29 de fevereiro de 2016

Mano Zeca

Zeca, mulato de Benguela, cresceu de tronco nu, chinelo de meter no dedo, correndo atrás da bola nas areias da praia Morena, dando mergulho de chapa para a ir buscar no mar, molhando a carapinha e refrescando o corpo suado. Naquela altura, com aquele tamanho, o que interessava mesmo era o jeito de brinca na areia, a habilidade para a finta, a rapidez do chuto para marcar golo, uma revianga igual à do Mané Garrincha, um salto mortal, uma bassula com o inimigo a voar e a dar com as costas na areia, toda a malta a rir, xingando, logo a seguir a vitória, tudo a bater palmas, o aplauso. De resto, mulato não servia para nada, nem para preto, nem para branco, o cabelo daquela maneira, aquela cor de café com leite, nem precisa apanhar sol para ficar moreno, nem adianta ficar à sombra para ficar branco. Digo eu que sou preto até de mais, por dentro e por fora.

Quando já tinha altura de crescido e ficava desse tamanho mais ou menos, a escola acabava – aprender a ler serve mesmo para quê, se não tem livro? – e adiantava arranjar um trabalho, ganhar alguns angolares, comprar dez cigarros francesinhos, vendidos avulso, arrumar um sapato, uma calça de boca de sino, a banga toda do vinco bem engomado, ia na farra de sábado à noite, olhar as garinas sentadas nas cadeiras delas, o merengue subindo no ar, puxar massemba no meio da sala, aí Benjamim. Depois assim numa noite de março chegou a notícia do tal de terrorismo, por entre as linhas do Intransigente, entrou em casa devagar, devagarinho, atravessando a porta pelo buraco do gato. Que guerra não era palavra conhecida na pátria – nome de barco grande para trazer os brancos do puto! – una e indivisível, do Minho a Timor, sabia lá o que era isso, só conhecia mesmo a Catumbela, as chitacas do Cavaco, os nomes do Cubal e do Bocoio, até que nunca chegara no Huambo.

E nos entretantos da vida, Zeca mulato, o sangue latino da mãe preta fervendo nas veias, cafeco do Cubal vindo para Benguela para arranjar um trabalho e comprar um sapato, passou a servir para alguma coisa e lhe mandaram de comboio mala para o Huambo, para ir na tropa. Entregaram-lhe farda de cáqui amarelo, botas de engraxar, boné de por na cabeça e até cuecas que ficavam em pé sozinhas, como candeeiro da rua. E quiseram-lhe ensinar coisas que não tinha aprendido na escola, fazer contas, escrever carta, usar gravata no pescoço, bater continência, conhecer o comandante mesmo de noite, a dois quilómetros de distância. Aprendeu nada, escola do Zeca era mesmo a praia Morena. Quando fez exame perguntaram-lhe que sólido geométrico é esse e adiantou logo dizer que era uma medida de litro, mesmo com o kamba do lado a lhe ajudar baixinho que era um copo de beber água e vinho. Depois veio um sargento qualquer, já meio seculo de ter estudado muito, a dizer que era um cilindro. Que não parecia nem com nada, nem com esse de pisar o alcatrão que pintava de preto a avenida da granja, até no mercado, mas se ele disse que era, é porque era mesmo.

Chumbou, nada de mais, era até onde sempre tinha aprendido, nunca mais do que isso. Não ficou nem cabo, só mesmo soldado raso, fardado de cáqui amarelo, boné na cabeça, bota a brilhar até de noite, procurando a rebita nas noites de sábado, ouvindo merengue, as ancas das garinas rodando à sua frente, trocando-lhe os olhos, a compostura do militar que tinha de ser, a cabeça para cima, o boné em cima da carapinha. Ganhou coragem, foi até às cadeiras como se fosse falar com o sargento de dia, escolheu aquela que era a mais bonita, adiantou a pergunta, o coração a bater-lhe no peito: a menina dança? A resposta veio de repente, como se o mandasse de castigo todo o fim de semana: não, obrigado, já tem gajo!

Toda a noite Zeca não disse nem mais uma palavra em português, mas repetiu tudo o que sabia de asneira em umbundu aprendido na rua, escola da praia Morena. Nem interessa repetir aqui, ninguém ia mesmo perceber o que era isso de tupariowe e todas as outras!


26 de fevereiro de 2016

O Aires Aldrabão

A Canata, escrito assim mesmo, com maiúscula, como nome de lugar, era um pequeno quimbo, mais ou menos a meio da picada de terra, com piso irregular e esburacado, que descia para o rio. O rio era um pequeno fio de água, correndo no fundo do ligeiro vale, contornando a base da encosta que se estendia na outra margem, num declive suave que teria menos de um quilómetro. A Canata, como povoado, era já uma coisa híbrida, termo desconhecido no vocabulário do lugar, uma mistura entre um dialecto e uma língua que tem dicionário e usa gramática. De facto as cubatas de adobe ou de pau a pique, cobertas de capim, iam coabitando com casas modestas, de paredes caiadas, construídas em tijolo ou mesmo ainda de adobe, mas cobertas a telha. Telha marselha, assente numa estrutura de madeira, onde se cruzavam ripas, traves e barrotes, escoando a água das chuvas frequentes. Que depois, a céu aberto, corriam para o rio e aumentavam a irregularidade do piso e a profundidade dos buracos.

O senhor Aires, cujo nome era sempre e naturalmente associado ao apelido de Aldrabão com que o quimbo o crismara, era um homem branco, de idade indefinida, seco de carnes, quase de todo carcomido pela tuberculose e pelo cigarro sem filtro – francesinhos, comprados em pacotes de quinhentas unidades – sempre pendente ao canto da boca, falasse, comesse ou estivesse apenas atiçando a fogueira que lhe esturricava os pulmões. Com o tempo seco quedava-se sentado à soleira da porta, silencioso, aspirando o cigarro e deixando libertar o fumo lentamente, como se Deus, omnipotente, o tivesse presenteado com uma chaminé no alto da cabeça. Enquanto seguia, com os olhos encovados e sem brilho, as nuvens de poeira que o vento espalhava pela picada e a liberdade do voo dos pássaros a procurar poiso nas hastes altas do capim.

E o apelido, Aldrabão, palavra que sugere uma origem bérbere, descrente e infiel, de onde surgira, quem o inventara, como lhe fora acrescentado à identidade? Para além do quimbo e da picada, todo o bairro o conhecia, pelo menos uma vez lhe passara à porta, ouvira falar dele e não sabia de quando no tempo lhe viera o nome e a muitos quase ficava a certeza de que lhe viera do berço. Mas a verdade é que o apelido não seria alheio à facilidade com que o senhor Aires inventava histórias mirabolantes e as contava, com a serena convicção que o catarro e os pulmões doentes lhe permitiam, com voz pausada, muitas vezes quase imperceptível, o olhar magoado e triste, a vida sem nenhuma matemática e com muito pouca e curta esperança. Não durou muito, e por uma tarde de um qualquer dia de trabalho, veio buscá-lo, para o levar a enterrar em campa rasa, encerrado num sobretudo de girassonde, uma furgoneta incaracterística, pintada de preto, com um padre piedosamente sentado ao lado do condutor. O apelido, e as histórias, ficaram para a posteridade e os miúdos ainda hoje as contam, mais mirabolantes do que nunca, enquanto riem alto e a picada continua descendo para o rio, transbordando da água vermelha das chuvadas.


24 de fevereiro de 2016

Acordei esta manhã às nove horas

Acordei esta manhã às nove horas, como se fosse inverno e chovesse, e chovia. Toda a noite um suor frio a transbordar-me do corpo, um sono profundo a afastar-me do sonho, como se a vida se elevasse no horizonte e não houvesse nevoeiro. Mas na penumbra com que o dia se anunciou, com a humidade a escorrer pelas paredes do quarto, de que ainda resta alguma memória branca da cal, o relógio estava parado à cabeceira da cama, cansado de tudo. Os ponteiros imóveis sobre o tapete, como se já não houvesse tempo para andar e eles, definitivamente, tivessem desistido de dar ordem à vida das pessoas e levar alimento à boca das crianças, sem horas nem minutos.

Levantei-me sem que ouvisse nenhuma música e sem que o calor morno da tua respiração me levasse o perfume ao fundo das narinas. Estava vazio de tudo o copo onde diariamente deixo alguma água com que possa matar a sede. Que já vem de domingo e que me dá, apesar de tudo, alguma razão para pensar nos dias qua ainda faltam para acabar a semana, sem ter como os medir. Não consegui, ainda assim, pedir-te que me estendesses a mão que me não dás, se o não fizer. E por isso a mantiveste imóvel e silenciosa, agasalhada sob um sorriso lento que te pende do olhar, sem te chegar à garganta onde sufocas o grito que não chega a nenhum lugar. Mesmo assim me apetece fazer-te perguntas ternas, como se fosse tempo de sementeiras, os dias futuros aguardando pelo verde das searas, e eu pudesse esperar por respostas trazendo à eira a fartura das colheitas, algures quando chega setembro.


18 de fevereiro de 2016

A noite passada num desassossego

A noite passada num desassossego inquieto, como se fosse um livro, a tua respiração serena repousando no meu ombro, duas verdes colinas de áfrica adormecidas no teu peito, um oceano inteiro nascendo-te nos pés, uma margarida singela a adornar-te a certeza dos passos. Depois, o sobressalto da madrugada, quando a chuva intensa se precipita sob a luz dos candeeiros e a explosão fulminante dos trovões e o ar assustado dos teus olhos se aconchega à protecção morna do meu corpo. E aí fica, sentindo a segurança que não deixa os presos evadirem-se das cadeias nem os barcos soltarem-se das amarras. Lentamente, o dia amanhece nos teus dedos e a alvorada chega sob o som magoado de um trompete, como se Louis Armstrong tivesse voltado só para nós.


Depois é a luz tímida de um sol de inverno, frio e dócil, que me traz a voz com que me despertas, macia como veludo, chegando-me num sussurro como se tivesse já percorrido a longa distância a que ficam as galáxias. Acompanha-te um riso matinal fresco e solto, igual ao chilreio dos pássaros que esvoaçam irrequietos na manhã, ao sabor da brisa que agita os canaviais à beira dos ribeiros e os dias de março que já sabem ao vermelho das papoilas. Ao mesmo tempo que os caracóis desfeitos dos teus cabelos soltos me caiem sobre o rosto e a tua boca túmida me deposita a ternura espontânea de um beijo sobre os lábios ansiosos.

16 de fevereiro de 2016

A nostalgia é como um rio

A nostalgia é como um rio que desperta no cimo da montanha, tímido e cristalino fio de água, espreguiçando-se ao ritmo lento a que o dia vai clareando, o sol ainda baixo espreitando por entre as fragas, esfregando os olhos com a mesma indolência com que a ramela da noite lhe foi colando as pálpebras. Adquirindo a rebeldia ingénua da criança descalça, que desce aos saltos o alegre declive das pedras da encosta, acomodando-se ao leito, ganhando corpo, púbere e ansioso por chegar depressa à planície e sentir o aconchego do manto verde das margens que lhe acariciam o corpo, como bálsamo que o acalma e o fortalece.


Depois, alagando o leito já plano onde crescem arrozais e ainda juncos, a nostalgia vira tristeza, não há mais lugar para os penhascos que de há muito ficaram para trás. O rio é grande e solitário, de águas muitas e cor barrenta, sem pessoas e sem barcos, galgando diques, enchendo casas, ameaçando vidas e arrastando coisas e animais. Nada lhe resiste e muito pouco o enfrenta, irado ruge quando passa, atemoriza, espraia-se mais quando é seu todo o horizonte, aproxima-se da foz para o combate final com o oceano que o espera, a espuma branca na crista das ondas que apagam a luz alta dos faróis. E perde, e aí morre e aí não é mais do que um fio de sangue sujo que vai esmorecendo pelo mar dentro, sem glória, até desaparecer.

14 de fevereiro de 2016

Chamissassa

Penso e saboreio a palavra dentro de mim, como se me nascesse no coração e a partir dele se me espalhasse pelo corpo, em golfadas, ao ritmo a que este ainda bate, algumas cinquenta pulsações por minuto, sem pausas nem arritmias. É como se fosse um parto tranquilo, sem dor nem choro, um calor morno que me conforta o frio nocturno, me aquece os pés, me serve de tapete e de agasalho. Uma melodia que me chega aos ouvidos, de dentro para fora, num compasso lento que ainda estendo pelo tempo, para que nenhuma nota falhe, nenhum acorde se perca, nunca mais acabe.


Repito a palavra vezes seguidas como se uma dúzia delas chegasse para lhe retirar todo o conteúdo e a privasse de sentido. E, pelo contrário, há uma sombra que se estende pelo centro da aldeia, a proteger-nos de um sol bravio, como uma mulemba gigante que ali tivesse surgido de repente, vinda de lado nenhum, coisa de feitiço africano, que abrigasse pássaros mudos, porque é da palavra o exclusivo de tudo. Prolongo-lhe a última sílaba, deixo que se me enrole na boca, me inunde o palato, me leve a felicidade às narinas. Acaricio-a, como se a pudesse fechar carinhosamente na palma da mão, sentir-lhe a suavidade do pelo curto de um coelhinho, prestes a abrir os olhos para a frescura da erva.

E digo chamissassa como se isso fosse mágico, com a suavidade com que se diz ternura, um carinho verde brilhando-me nos olhos, uma palavra que é apenas nome de aldeia e que me basta para dizer tudo na vida. Uma palavra que me preenche por completo, tão solidária como colmeia, tão diligente como abelha, tão doce como todo o mel que me transborda da imaginação, tão infinita como amor. E que não vejo escrita em nenhum dicionário.

12 de fevereiro de 2016

Quando os braços se te abriram para o abraço

Quando os braços se te abriram para o abraço, houve duas estrelas polares que nasceram nos teus olhos. Viradas a norte, cintilando no escuro como se fosse noite em todas as longitudes e só eu precisasse de destino. Desapareceu a necessidade de todas as palavras, de repente inúteis, e só a tua boca se me ofereceu, quente e húmida, para o beijo e para a sede de que são feitos os meus passos. A concha e o bastão amparando-me no caminho longo para santiago, rosas e espinhos rebentando à minha passagem, perfumando os ninhos e a vida que se adivinham nos silvedos.


É tão próximo o calor com que respiras, o peito erecto como bússola seguindo o rumo da espuma das ondas e da água dos rios que se entrega aos oceanos, sedenta da ternura com que enches as mãos onde te nasce a primavera. Muito depressa a noite se faz verão e o trigo se polvilha de flores silvestres e balança ao sabor da brisa, enquanto se faz espiga e o pão amadurece no rosado do teu rosto e nas promessas do sorriso com que me acenas para lá do sonho. Vai amanhecendo para além da madrugada que recolhe as estrelas dos teus olhos e, com o sol nascendo, és já constelação!

11 de fevereiro de 2016

É mais belo aquilo que também é mais simples.

É mais belo aquilo que também é mais simples. Os minúsculos pontos alinhados, aconchegando-se uns aos outros, desenhando uma linha recta, sem começo e sem fim, passando singelamente por todos os lugares, pertencendo-nos a todos como coisa comum, em todos os momentos e de todos os modos que lhe pertencermos. A ousadia de um bocado que lhe roubamos e que guardamos como sendo nossa, um segmento como característica de identidade geométrica, pendendo-nos da algibeira, a ponta de um lenço branco mostrando-se, cada um de nós o eterno menino de sua mãe, sem Pessoa que nos escreva ou Villaret que nos diga, a poesia agreste de Torga tombando dos penhascos transmontanos pelas encostas graníticas do Douro, São Martinho de Anta, uma morada, uma casa de família, uma memória para sempre. Largo da Portagem, um consultório, uma bata branca, um estetoscópio pendurado ao pescoço, uma mezinha para o catarro.


Coisas simples, uma antiga casa de pedra numa aldeia do interior a que se chega por carreiros, - eu, com Drave ainda por descobrir! -  uma lareira, uma mão cheia de caruma, algumas cavacas de pinho seco, para a fogueira, uma panela de três pés para a sopa, um banco para o repouso, a escola e a igreja no pequeno largo, a terra para o sustento, a missa de domingo. Um sorriso envergonhado no teu rosto, dois olhos brilhantes, inquietos e curiosos, imaginando que caminhos deixam o tempo para trás e conduzem ao altar, mulher e mãe, um colo abençoado, o mundo inteiro no teu regaço. O sono solto, sonhos breves e suaves, histórias de princesas, sapatinhos de cristal, a cama por fazer, o caldo para preparar, a roupa que não seca. A chuva certa e persistente de uma manhã de inverno, sem vento, a primavera a adivinhar-se para lá do pinhal onde se abriga a casa, dois pardais saltitando na eira, a sinfonia do namoro, o ninho que se há-de construir, uma migalha que é um banquete, um campo de papoilas singelas enchendo a paisagem. Explodindo de vermelho!

7 de fevereiro de 2016

Desenhar-te o nome como se fosse uma flor

Desenhar-te o nome lentamente, como se fosse uma flor que se abrisse à madrugada, letra a letra, traço a traço, a mão firme, o risco suave e doce como um fio de mel correndo-te dos lábios. Prolongar cada letra e acentuar-lhe cada pormenor, como se fosse um sussurro permanente que se me alongasse para além da voz e se reflectisse no brilho gaiato do olhar com que sorris aos raios de luz que parecem chegar dos restos perdidos do paraíso. Uma praia do oceano índico, o nome escrito assim mesmo, sem maiúsculas que dessem qualquer dimensão às ondas que se nos entregam sob os pés nus, marcando o perfil na areia molhada, um friso de palmeiras virado a oriente. O oriente da China e de Pessoa, onde nasce o sol, vermelha e branca, as cores da vida de Drummond de Andrade.

Aspirar-te o perfume, suave e fresco, que me enchesse os pulmões e me chegasse ao coração, como se fosse o oxigénio vital e rarefeito dos cumes dos Himalaias, e ali me ficasse para sempre, como se a vida fossem apenas rectas paralelas que se encontram para lá do infinito que não somos. Desfolhar-te pétala a pétala, como se todas fossem muitas, todos os sentidos na ponta dos meus dedos, que amor não me engana com a sua brandura. Eu sei Zeca, eu sei que é tua a frase e o sentimento com que a sinto a entrar-me nos ouvidos, a pele a arrepiar-se-me quando as cordas tensas de uma viola tingem de ternura a tarde de domingo. E é por isso que o digo!


6 de fevereiro de 2016

Quando amanhece sábado

Quando amanhece sábado e o mar azul se espreguiça em espuma branca pelo areal, há um sol receoso e triste que se atreve a espreitar por entre o amarelo das mimosas que florescem no emaranhado indomável e solto dos teus cabelos. Como se tudo fosse verde e a primavera se anunciasse, acompanhando o olhar que alongas pela manhã que cresce como o tempo, na ponta dos ponteiros de um relógio mecânico suspenso do branco das paredes e do brilho cintilante dos olhares felizes.


É a hora do encontro que marcámos, sem tarde e sem poente que levem a luz do dia para lá das nuvens. Os barcos ao largo, os marinheiros agitando lenços brancos nas amuradas, os cais desertos como se chovesse e o único agasalho fosse a humidade escorrendo da erosão da pedra. Estendo-te a mão, como se um rosa pálido te saísse dos segredos que guardas bem no meio dos teus seios. De mãos dadas são nossas todas as distâncias e todas as palavras com que o amor nasce nas margens dos ribeiros e o voo dos pássaros sulca o firmamento.