25 de Abril – 51 anos
Ainda por Abril águas mil amanheceu o dia inicial inteiro e limpo, fresco e descoberto. E os dias que se seguiram foram fartos rios que correram para o centro do mundo, desaguando na euforia e na esperança da multidão. Os cravos vermelhos floriram por todo o lado, de forma expontânea, espalhando um perfume novo e inebriante. Mas o sonho é efémero, quase sempre se esfuma pela madrugada, quando os galos cantam e se anuncia a alvorada próxima.
Rapidamente os cravos foram murchando e perdendo o cheiro. Por falta de atenção e de rega, por carência do indispensável desvelo coletivo. A esperança vacilou, uma ruga apreensiva sulcou lentamente as faces mais tisnadas pela dureza dos anos. A alegria foi-se esfumando, os preços subiram, a carestia de vida aumentou, foram-se formando nuvens escuras no horizonte, a borrasca perfilou-se como expetativa possível que se aproximava.
Os filhos foram envelhecendo
em casa dos pais, por incapacidade de comprar ou de alugar uma casa. Pela falta
de emprego ou pelo emprego precário e pouco. Um apregoado liberalismo foi-se
instalando como uma praga, como a oitava maravilha do mundo. Concentrando cada
vez mais riqueza e distribuindo-a cada vez menos, exigindo que se produza cada
vez mais rapidamente. A pobreza foi-se alargando, a fome cresceu por todos os
lados, os sem abrigo multiplicaram-se pelos frios portais das cidades. Sempre ignorados
pelo poder, sem uma palavra nos discursos, sem uma pequena verba no orçamento.
Passados 51 anos, Abril está por cumprir. É preciso que se cumpra, vai sendo
tempo que se cumpra. É esse o nosso desiderato coletivo.