O sistema, o monstro e a crise

Mas ninguém sabe ou diz o que é o sistema, embora a semana passada se tenha ficado a saber que é mais demolidor do que um batalhão de Bin Ladens à solta. A ganância, de facto, de há muito ocupou o lugar da inteligência e do bom senso. A coberto de um neoliberalismo e de uma globalização que também se não sabe o que são. Na sociedade dos nossos dias vale tudo, até mesmo tirar olhos. E se nos apoquentarem algumas dúvidas, mesmo daquelas que o Dr Cavaco antigamente não tinha, atentemos no desempenho dos nossos governos e no do licenciado Sócrates em particular.
O progresso promove-se suprimindo benefícios, eliminando funcionários, vilipendiando professores e encerrando escolas. E promove-se mais rapidamente se de repente se desenterrar um navegador e se der o seu nome a uma maquineta montada no concelho de Matosinhos - porque ninguém sabe onde fica a freguesia de Perafita - a partir de componentes importados da República Popular da China. De cujo sistema financeiro, pasme-se, ninguém fala, mesmo quando se condecora o senhor Stanley Ho a quem o país residente na linha fica a dever a implantação dos jogos do poquer e da bisca lambida que tanto têm contribuído para o desenvolvimento do país e para a produção de batata doce.
Mas o sistema financeiro é uma qualquer coisa que se apoia numa rede infindável de instituições, muitas delas fictícias e outras tantas virtuais como se diz agora, cuja actividade principal é a usura, legitimada por um alvará convenientemente encaixilhado e pendurado numa parede revestida a madeiras exóticas. E a par da usura veio a ganância, a desonestidade, a intenção da ditadura económica. Ou será característica do sistema conceder empréstimos cujas prestações se sabe que não cabem no rendimento líquido dos beneficiários? E depois vir o governador do Banco de Portugal, com o seu ar clerical, recomendar moderação às famílias no seu recurso ao crédito e no seu nível de endividamento?
O sistema acabou por gerar um monstro que contabiliza lucros como nunca e que vive de bolso vazio. Um monstro de muitas patas e sem nenhuma boa cabeça ou, ao menos, sofrível. E o monstro pariu a crise. Para justificar os despedimentos e o desemprego. Para congelar salários e pensões, para reduzir ainda mais o apoio na doença e qualificar pessoas por via administrativa. Licenciando-as ao domingo, depois da missa!