacrifica os seus apoiantes. Entrega-se ao regabofe e à ditadura constitucional de quatro anos. Vai empregar, a bem do aumento da despesa pública e da redução do défice, "boys" e "girls", rapazes e raparigas, militantes e simpatizantes sem oposição. Politizar ministérios, secretarias de estado, direcções gerais , lugares de carteiros dos correios e varredores das autarquias do Portugal profundo. Para esse peditório nunca dei, para esse peditório também não vou dar desta vez. A bem da convivência civilizada, a bem do interesse colectivo. A bem do país e não da quadrilha!

17 de fevereiro de 2005

Desemprego

O Instituto Nacional de Estatística divulgou ontem a taxa de desemprego relativa ao último trimestre de 2004, que foi a mais alta desde 1998, cifrando-se em 7,1 % e em cerca de 390 mil pessoas sem emprego. Não me interessa, de momento, estar a vasculhar persistentemente números e gráficos e a tentar interpretá-los de forma racional. Faz de conta que os gráficos são do tipo daqueles que o senhor Lopes levou ao debate da RTP: para ver de longe.

Quero apenas registar a explicação que para aquela taxa logo, sapiente, deixou escapar o mesmo senhor Lopes. A Assembleia da República fora dissolvida e os empresários tinham reduzido o fluxo do investimento. Mas então a Assembleia não foi dissolvida já este ano? Ou ter-se-á enganado o senhor Lopes porque de facto deveria ter atribuído as culpas à descolonização, ao 25 de Abril, à fatídica queda da cadeira do Dr. Salazar ou até mesmo às invasões francesas? Haja quem diga que o nosso demissionário primeiro é trapalhão, noctívago, errático, eu sei lá. Mas tem sentido de humor o homem, caraças. Ou então julga-nos todos como se fossemos asnos pegados.

Pelo seu lado, o engenheiro-candidato classificou aquela taxa de trágica, o que sobremaneira me atemoriza. Doravante terei mais horror a 7,1 % do que ao aziago número 13. Recuso-me a pagar 7,10 euros seja onde for e seja pelo que for, rejeito aumentos salariais naquela percentagem e deixo seguir para relaxe o IRS que me for liquidado àquela taxa. E aconselho todos os partidos políticos a dissolverem-se de imediato se, por trágica coincidência, obtiverem 7,1 % dos votos nas eleições do próximo domingo. Digam lá que não gostariam que alguns deles os tivessem e seguissem o conselho?

16 de fevereiro de 2005

É uma pena

Com o tempo a correr, faltam apenas três dias para a abertura das urnas. Os candidatos a patriotas atropelam-se na perseguição ao eleitor e na caça ao voto. Hoje inundaram-me a caixa de correio de cartas, folhetos e panfletos de propaganda. Gastou-se dinheiro a produzi-los e a distribui-los pelas moradas. Para nada. Os que me calharam, por maior utilidade que reinvidicassem, por mais vanguardistas que se afirmassem, por mais horas de mudança que prometessem, foram arquivados directamente, sem necessidade de despacho. Só é uma pena é que todo esse desperdício nos saia do bolso. Cada voto vai garantir ao partido que o receber cerca de 500 escudos, aproximadamente 2,50 euros. A gente de facto não vai votar, a gente vai é gastar dinheiro mal gasto. Que eles nunca dizem ser o dinheiro dos contribuintes. Pudera! Vai-lhes direitinho para o bolso.

15 de fevereiro de 2005

O sexo dos anjos

Eram cinco rapazes à volta da mesa. Todos bem vestidos, todos de cara asseada, todos de cabelos assentes à custa da laca. Todos ainda com o ar bem comportado de quem tinha a primeira comunhão feita. Um deles sem gravata, outro deles sem voz. Este abandonou a peleja, foi juntar-se aos milhões que muito bem sabem que ninguém os ouve. A discussão não pariu nenhuma luz, antes foi frequentemente descambando para a peixeirada, imprópria em gente assim, com tão bom aspecto, a cara polvilhada com pó de arroz. Sobre o sexo dos anjos chegou-se à conclusão de que o não tinham, não se sabe porquê. Quanto ao resto, razão tinha a história que o Estado Novo mandava que as escolas ensinassem. A herança é pesada, o domínio espanhol foi uma merda, a culpa é dos Filipes. Pela salvação da pátria avance o grupo dos amigos de Olivença, reconquistem-na, levem a fé e o império até ao cocuruto dos Pirinéus. Amén!

Zita Seabra & VM

De Zita Seabra pensava eu saber alguma coisa. Afinal muito pouca coisa. Tanto assim que, das duas uma. Ou foi tão precoce que nascida em 1949 logo foi nomeada presidente do Instituto Português da Arte Cinematográfica e Audiovisual em 1944, precisamente cinco anos antes de ter nascido. Ou, inversamente, não teve nenhuma actividade até 1988, ano em que publica um livro. Durante os primeiros 40 anos, supõe-se, andou a estudar. Certamente licenciando-se na praia de Mira, concluindo o mestrado na praia da Figueira, doutorando-se na revolta praia do Guincho. Não a sabia também tão fervorosamente crente e temente a Deus, talvez por nunca a ter visto de véu, carregando a Bíblia numa mão e o terço na outra. Vejo-a convertida, com um ar compungido, nas cerimónias fúnebres da irmã Lúcia. Tem a sua vida terrena orientada e a alma, felizmente, salva. Só não percebo que pudor ou que falta de vergonha leva esta gente a esconder-se do seu passado. Será indigno revelar, no seu currículo de cabeça de lista pelo PSD ao círculo de Coimbra, que foi militante comunista, deputada comunista, viveu com um comunista e teve filhos que lhe fez um comunista? Quem não assume o que foi não assume o que é e é improvável que assuma aquilo que será. Mas pronto, são técnicas de marketing político, procedimentos de vendedor de automóveis em segunda mão!

Dificilmente foram barras em matemática aqueles que optaram pelos cursos de direito. Não admira, por isso, este esquisito sistema de duas equações a quatro incógnitas, da lavra do distinto professor de direito e compulsivo blogueiro Vital Moreira. Os manuais do professor J. Sebastião e Silva eram, apesar de tudo, mais claros e comprensíveis.

Luta livre americana

Hoje realiza-se o único debate com a presença dos cinco maiores partidos com representação parlamentar. Por quanto se viu no período de pré-campanha, no anterior debate com a presença de Santana e Sócrates e no período de campanha já decorrido, um só debate é excessivo. Mascara-se o acto de democracia, sentando à mesma mesa quem tem 105 deputados, como o PSD, com quem dispõe de apenas 3, como o BE. Os partidos sem representação parlamentar, bem como os eleitores, ficam de fora. O sistema político limita-lhes a participação cívica à deposição de um papel num caixote de madeira, em data fixada pelo Presidente da República, e o forçado retorno à apagada e vil tristeza de todos os dias. Até ao próximo acto eleitoral.

Depois, como sempre, já se sabe quais serão os partidos mais votados e de onde sairá a semente do novo governo, que não governo novo. Além disso, as mais profundas e objectivas ideias que os senhores têm sobre as propostas para o país esgotaram-se nos primeiros quinze minutos que lhes foram dados para que as expusessem. Se disso restassem dúvidas, basta que se atente um pouco nas perguntas que o Jornal de Notícias desafiou cada participante a endereçar aos restantes e que não estão em linha.

Santana Lopes - não enviou perguntas, pelo que se assume não ter nada a perguntar a nenhum dos seus opositores políticos. Sabe já tudo sobre cada um. Mandou certamente espiões aos comícios e aos almoços e jantares da concorrência, que se empanzinaram à borla e recolheram indicações preciosas sobre os pontos fortes e fracos no ataque a na defesa. Ficaram sempre até ao fim, não prescindiram sequer dos digestivos, e têm justificação psicológica para os três golos sofridos pelo Sporting no Funchal e para os cinco marcados ao Rio Ave no domingo passado.

José Sócrates - comportamento idêntico ao de Santana Lopes, que se apresta para substituir como treinador da equipa principal. Sabe quantos pontos já perdeu o Futebol Clube do Porto no estádio do Dragão, quantos golos sofreu e os minutos a que foram marcados. Conhece os erros dos árbitros e tem presentes os fora de jogo não assinalados e os frangos do campo saídos da quinta que Vítor Baia possui nas praias a sul da foz do Douro.

Paulo Portas - enviou uma pergunta para cada um dos seus opositores, sendo que a nenhum ousa perguntar a data de nascimento de José Mourinho. Mostra-se preocupado com os impostos que os reformados, beneficiários da pensão mínima, terão que suportar para pagamento da Via do Infante e das férias do "jet set" na Quinta do Lago.
  • Para José Sócrates:

  • Como conseguirá pagar as SCUT sem que isso signifique mais impostos para todos os contribuintes?

  • Para Santana Lopes:

  • Que pergunta gostaria de me fazer?

  • Para Jerónimo de Sousa:

  • O PCP defende a saída de Portugal da OTAN e é contra o actual modelo da União Europeia. Saberá os custos dessas medidas para o país?

  • Para Francisco Louçã:

  • Quando aceita esse factor elementar que é a existência da Aliança Atlântica?

    Jerónimo de Sousa - mandou também uma pergunta para cada um, mostrando-se especialmente preocupado com a situação de desemprego que se adivinha para Santana Lopes.

  • Para José Sócrates:

  • Que ideia é essa de um partido socialista propor o aumento da idade de reforma além dos 65 anos?

  • Para Santana Lopes:

  • Que vai fazer depois da derrota nas eleições?

  • Para Francisco Louçã:

  • Que lhe passou pela cabeça para fazer aquele disparate de afirmação perante Paulo Portas?

  • Para Paulo Portas:

  • Fala tanto das coisas positivas do seu Governo e porque esconde as graves responsabilidades que teve nas acções negativas?

    Francisco Louçã - Também uma pergunta por cabeça, não lhe escapando a importância fundamental da opção nuclear da Coreia do Norte relativamente à produção de fenómenos do Entroncamento.

  • Para José Sócrates:

  • Vai manter o projecto dos hospitais PPP, incluindo os concursos já iniciados em Loures e Braga?

  • Para Santana Lopes:

  • Vai apoiar a candidatura de Cavaco Silva, depois de ser derrotado nas legislativas?

  • Para Jerónimo de Sousa:

  • Como comenta a opção nuclear da Coreia do Norte?

  • Para Paulo Portas:

  • Defendeu quotas para os emigrantes. Como explica que o seu Governo só tenha autorizado três emigrantes de Janeiro a Setembro de 2004?

    Fico eu próprio ansioso e quase não lamento não ver hoje o Malato a fazer perguntas no um contra todos para assistir a este género inútil de luta livre americana de todos contra todos. A minha empregada doméstica, que já reivindicou a internet, apavora-se com a perspectiva do Portas vir a ser de novo ministro e autorizar a entrada de mais alguns quatro emigrantes vindos de leste. E mesmo a minha cadela boxer, com tanta ansiedade à sua volta, anda numa roda-viva. Certamente na dúvida por não saber se alguém se terá lembrado de que ela também precisa de ração para sobreviver.

    14 de fevereiro de 2005

    Mais papistas que o Papa

    Portugal é o país da polémica estéril, da atitude oportunista, da discussão sem argumentos. E isto, se todos nós fossemos sensatamente lúcidos, já teríamos tido tempo mais do que suficiente para o entendermos, para o evitarmos e para o corrigirmos. Mas não! O país divide-se de forma exacerbada, nunca se tolera o adversário, não se aceita opinião diferente da nossa, a razão está do lado da posição que assumimos. Tudo o resto é heresia, atenta contra a moral, a religião, a família e os valores a que alguns aludem. Sem os especificar, que isso é coisa que não convém por aí além.

    Lúcia de Jesus, uma velha freira de quase noventa e oito anos, faleceu ontem em Coimbra na mesma clausura em que viveu as últimas décadas da sua vida. O português comum, aquele que se levanta meio de madrugada, que se apressa para apanhar os transportes, que ansiosamente espera pela hora para picar o ponto e sair do emprego, dificilmente ouviu falar desta religiosa. Identifica-a de imediato se lhe falarem dos pastorinhos de Fátima, aqueles que, nos idos de 1917, foram os privilegiados videntes das diversas aparições de Nossa Senhora na charneca da Cova da Iria.

    O país, de uma forma geral, não sabia em que convento estava a religiosa Lúcia, como passava os seus dias, desde quando estava doente. Isso não impediu que o governo que exerce funções com contrato a termo, como qualquer amanuense, tivesse decretado um dia de luto nacional pela morte da senhora. Camões, se fosse vivo, não teria beneficiado de tamanha honra e Pessoa, como se sabe, apenas foi transladado para os Jerónimos quando o poder político entendeu que era maior o merecimento da obra do que o tamanho da cirrose e o consumo de bagaço.

    Dois partidos políticos, pressurosamente, suspenderam as actividades da campanha eleitoral por dois dias. Segundo disseram, em sinal de respeito para com a figura desaparecida. Passados os dois dias, desgraçados de nós, voltaremos a ter a demagogia balofa, as nenhumas ideias, os propósitos caciques, até que se fine o período que a lei estabelece. Sintomático é que a propósito de tal suspensão se pronunciem respeitadas figuras da igreja para dizer que a mesma não era necessária. O que é óbvio! Não é por não me benzer quando entro numa igreja ou por me não prostrar de joelhos virado para o altar-mor que manifesto menor respeito pelo templo e pela religião. Isso foi, o que mais ou menos, quiseram dizer alguns bispos.

    Não gostou do que ouviu o Sr. Ribeiro e Castro, que acha pouco crentes as figuras religiosas que apelidaram de oportunismo político a suspensão das acções de campanha. E quero crer que, nos momentos que a sua actividade política lhe deixar livre há-de ir, de catecismo empunhado, ensinar os rudimentos da catequese ao bispo resignatário de Setúbal. Porque essa, no fundo, é a sua verdadeira vocação.


    P.S. (de post scriptum, mas podia ser outra coisa qualquer) - Um terceiro partido, que nos promete um rumo e uma nova religião em que possamos acreditar, ficou-se pela compungida hesitação entre o ateísmo militante do seu histórico patriarca e a devoção convicta do seu beato oficial. E assim sendo não respondeu sim e não respondeu não. Sensatamente ficou-se pelo "nim". Nos arraiais, feiras e mercados mandou recolher os zés pereiras e desligou os megafones. Debaixo de telha, como se possuísse licença de isqueiro, proclamou o ateísmo e a independência entre a igreja e o poder político. Tudo em pratos limpos!

    13 de fevereiro de 2005

    Sociedade secreta

    Marco António Costa. Não fosse a traição do apelido e este rapaz poderia ter outras aspirações e outra sorte na vida. Ir além do contrato a termo, por seis meses, como ajudante de ministro e, mesmo assim, com a ajuda de uma empresa de "out sourcing" - que já agora também eu me preparo para o tal choque de gestão que aí vem, feito meteorito, importado da estranja, actualizando o dialecto. Mas o apelido não ajuda, não casa, não rima com nome tão nobre, tão sublime, tão carregado de história. Costa! Quando a Carris utilizava o serviço diligente de revisores, metade deles chamavam-se costa, a outra metade eram primos direitos. A espécie extinguiu-se, sucedeu-lhe uma nova categoria de revisor que se sacrificou, pediu dinheiro emprestado na terra, tirou as cartas de condução e hoje também é motorista. Promoveram-no, chamam-lhe agente único, não lhe aumentaram foi o ordenado porque isto, dizem todos os ministros das finanças, está mau. Mas raramente se chama costa. Costa é vulgar, ouve-se na feira de Espinho todas as segundas-feiras, grita-se na lota de Matosinhos, muitos ardinas, quando os havia, também respondiam à chamada antes de arremessarem o Diário Popular para a varanda do quinto esquerdo.

    Apesar disso este, não se sabe como nem porquê, é o presidente da distrital do Porto do PSD. Talvez por qualquer capricho elitista do médico que assiste ao parto de posturas municipais, se calhar por impossibilidade do major-rei, que já tem muito que fazer e este cargo, ao que parece, não oferece remuneração que dê para investir na bolsa. Diligente, Marco António escreveu aos militantes do seu partido, utilizando um sobrescrito sem nenhuma identificação, muito em segredo, assim ao modo que o Zé Mourinho treinava o Futebol Clube do Porto, à porta fechada, e sempre com uma dúzia de atentos observadores mirando o céu, não fossem lá pendurar-se os espiões mandados a voar em pneus retirados aos automóveis do stand no Alvalade XXI. Diz coisas importantes, que convém manter em segredo assumindo a distrital, por isso, o estatuto de sociedade secreta.

    É que se isto tudo se sabe não há manipulação de sondagens que resista, tudo se arrasa, o tal de tsunami desce da Serra da Estrela, transborda do bazófias, submerge os arrozais e estraga todo o trabalho que o Dr. Santana com tanto afã plantou na praia da Figueira.


    Questão de vocação

    Vital Moreira tem, voluntariosamente, assegurado os serviços mínimos da propaganda eleitoral no mais do que isento e independente blogue a seis teclados, fora os portáteis. E tem-no feito com persistência, alcançando uma talvez não solicitada maioria absoluta, aqui ou ali perturbada por uma retornada de Jacarta, de momento emigrada em Estrasburgo.

    Os "posts" - ou postas, sei lá eu! - são curtas, coligidas da chamada comunicação social, procurando ser ferros - que não são - ou aplausos para ouvidos surdos a que se não divisa o gesto. Mas que se imagina. A esta, por infelicidade, chamou ele "Uma questão de confiança" para adiantar que:

    Segundo um inquérito do Expresso, 63% das pessoas comprariam um carro em 2ª mão a José Sócates, mas somente 19% o comprariam a Santana Lopes.
    Se é assim com um carro usado, o que não será com o voto?


    Só a questão final é pertinente e, sem nenhum sentido figurado, de cátedra. Porque a ilacção que daquilo, lógica e legitimamente, se pode extrair é que o engenheiro beirão tem muito mais vocação para vendedor de automóveis em segunda mão do que o alfacinha dos Olivais. O que já se sabia: este é muito mais hábil nas ditas festas da sociedade - anónima, por quotas ou em comandita simples! - e nos negócios da noite.

    11 de fevereiro de 2005

    Revolucionário XXI

    Pronto, estou quase convencido sobre o que melhor serve o futuro do país e que, naturalmente, mais depressa conduzirá à minha tão ansiada felicidade permanente. Quer na vida eterna, mesmo sem ser maometano, com direito a setenta virgens e até mesmo nesta, terrena demais, com direito a outras quarenta. Fica-me por saber como será realizado o concurso - agora, não sei se já repararam, nos jornais escrevem "procedimento" - ou se será por ajuste directo e depois onde é que o fornecedor se vai desenrascar. Mas isso é problema dele e é problema menor, comparado com a felicidade por que espero desde que, com a providencial ajuda dos garbosos oficiais de sua majestade a rainha de Inglaterra, os atrapalhados soldados de um general corso de meio metro de altura e mão sempre metida na braguilha, viraram a cara à ocupação, deixaram ver as fardas rotas no cu e se meteram, de regresso, a caminho dos Pirinéus.

    Depois de saber que o Dr. Portas é o revolucionário do século XXI, - assim um género de dirigente máximo, infalível e omnisciente da Política XXI - assentei os pés no chão e convenci-me, de vez, que percorremos atalhos de um novo século de prosperidade há já cinco anos. Tenho andado distraído e nem sequer tenho reparado que o sociólogo Dr. Boaventura abandonou de vez a inspiração poética e se limita a ir aos congressos dos pobres, a Davos, para discutir o seu - deles! - futuro e decidir em que investimentos que lhes proponha o Dr. Cadilhe hão-de aplicar as suas crescentes economias. Apenas um contra, ligeiro, que na próxima noite cederá certamente a uma decente dose de xanax. Passei a noite anterior a sonhar com o Dr. Portas e a sua irresistível figura de revolucionário - o que, louvado seja Deus, me não causou nenhuma erecção! - com barba rala e comprida, de boina, confundindo-se com Che Guevara, como se fosse uma t-shirt trazida de uma viagem às Caraíbas. Montado num tanque russo recuperado das guerras no médio oriente, assumindo o comando e entrando triunfalmente no bairro da Boavista, a nova capital da ditadura democrática do proletariado. Imponente no orgulho, demolidor no metro e sessenta de estatura, consciente da sua missão de inspiração divina. Também com direito a muitas virgens, tanto cá como lá!

    Bastava, mas às vezes a imprevisível sorte é muito mais pródiga connosco do que o euromilhões. O Dr. Santana, também ele, acaba a sair-se muito melhor do que nos confrontos com o Dr. Pôncio, sobre o jogo da bola, na televisão de serviço público. Adverte-me que aquele grego que é secretário-geral do PS e candidato a deputado afinal, o grande sacana, anda a enganar os pobrezinhos todos com aquela merda do rendimento mínimo que o Francisco, num vão da madrugada, bêbado como uma cacho, me diz não lhe chegar sequer para a cerveja que está mais cara do que a gasolina de 98 octanas. E que o faz apenas para o branqueamento da consciência e, se calhar, de capitais que não se sabe nem onde, nem como foram ganhos. Porque depois, à sorrelfa, vai fazer privatizações por ajuste directo, atribuir a gestão dos hospitais a um grupo de ricos, diminuir a carga fiscal aos lucros da banca, entregar a exploração da água da chuva a um grupo ambientalista, permitir a construção de torres com trinta e cinco andares à beira Tejo, até ao Bugio e deixar todas as suiniculturas na mão de quem estão.

    Acho que o Dr. Louçã perdeu tempo a estudar a enciclopédia que enumera tudo quanto fez, em quatro meses, o Dr. Santana, incluindo as poucas horas de sono e as patuscadas com os amigos nos confortáveis aposentos de S. Bento. O discurso deste arrasou-lhe o estudo e as intenções. Se estivesse no seu lugar ia deitar os papéis velhos num ecoponto, enrolava as bandeiras e sentava-me num banco da avenida a ler os anúncios de emprego do Diário de Notícias e as sensatas crónicas sobre a síndrome da erudição subscritas pelo também revolucionário Luís Delgado. Jerónimo de Sousa, esse, poderá assegurar que afinal o muro de Berlim continua de pé, informar o camarada Bernardino que a Coreia de cima é uma transparente democracia, garantir que Estaline está no céu, em relevante lugar que lhe reservou o protocolo celestial, onde é mais venerado do que os pastorinhos de Fátima. Só não pode correr a levar a boa nova ao Dr. Cunhal porque um rebate de consciência lhe amplificará as dúvidas como colunas de som de 50.000 watts: porra, afinal a revolução bolchevique serviu para quê?

    10 de fevereiro de 2005

    Kate Moss








    Não sei como nem porquê um largo número de pesquisas vem aqui dar, à procura desta rapariguita que completou 31 anos em 16 de Janeiro passado. Pronto! Para lhes satisfazer a curiosidade aqui fica uma fotografia da moça, em tamanho reduzido. Mas olhem que a rede está cheia delas, de todas as formas, em todas as posições, envergando as mais diversas indumentárias.

    Essa não D. Simone

    Essa não D. Simone! Então a senhora recebeu um convite do PSD para estar presente num jantar com personalidades ligadas à cultura do país e esperava que o repasto, para além da sobremesa, do café e dos digestivos, visasse depois a recolha de fundos para a aquisição de uma sede para um agrupamento de escuteiros ou, eventualmente, o lançamento da candidatura do senhor cardeal patriarca ao ceptro papal. Mesmo sabendo-se que nunca nenhum papa foi eleito por sufrágio directo dos eleitores inscritos neste país de carnaval, incluindo os dos concelhos de Alcochete e da Moita do Ribatejo.

    Tivesse a D. Simone a provecta idade da D. Agustina, carregasse atrás de si os sucessos editoriais que ela carrega, suscitasse a mesma pacífica submissão que ela suscita e isso tudo lhe seria desculpado. Com os habituais desabafos de atribuir à idade e às cataratas a visão insuficiente e o erro da pontaria. Mas essa de ir a um jantar onde, à volta da mesa, o Dr. Santana disserta sobre a erudição do seu livro de crónicas sobre a bola e a superliga, e esperar encontrar-se com o verdadeiro Santo António de Lisboa, muito solene no seu altar, não lembra ao diabo. Saiu o tiro pela culatra, à conta das velhas G3 que fizeram a guerra colonial e que o ministro Portas ainda não substituiu, apesar dos protocolos. E saiu-lhe um daqueles santos das Caldas, de hábito preto e comprido, a que se puxa um cordel pendente das costas. Para que exponham as suas propostas eleitorais!

    9 de fevereiro de 2005

    A crise

    Vocês, fazem favor, mantenham-se atentos ao que é acessório. Dispersem a atenção por porcarias supérfluas. Achem giro o passeio do Santana à volta da piscina que nós pagámos, acompanhado por metade da filharada. Atentem nas propostas concretas que vos faz o Sócrates quando critica o facto durante dez minutos e conclui a dizer que, por caricato, ele não merece comentários. Fixem-se no Portas, com residência no Forte de S. Julião, e na pose da gajo respeitável que tem assumido, como se fosse incapaz de sacar a carteira a uma varina da Nazaré enquanto a lambuza de beijos. Os dois primeiros, isolados ou com a companhia deste que hoje saiu à rua para a campanha, embuçado e em segredo, vão seguramente apoderar-se do poder nas eleições do próximo dia 20.

    Façam ao menos um curto intervalo e leiam esta Grande Tanga do Joaquim Fidalgo. Olhem para alguns números que ele menciona e que eu vos preparei em forma de quadro, para mais fácil leitura e para melhor entendimento. Recordem-se que somos os da cauda da Europa em tudo, mas que temos meio milhão de desempregados, o que deve corresponder à população da cidade do Porto. E penitenciem-se pela culpa indesculpável que vos cabe na crise que varre a banca e que estagna a venda dos automóveisa de luxo. Proponham que vos tornem o emprego mais precário, que vos comprometam ainda mais o futuro dos filhos, que vos congelem os ordenados à moda da Ferreira Leite e que vos aumentem os impostos a pretexto do patriotismo solidário e do enriquecimento sem causa. Mas fazem o favor de não se queixar!



    8 de fevereiro de 2005

    Boatos


    Lá como cá o boato é como uma praga de gafanhotos. É isso que faz de nós um país desenvolvido que, sozinho, começou por conquistar Lisboa aos mouros. Descobriu o caminho marítimo para a Índia, aportou por engano a Terras de Vera Cruz. Perdeu Goa, Damão e Diu, fez uma revolução com cravos, iniciou-se numa Europa com doze e depois quinze. Já vai numa Europa a vinte e cinco, sem ter ganho o Euro 2004 e sem estar qualificado para o mundial de 2006. Orgulhosamente tem um primeiro-ministro que não confunde o carnaval com propaganda política e que, com sabedoria, destrinça um nabo de uma laranja, mesmo quando se confundem. Se este país não tivesse aliados não tinha a Base das Lages e não tinha ajudado a libertar o Iraque, a promover eleições livres e a possibilitar o tratamento familiar de José para cá, Pedro para lá. Como Juca Chaves apregoava, este país é corno mas é feliz!

    Bloqueio da campanha



    De forma inteligente e sensata Santana Lopes suspendeu hoje, terça-feira de Carnaval, a sua participação na campanha eleitoral do PSD.
    Ninguém o compreendeu! A última coisa que alguém, alguma vez, espera daquela cabeça é que possa ser inteligente e sensata. Marques Mendes desafia-o, Pacheco Pereira insulta-o, Luís Delgado esforça-se por cantar-lhe os feitos, mas não sai da mediocridade das pequenas redacções escolares, mal paridas e sem uma centelha de talento.

    Já quando o aposentado professor Cavaco o amarrou à cultura do país, para que não se tresmalhasse do rebanho, as expectativas subiram alto no Parque Mayer, dos frequentadores do Capitólio ao vasto elenco do Variedades. Julgaram aqueles que, à conta do subsídio, Manoel de Oliveira iria realizar pornografia falada em português legítimo e César Monteiro iria levar às pantalhas histórias de fadas, eventualmente com lobos e capuchinhos vermelhos pelo meio. Quanto ao elenco do Variedades cada corista sonhou vê-lo aparecer no camarote que o protocolo lhe destinava, assistir ao último acto, ir procurá-las ao camarim e, uma a uma, levá-las para a cama, ensinar-lhes o essencial e fazer delas primeiras figuras. Ao invés, o homem não se perdeu pelo camarote e tomou o sentido de Cascais. Em menos de um fósforo estava de namoro com a gestora de eventos Cinha Jardim, juntaram tralhas, trapos e coisa e tal, foi a única a compreendê-lo. Tanto assim que o mandou de volta, carregando os utensílios de higiene e a roupa interior, pouca, que tinha levado de enxoval.

    Em casa de um seu sogro que era general conta-se que o faziam entrar pelas traseiras, o sentavam à mesa da cozinha, lhe serviam o que tinha sobrado do jantar. Uma humilhação! Um seu colega tão de peito como José Barroso chegou a dizer-lhe que nunca se deitaria com a filha de um tal sargento e a compará-lo a um híbrido de Gabriel Alves e de Zandinga, falando de um desafio dos regionais como quem epicamente descreve a viagem de Vasco da Gama até à Índia e, como se isso não bastasse, fazendo que jorrassem moedas de um euro de todos os narizes que lhe ocorresse apertar, incluindo o de Paulo Portas cujas dimensões concorrem com o periscópio de um dos seus submarino.

    Na Figueira, quando chegou mascarado de presidente da câmara, chegaram a tomá-lo por um antigo caçador de leões, retornado das savanas de África, quando deram pela plantação de palmeiras no areal e ficaram à aguardar que, numa noite escura, pudesse surgir empoleirado numa delas, à espera da matilha para disparar pela certa. Ninguém chegou a ouvir o estampido de nenhum tiro mas os resultados apareceram à vista desarmada, sem grande espera e sem defuntos leões espalhados pelo chão. Disparar, dispara sempre e se não abate ligeiros pardais sempre degola menos esquivas minhocas.

    Agora, quando lhe suspendem a ventilação na incubadora e a canalha, irrequieta e armada de navalhas de bolso adquiridas na Feira da Ladra, se entretém a golpear-lhe as costas, mesmo assim, ela ousa. Contra ventos, marés, facadas, Marques Mendes e Pacheco Pereira, sai de Belém a espumar como um touro acabado de lidar na arena do Campo Pequeno e anuncia que vai regressar pela mesma porta, envergando o mesmo fato, acompanhando o chefe da casa civil até à intimidade dos aposentos do Dr. Sampaio. Faz saber que hoje ninguém leva nada a mal por ser carnaval, risco que não pode correr e que, por isso, não participa em acções de campanha. Não vá alguém, por infortúnio, não lhe levar nada a mal mas tomá-lo a sério. Coisa que, ao longo do ano, ninguém arrisca. A não ser alguma aparição furtiva num qualquer desfile de moda, a certificar-se das medidas dos modelos, ou alguma breve sesta que o ajude a digerir a pizza quatro estações encomendada pelo telefone. A pagar pelo orçamento!

    6 de fevereiro de 2005

    Como Fantomas

    Sábado de manhã. Porto, Fátima, Ourém. Almoço. Visita aos buracos nas ruas da cidade. Confirmação de que David Catarino e a sua vereação continuam a esmerar-se. É conveniente, se querem ser reeleitos e prosseguir na defesa intransigente do desgraçado munícipe. Aquela da limitação de mandatos ainda não está em vigor, pois não? Saída pela estrada 113, até aos Pousos. Regresso, Quinta da Sardinha, Fátima, Ourém. Subida até Fátima, ameijoas, 2 finos, curta volta para visita às ilhas ecológicas do presidente da Câmara, ruas desertas, brisa suave, frio de rachar. Santuário vazio, negócio congelado. Pernoita.

    Domingo gordo, entrudo. Descida até Ourém, estrada 113, Charneca do Bailadouro, cozido à portuguesa. Regresso por Fátima, Santuário de Nossa Senhora da Ortiga. A inflexível acção de David Catarino na preservação da serra, licenças de construção muitas, vivendas juntas ou isoladas, tipo "maison" ou novo-rico à custa de dormidas, comércio de estearinas, venda de bifanas e cerveja. Ourém, avenida Nuno Álvares Pereira cortada ao trânsito, corso de carnaval. Vinte carros, muitos figurantes, ainda mais figurões. Vão sendo horas de regresso. Fátima pela estrada de Alvega, rotunda sul, auto-estrada do norte. Porto. Como Fantomas: o regresso certo ao local do crime.

    Do mesmo jaez. Domingo gordo, entrudo, regresso do engenheiro fugitivo a um comício de campanha onde ninguém tem nada de novo para dizer, em Castelo Branco. Recordam-se-lhe a inteligência acima da média, a licenciatura com média supersónica, a descabelada demagogia, o enfado do trabalho e das chatices que ele dá. Os mais inteligentes, diz-se à boca cheia, são os mais preguiçosos, os menos determinados. Apela ao regime de ditadura por quatro anos a favor do discípulo, nunca a pediu para ele, salienta com ênfase. Não é uma mais valia: quem foge da cara do touro nunca pode ser bom pegador. Acabará sempre por ser colhido, nunca conseguirá rabejar o boi cansado, seis ferros no cachaço, a espuma nas ventas resfolgantes. Como no resto, como Fantomas: o regresso certo ao local do crime!

    4 de fevereiro de 2005

    O parto

    A montanha pariu dois ratos. Não pela irreverência, pelo irrequietismo ou pela argúcia. Ao contrário: pela pequenez, pela falta de ideias, pela ausência de projecto. Mais do que isso: pelo medíocre comportamento. Bastou que lhes chegasse ao nariz o perfumado aroma de um queijo suíço para que tentassem correr à desfilada e se atirassem a ele de cabeça. Tão desajeitadamente que ambos acertaram num buraco, estatelando-se do outro lado, dando de costas no empedrado. O Gruyère manteve-se intacto, à espera de quem se fizesse acompanhar de uma bolacha adequada e soubesse saboreá-lo com o requinte que merece. Moral da história: há queijos que não merecem morrer ingloriamente nos caninos de qualquer rato.

    Mas, pela agitação que reside no porão, pela falta de eficazes raticidas e até mesmo de remédio para as baratas, parece que o destino nos ignora de novo e se prepara para nos impingir um destes cromos para nos dirigir. Por uma vez, nossa senhora dos actos eleitorais, padroeira de charlatães, inúteis e chacais: tende piedade de nós. Atende ao nosso desconforto e livra-nos do poder bruto de um triunfo que reclamam, em nosso nome e para nosso benefício, que seja absoluto. Maioria absoluta não!

    3 de fevereiro de 2005

    Idi Amin Guedes

    Idi Amin Dada, sob o pseudónimo de Luís Nobre Guedes, empossado demissionariamente no cargo de ministro do ambiente, apelou hoje a um movimento popular que impedisse, fosse por que meios fosse, o acesso do filósofo Sócrates, utilizando o nome próprio de José, no desempenho do cargo de secretário-geral de um grupo com objectivos ainda por definir, à cidade de Coimbra onde, como se sabe, toda a gente estuda e se limita a queimar as pestanas. Para além disso ninguém tem tempo para frequentar ginásios e queimar pneus para poder exibir-se convenientemente nas praias no decurso da época balnear que se aproxima.

    Não se pode dizer que está tudo maluco. A verdade é que está muito mais maluco do que se pensa. E a família não sabe!

    O desbaste

    Com a campanha eleitoral os colos que por aí mais abundam são de natureza política. Dispenso-os! Acolho-me a um regaço que me sirva algum entretenimento e consiga divertir-me alguma coisa: a vida está difícil, o ordenado curto, a retoma só chegou aos lucros da banca. Sintonizo a TSF onde lamento que o Sr. Jorge Perestrelo não possa ocupar toda a emissão, de 24 horas por dia, com entusiasmados e sabedores relatos da bola. Contento-me com uma coisa a que chamam fórum, no qual as pessoas podem participar desde que se inscrevam previamente, se disponham a perder uma hora agarradas ao telefone e vejam a chamada cair três vezes. O que ainda é pouco porque num programa que visa o entretenimento não se podem admitir participantes que pensam ser sempre sérias todas as palavras que dizem, mesmo quando repreendem os filhos ou ouvem o sermão do púlpito abaixo.

    A capacidade de fazer rir não é um atributo inato, uma coisa que nasce com a pessoa, perfeitamente individual e inconfundível como o ADN. É uma qualidade que se trabalha, que se treina, que se procura melhorar. Se assim não fosse, cada remate do Eusébio teria resultado em golo, mesmo que direccionado para além dos limites da baliza, ainda que embatesse nos postes, mesmo que agarrado pelo guarda-redes. Por isso fazer rir é tarefa de profissionais como o Sr. Raul Solnado e vejam que, mesmo ele, só foi capaz de o conseguir à custa da guerra de 1914-18 quase cinquenta anos depois.
    Serve isto para dizer que as melhores piadas são sempre dos convidados, aqueles que se fincam à política no cumprimento de uma divina inspiração, no denodado afã de serviram desinteressadamente o bem público e a comunidade. Que Deus lhes pague!

    O de hoje começou logo por ouvir dois relevantes dirigentes do PSD e do PS, cujos nomes não retive, o que é perfeitamente dispensável. Acontece-me quase sempre: quando o palhaço me faz rir até às lágrimas é certo e sabido que lhe não aprendo o nome nem fotografo as feições pintalgadas de farinha. Ambos hoje falaram no debate político previsto para esta noite e nos candidatos às eleições para o cargo de primeiro-ministro. Deixaram-me excitado, impaciente, ansioso. Porque aquilo a que estou habituado é a eleger o presidente da junta de freguesia, o presidente da câmara, uns deputados que não conheço e de que nem sei o nome e o presidente da república.

    De forma que este apontamento fica aqui afixado como intervenção única durante o dia de hoje. De resto, entro em estágio como a equipa do Futebol Clube do Porto antes de receber o Sporting de Braga. Para me documentar e para me mentalizar para a vitória. Vou correr à procura da legislação que regula tais eleições e que, de todo, desconheço. Até porque, como se sabe, o desconhecimento da lei nunca aproveita ao infractor. Vou estudá-la, vou preparar-me para assistir ao debate com a mesma concentração que se exige a quem marca a penalidade por cima da barra. Vou tomar apontamentos, vou estar atento, vou ser tão bom aluno como para si reclamava o professor Cavaco.

    No fórum, estúpida e ignorantemente, os intervenientes da inscrição continuam a falar em propostas objectivas. Alguns insistem mesmo em que os jornalismos sejam também eles profissionais, e imponham eles aos tais candidatos a sua vontade e a sua lei. Não permitam que se enredem em respostas vazias e sem sentido, comparando toucinho com velocidade. Não têm nenhum sentido de humor os eleitores portugueses. O que seria deles sem os políticos que os dirigem?

    2 de fevereiro de 2005

    O valente soldado Portas

    Paulo Portas foi hoje à RTP para a entrevista com Judite de Sousa. Dela já bem se sabe o que se pode esperar: pouco. Dele também já bem se sabe o que se consegue: nada. Não foi uma pobreza franciscana porque seria injusto estar a culpar da aridez do confronto a memória de S. Francisco, coitado. Mas, no conjunto, assistiu-se a mais um diálogo entre o burro e a Júlia Pinheiro, com o evidente triunfo daquele, que tem muito mais matreirice acumulada.

    No conjunto Judite de Sousa não foi capaz de fazer uma única pergunta sobre propostas objectivas do CDS. Logicamente não obteve uma só resposta nem lhe foi referida uma proposta objectiva que fosse. Mesmo que isso pudesse parecer impossível, as coisas fortam ainda mais vazias do que ontem, com José Sócrates. O valente soldado Portas levou Judite para o canto do ringue que mais lhe aprouve, encostou-a às cordas, derruboiu-a as vezes que quis e como quis. Valeu à primeira dama da vila de Sintra a contagem de protecção de que se foi encarregando um invisível árbitro. No fim a vitória foi sobre o árbitro, não serve para nada, quem o não conhecer que o compre.

    Quanto à grelha de programas, deu para encher. Não foi nem mais, nem menos cultura do que a que nos ofereceu a quinta. Não esclareceu nada, não esclareceu ninguém, não esclareceu sobre nenhuma coisa. Por mim, quanto a este e quanto à cruz na casinha, fiquei decidido: por aqui não!

    O colinho

    Parece que há dias, em Vila Nova de Famalicão, no meio de um incontável e incontrolável mulherio em êxtase - como aqui, com conhecimento de causa, se refere! - houve manifestações de todos os tipos e para todos os gostos. Houve até mulheres que se terão reclamado do tempo em que, por sistema, o sexo dito fraco gostava de homens. Sem todavia precisar como os preferiam: novos, altos, louros, de meia idade, cabelos compridos ou entradas pronunciadas. Solteiros, casados ou viúvos. Ricos, pobres ou remediados. No meio de tal desvario algumas terão reclamado diferentes preferências e outras, muito provavelmente, se terão transfigurado nos prazeres de um orgasmo inesperado. Sensatamente apenas não terá sido aplaudido o casamento de umas com outras por isso ser, como se alega, contra a ordem natural das coisas, a moral cristã e o conceito tradicional de família defendido pelo ministro do mar.

    No meio do entusiasmo, com muito mais mulheres à volta do que as que cabem na Kapital, também ele em êxtase, o presidente do PSD terá mais ou menos afirmado: "o outro candidato prefere outros colos. Estes colos sabem bem". A expressão, com sabor a interjeição de prazer profano, foi utilizada numa reunião política, embora de mulheres em transe. Se a relermos facilmente nos aperceberemos da sua evidente carga política e do sentido objectivo do seu conteúdo, à semelhança da linguagem vulgar, terra a terra, que a nossa erudita classe política sistematicamente usa para completo esclarecimento do eleitor e para controlo da dívida pública.

    Não sei como houve quem o não tivesse percebido logo e, de seguida, tivessem ruído o Carmo e a Trindade. Além disso, nos dias que velozmente se aproximam da campanha eleitoral prevista na lei, já ninguém liga ao que dizem os políticos, porque nunca os percebeu e porque, sensatamente, prefere o circo no Coliseu, pela quadra natalícia. Felizmente que um atento correligionário do Dr. Lopes veio, pressuroso, esclarecer as dúvidas que, incompreensivelmente, pudessem ter sido levantadas pela observação: os colos referidos eram políticos!

    Claro que isto leva a que o eleitor céptico volte a acreditar. No país, na vitória do Benfica na superliga - o que, pessoalmente, me deixa um sabor amargo: preferia ver campeão o meu velho amigo Jesualdo! -, no controlo do défice orçamental e na execução fiscal dos clubes de futebol por incumprimento de obrigações fiscais. E muda radicalmente o sentido de todas as coisas, enquanto deixa adivinhar um futuro radioso para os militantes da Nova Democracia que já espera, pelo menos, eleger um deputado por círculo. Sendo que, em Lisboa, o Manel valerá por dois pontas de lança, a jogar em cunha, segundo a estratégia científica e experiente preconizada pelo Sr. Gabriel Alves.

    Porque o presidente do PSD quando mencionava o outro candidato se referia, naturalmente, aos Drs. Marques Mendes, Guilherme Silva ou Duarte Lima. Não se acredita que quisesse referir as predilecções dos Drs. Pacheco Pereira ou Rebelo de Sousa que, como se sabe, não são candidatos e que, além disso, são regaços que não são, de momento, flor que se cheire ou colo que se procure. Esta clarificação, embora tardiamente, também a mim me leva ao êxtase. A vontade de participar é tanta que têm, previdentemente, que me segurar. Porque apelo à intervenção política da Alexandra Lencastre, da Kate Moss, da Mariah Carey, da Catarina Furtado a quem, por e-mail, sugiro que o PSD envie propostas formais de militância. E podem enviar-me também uma a mim. Porque com colos políticos daqueles vou correr a inscrever-me. Para os poder desfrutar, de forma empenhadamente ideológica!

    1 de fevereiro de 2005

    Sócrates goes to RTP

    José Sócrates foi hoje à RTP para a entrevista com Judite de Sousa. Dela já bem se sabe o que se pode esperar: pouco. Sócrates apresentou-se com uma mão cheia de nada e outra cheia de coisa nenhuma. Por junto não alinhou uma ideia, não apresentou um projecto, não referiu uma medida. No conjunto salientou a intenção de introduzir 1.000 jovens licenciados "boys and girls" nas pequenas e médias empresas, com um custo de 1 milhão de contos. Para combater o desemprego juvenil e promover a inovação! Mil empregos para um país que tem quase 400.000 desempregados até conquista o voto do Dr. Louçã. Adiantou ainda a intenção de reformar o desgraçado sistema de ensino que segue, moribundo, de convalescença em convalescença, esfaqueado nas costas por tantas e todas tão inúteis reformas: introduzir o ensino do inglês no primeiro ano do ciclo. Ou seja, no quinto ano de escolaridade. O que, como se depreende, conduzirá a resultados visíveis e definitivos dentro de 4 anos. Nada ficou abaixo das minhas expectativas: de facto eu não esperava nada, realmente eu não espero nada!

    Sem ser candidato, mas sentando-se ao lado de um, tinha dito antes coisas objectivas um homem chamado Miguel Cadilhe. Quando condenou os projectos megalómanos, autênticos sorvedouros de dinheiros públicos, com a Expo 98, o Euro 2004, a compra de submarinos. E quando ao menos afirmou que o país se deve autodisciplinar quanto a este aspecto. Ao menos, mesmo em estúdio, Sócrates poderia ter acompanhado o telejornal. Talvez pudesse ter colhido alguma inspiração!

    Divergências

    A Administração Regional de Saúde do Norte indica que nesta região do país há 60.000 pessoas em lista de espera para uma cirurgia. O Ministério da Saúde, que por acaso até tutela os primeiros serviços, diz serem apenas 45.000 pessoas. O resto é um edificante diálogo de surdos que decorre com a elevação da pré-campanha eleitoral, sem ataques pessoais e sem insinuações de nenhuma espécie.

    A ARS diz estar mais actualizada do que o ministério. De onde obviamente decorre que há posições invertidas - sem intenções malévolas para descanso dos candidatos Lopes e Sócrates! - e que deverá ser aquela a assumir a tutela do ministério, colocando o ministro como amanuense num qualquer centro de saúde sa. Por sua vez o ministério afirma que os números não são comparáveis porque se chegou a eles por critérios diferentes: a ARS utilizou uma calculadora de secretária, com vinte anos de idade, enquanto o ministério fez a contagem utilizando seixos das praias da Foz e utilizou o auxílio dos dedos sempre que necessário.

    Numa coisa, pelo menos, não divergem: a lista é grande mas o tempo de espera é hoje muito mais curto do que era em 2002. Parece que os inscritos passaram a ter menor esperança matemática de vida e a finar-se muito mais rapidamente. Antes assim! Por mim, já receava que a redução das listas do resto do país se tivesse conseguido à custa das exportações para norte do rio Douro.