4 de março de 2016

Pensar o amor como um planeta líquido

Pensar o amor como um planeta líquido, de águas quentes, que me brota do coração, pelas aurículas, batendo à cadência de um compasso musical, só oxigénio e vida, fazendo de mim o centro de tudo, com tudo sendo muito mais do que isso e ainda mais. Uma sensação redonda, concêntrica, esférica, que se expande em todas as direcções, sem direcção nenhuma, sem nenhuma forma e de forma explosiva, como a que algum dia terá criado o universo, se é que ele foi mesmo criado ou se pelo menos há ideia da sua existência. E que vai muito para além do que a crença que nos leva ao conceito de Deus, omnipresente e omnisciente e ao que até não couber na fé, e a ser peregrinos sem destino e sem caminho e sem fim, no mundo pequenino que guardas na palma frágil da tua mão fechada.

Amor é fechar os olhos como se os tivesse abertos, e repetir a palavra vezes sem conta, até que não seja mais do que um som sem sentido nenhum e, ao mesmo tempo a soma de todos os sentidos, todos os sítios, todas as épocas, tudo aquilo que fica para além das fronteiras que conhecemos, das cores que sabemos, do que não conseguimos sentir, e que sentimos. Todas as cores e todas as sensações, a começar pelas que simplesmente ignoramos, todos os estados físicos, sólido, líquido, gasoso, a passar constantemente de um para o outro, sendo todos esses e mais aqueles que ocupam os estudos de todas as ciências, exactas e não exactas, e a sublimação.

Amor é a tua silhueta num parágrafo, sem frases e sem linhas, todo o teu corpo só de promessas, no tamanho exacto de um período, uma infinidade de ideias e um universo de ternura, na simplicidade de uma só palavra que precisa de todo o espaço do horizonte para ser escrita, e que aí não cabe. Como se o sol derretesse todo o gelo de que são feitas as constelações e as estrelas do cruzeiro do sul, e ainda as que não são de constelação nenhuma. O sul inteiro, longínquo, distante e próximo, vermelho e branco, de norte a oriente, a estender-se para além de tudo, sem linhas e sem rotas, palpitando no calor morno do teu peito, os lábios submersos na cor macia da ansiedade com que esperas por um beijo.



3 de março de 2016

Fez ontem 23 anos que te matei

Fez ontem 23 anos que te matei. Logo ao início da manhã, sem premeditação, de forma espontânea, de um golpe único e fatal, que te deixou meio esquartejado, amputado de um bocado importante de ti, sendo como a lagartixa, “lagartixa para além do rabo, remexidamente”.


Ontem até a efeméride me passou em claro, sem ter ido levar-te à última morada um ramo de rosas, ecologicamente verde, dos espinhos dos caules às pétalas perfumadas da corola. Mas faço-o hoje, e curvo-me respeitosamente pela morte que te desejo, para sempre. Ao incentivo que levo a todos para que cada um te assassine e leve também à morte quem te fabrica, quem te empacota e quem te vende em maços de 20 unidades ou em pacotes de 50 gramas. Mesmo que com isso se prejudique o orçamento do estado e os accionistas das tabaqueiras.