29 de março de 2007

Há gente para tudo

Há dias foi noticiado o facto de forças iranianas terem aprisionado uma patrulha de 15 marinheiros ingleses, alegadamente por esta estar em águas territorias daquela república islâmica. Responderam os súbditos de sua majestade e aios do Sr. Tony Blair que não, que a alegação era falsa porque a sua patrulha se movimentava ainda em águas do canal da Mancha. Ripostaram os iranianos dizendo que não, que os ingleses navegavam já entre dois decímetros a vinte centímetros para lá da linha de pesca que define a fronteira. Mas, mais do que isso, sabe-se que a força aprisionada, num total de 15 elementos, era composta por 14 homens e por uma mulher. E fica por se saber o que fariam tantos homens no meio de uma só mulher, mesmo armada até aos dentes, tanto mais que esta, segundo o rigor das agências noticiosas, é casada e mãe de uma menina com 3 anos de idade.

Ontem, ao que parece, a televisão iraniana mostrou ao mundo o grupo prisioneiro, enquanto este se alimentava substancialmente, com uma ementa dietética, que excluia a carne de porco e as bebidas alcoólicas que, como se sabe, se não podem consumir no Reino Unido em qualquer local e a qualquer hora. A mulher foi já mostrada quando saboreava a bica e fumava o seu cigarro e foi dizendo que estavam todos bem, sem fome, bem tratados, e que apenas tinham sido convidados pelas autoridades iranianas a passar uma semana de férias, à semelhança do que o Sr. George Bush tem feito relativamente a uma série de turistas com poucos recursos que, voluntariamente e por convite, gozam das delícias das Caraíbas nas praias de Guantanamo.

Ao que parece ainda, para que isto se assemelhe em tudo ao jornalismo de investigação, os orgãos de comunicação do Reino Unido propagaram que os iranianos tinham exibido uma mãe inglesa perante as câmaras de televisão, mascarada de marinheira por detrás de um fato militar, usando capacete, máscara, granadas e arma automática como se fosse o Rambo, com uma fotografia da sua filha de 3 anos a pender-lhe de um dos bolsos do camuflado e o poema de Fernando Pessoa a escorrer-lhe da memória. Contrariamente ao que qualquer analfabeto possa pensar - por melhor que os analfabetos pensem, como se sabe! - a excelsa mãe limitava-se a amamentar a filha num ambiente apenas um pouco mais animado do que os verdes campos de golfe dos reinos de sua majestade!

27 de março de 2007

Grandes portugueses

Confesso que não acompanhei o programa televisivo e sobre o assunto estou, naturalmente, mais virgem e intacto que o Dr Pulido Valente e a sua prosa dos fins de semana. Mas, mesmo assim, devo reconhecer que o mesmo teve o excepcional mérito de permitir a convalescença da D. Maria Elisa em pleno estúdio, frente ao desconforto das câmaras e dos projectores, em vez de a obrigar, coitada, a conseguir a nomeação de adida na embaixada em Londres e de se esfalfar diariamente a ver as novidadese e a fazer compras no Harrods para minimizar os efeitos da esquisita doença de que padece.

Para além disso parece que o concurso foi ganho por um qualquer fulano sem importância nenhuma, com pouco de português e nada de grande, nascido numa ignorada aldeia beirã onde nem Cristo passou e muito menos se deteve. Tanto assim que foi liminarmente excluído numa primeira selecção de candidatos, realizada pelos amanuenses que o serviço público e o regime incubiram da tarefa. Primeiro pelas botas, cambadas, fora de mora, de fabrico artesanal e grosseiro, embora capazes dos pontapés mais certeiros e violentos no cu da insolência e da contestação. Depois pela vulgaridade! Não lhe preservava a memória um nome de rio, de aldeia, de rua ou mesmo de travessa, nem que fosse o do Possolo. Muito menos de um museu, de um pavilhão desportivo, de um estádio de futebol ou de alguma coisa que pudesse, sem esforço, relacionar-se com a fama do apito dourado.

O Esteves, como em vida chegou a ser conhecido, teve razão quando defendeu que o povo português era estúpido e não estava preparado para viver em democracia, durante o curto período de mais de 40 anos em que exerceu o cargo de primeiro ministro. Funções que, como se sabe, o licenciado em engenharia civil José Sócrates ocupa há mais de um século e de que o Dr. Soares se viu livre como um passarinho,depois de ter escondido o socialismo no fundo da gaveta, tarefa em que se ocupou nos tempos livres que lhe deixaram as ocupações da praia do Vau, quase desde a idade média, ainda o arquipélago de S. Tomé e Princípe não tinha sido descoberto.

Púdica, reverente e obrigada a televisão de serviço público e o Dr. Almerindo Marques remeteram os resultados do concurso para uma sala esconsa nas águas furtadas do seu sítio na internet. E por simples descuido do contínuo de serviço ou do secretário de estado de plantão, o número de votos não é revelado, indicando-se apenas as respectivas percentagens. O António, que era o nome de baptismo do feliz contemplado com uma viagem às Caraíbas, para si e para os descendentes, ganhou com 41% dos votos, mais do que o Dr. Soares alguma vez teve para regedor da freguesia que o viu nascer. O que, acho, nos leva a concluir que a história se não apaga. Até hoje nenhum bom filho aplaudiu o facto de D. Afonso Henriques ter "batido na mãe". Mas não foi por isso que de imediato solicitou a anexação do país por parte da Espanha. O que até seria sensato e certamente mais proveitoso...

26 de março de 2007

Tratado de Roma

Parece que o Dr. Cavaco dá hoje, algures e à nossa custa, um jantar comemorativo dos 50 anos da assinatura do tratado de Roma. E os noticiários de ontem salientavam o facto do Dr. Soares se não ir sentar à mesa dos convivas, apenas por não ter sido convidado. De forma exemplar e original a própria União Europeia vem celebrando, sem bolos e sem velas de aniversário, o cinquentenário de um cadáver adiado, a ser formalmente devorado por 27 vermes, com mais uma série deles espreitando a sua vez, dos balcãs ao estreito do Bósforo.

A simples perspectiva do Dr. Soares ficar sem jantar constitui mais um drama para o país, sempre atento aos sem abrigo, à sopa que lhes falta nas noites de inverno e ao impacto que uma simples refeição, a expensas próprias, provocaria na economia doméstica do excelso esposo da D. Maria, beneficiário de uma pensão mínima do regime geral. Para dar o exemplo da justiça que apregoa o licenciado em engenharia civil José Sócrates, no desempenho, a tempo parcial e com o salário mínimo, do cargo de primeiro ministro.

O país pode viver com desemprego, tuberculose, vitórias folgadas da selecção nacional de futebol sobre a Bélgica, encerramento de empresas e multas fiscais por entrega do IRS fora de prazo. Definitivamente o país é sensível a todos os dramas importantes, e convive mal com eles. Impacienta-se, excita-se, deprime-se, emociona-se, perde-se num choro convulsivo sempre que a D. Lili Caneças se submete a nova recauchutagem ou que um residente da linha empunha a faca do bife como se fosse um serrote de poda, ignorando toda a erudição dos manuais de etiqueta da D. Paula Bobone.

Desta vez, como aliás das anteriores, eu também não fui convidado para o jantar do Dr. Cavaco. Os estafetas que, empunhando protocolos, correm todo o dia entre Belém e S. Bento também não. O Francisco, sem abrigo que o Dr. Rio ainda não conseguiu reciclar, também não e, à falta do champanhe de Reims, vai-se contentando com a cerveja do tasco ao lado das arcadas onde dorme. Sendo certo que nenhum foi ou é notícia, pelo menos por este motivo. E sendo ainda certo que, pelo menos eu, tenho contribuído para todos esses peditórios... Compulsivamente, é claro!

Empresas Municipais, Unipessoal, Lda

Por mera questão de atavismo ou por razões mais sérias que nem Freud ousaria explicar, nunca consegui compreender os benefícios que as empresas municipais acrescentam à qualidade de vida dos seus munícipes. O erro, obviamente, é meu que, como sempre, deveria estar distraído quando um qualquer governo desta típica democracia do ora agora entras tu, ora agora saio eu, o explicou ao eleitorado com os mais ínfimos detalhes. Como se este, o eleitorado, fosse muito, mas mesmo muito burro. Depois, abstencionista confesso, por pragmatismo e por crença na táctica do tudo a monte e fé em Deus, não devo ter participado no referendo que, sobre o assunto, deve ter sido levado a efeito acima das neves do Kilimanjaro e do tecto celestial a que apenas voam os anjinhos com asas e o major Valentim Loureiro.

Mas sendo compulsivamente utilizador dos serviços públicos que se acomodam em logradouros infectos, em vãos de escada húmidos onde os ratos procriam, em caves escuras e bafientas onde ninguém mija, nunca vi que nada disso pudesse mudar-se por simples postura municipal ou despacho da vereação. A Pide, como sabe quem ainda conserva alguma memória de tempos idos, não alterou propósitos quando passou a chamar-se DGS e manteve a mesma negativa eficácia na prática da tortura. Mais recentemente, no Porto, os SMAS não ganharam maior eficiência com a passagem a empresa municipal e, impunemente e à nossa custa, continuam a desperdiçar uma percentagem assinalável da água que injectam nas condutas, em fugas e mais fugas, rupturas e mais rupturas. A não ser na acumulação de cargos, de vencimentos, de ajudas de custo e de cartões de crédito. Tudo legitimamente e, mais do que isso, tudo insuficiente e ridículo quando comparado com o raio da terra. Especialmente se expresso em milímetros.

Do mesmo modo se não vê que um incompetente vereador, eleito pela vontade masoquista e estúpida de pessoas como eu, possa passar a ser um competente e exemplar administrador, defensor da causa pública e dos dinheiros que lhe não pertencem. Isso viu-se agora num qualquer relatório que o Tribunal de contas emitiu, depois de ter chegado às conclusões que todos podíamos facilmente adivinhar, depois de sempre as termos sabido. Espanta apenas, por surrealista e mentalmente atrasada, a posição assumida por um tal Dr Ruas, de Viseu. Que, acreditando-se em Deus, não se sabe por onde andaria quando Este passou por terras de Viriato a distribuir alguma inteligência aos bípedes da região. Ou será que terá deixado de fora alguns preclaros autarcas, por imerecedores?

24 de março de 2007

Engenheiros…

O governo que patrioticamente conduz os nossos destinos, que nomeia assessores sem concurso público e que hipoteca o futuro dos nossos filhos a pretexto da competitividade, prometeu há dias, à custa de uns quantos milhões e de não sei quantos anos, a felicidade e a escolaridade obrigatória para todos os portugueses. Sem esforço, sem propinas e com certificação. Incluindo a emissão de carta de curso com assinatura e selo branco, por via administrativa, portaria ou ainda por decreto, mesmo que escrito no português que o Dr Lobo Antunes usa nas mensagens de telemóvel que, caridosamente, envia para Lanzarote à atenção do Sr Saramago e que este, com a vista cansada e os óculos em sítio indeterminado, naturalmente nem lê.

Por uma vez, não foi preciso esperar dez anos que a terra girasse estupidamente à volta do sol. Nem tão pouco pelos fundos comunitários que o orçamento do Dr. Barroso solidariamente pusesse à disposição. Os resultados surgiram, mais rápidos do que os golos da equipa do Sporting e do que os culpados do processo da Casa Pia. Num ápice os candidatos a uma licenciatura invocaram verbalmente as habilitações que já possuíam, recitaram a Salvé Rainha, juntaram-lhes uma fotocópia sumida do bilhete de identidade, escolheram ou criaram o curso que mais lhes convinha à vocação, estabeleceram o respectivo plano de estudos, indicaram as equivalências, alteraram as notas, propuseram-se a exame, redigiram os sempre trabalhosos enunciados, resolveram-nos ao serão, preencheram as pautas e deixaram à secretaria o trabalho menor de lançar as notas nos livros de termos.Recomendamdo-lhe apenas que, a enganarem-se, o fizessem sempre por excesso. Porque o país, mesmo ancestral, mesmo pobre, mesmo analfabeto, é e será sempre um país de excessos!

Trataram familiarmente os professores que nunca os conheceram e, sem concurso, fizeram-se eleger deputados, manobraram os cordelinhos e foram secretários de estado, moveram influências e foram promovidos a ministros, mandaram queimar pneus usados à porta das cimenteiras e foram ambientalistas, empunharam uma bandeira e foram sindicalistas, visitaram as obras de um condomínio fechado e foram engenheiros, visitaram o senhor cardeal patriarca e passaram a chefiar o governo por inspiração divina e vontade maioritária da freguesia. E porque a respectiva ordem lhes recusou o uso do título só não puderam intitular-se engenheiros e foram, muito singelamente, licenciados em engenharia! Mas que interessa isso se foram solenemente empossados como salvadores da pátria e são mais predestinados do que o Dr. de Santa Comba, ao que parece habilitado com uma licenciatura autêntica, concluída na vetusta Universidade de Coimbra?

20 de março de 2007

O civismo e a peixeirada

Este fim de semana reconciliou-me, definitivamente, com os Drs. Ribeiro e Castro e Paulo Portas e, ainda, com o CDS-PP, com os partidos políticos, a Assembleia da República, a União Nacional, o Dr Pacheco Pereira e o grande educador da classe operária. E também com a memória do Doutor Salazar e com a intenção meritória de lhe erigir uma estátua, dedicar um museu e consagrar uma adega em terras do Dão.

Está fora da razão e do bom senso quem, como eu, não acredita nos políticos e se dá ao trabalho de digerir a bilis do Dr Pulido Valente e de decifrar a erudição do Sr Luís Delgado. E para que essa reconciliação se estendesse a todo o país eu acho que o CDS-PP deveria reunir com maior frequência o seu Conselho Nacional e proporcionar à comunidade a peixeirada cívica com que nos brindou no passado fim de semana. Fosse em Óbidos e houvesse ou não qualquer festival do chocolate.

Na segunda página da edição de hoje o Dr Ribeiro e Castro aparece numa fotografia, com ar apreensivo, exibindo a frase: "Ao serviço de Portugal." Tivesse ele um cachecol vermelho ao pescoço e a frase poderia ser a mesma ou até: "Será que aviamos o Estrela da Amadora?". Por falta de profundidade de campo não se vê um tal Helder Amaral a empurrar a Dra Maria José, como se ocupassem ambos um autocarro da Carris em hora de ponta. E, por falta de som, não se ouve a convicção racista com que o mesmo Amaral a mimoseia com o epíteto racista de "branca". Nem se ouve o Sr Telmo Correia chamar monhé ao Dr Narana, nem se vê o Dr Nobre Guedes fazer um manguito da sua casa na Serra da Arrábida ao Sr Miguel Anacoreta Correia. Tão pouco se vê a Dra Celeste Cardona a dar com a caçarola na testa do desconhecido Martim qualquer coisa ou o Sr José Paulo de Carvalho a mandar o Sr Luís Queiró abaixo de Braga. E, por deformação tendenciosa da informação, não se vê na fotografia o Dr Paulo Portas atento aos conselhos da mãe e fervorosamente rezando o terço. Pela alma do congresso extraordinário e dos pastorinhos de Fátima!