Para a política serve tudo
Esta manhã, no Porto, a pé, Rua da Escola Normal abaixo, Rua da Escola Normal acima, matutando com os meus botões. Pensando bem não há profissão menos exigente, em todos os sentidos, do que a política. Todas as qualificações se enquadram no perfil, todo o bicho careta serve! Como diziam os velhos da minha freguesia, na primeira metade do século passado, fulano de tal não prestava para o trabalho, não sabia fazer nada, tinha ido para Lisboa, andava pela política. Entretanto pouco ou nada mudou - e nada para melhor! - a não ser que Eça morreu e se lhe perdeu a pena ágil e a ironia feroz.Se bem atentarem nisso um serralheiro serve para deputado mas um deputado não serve para serralheiro. Um advogado serve para deputado às assembleias municipais, vereador, presidente de câmara, deputado, secretário de estado, ministro e até presidente da república como Jorge Sampaio. O distinto José Guilherme Aguiar serviu até para director dos futebóis de Valentim Loureiro - um militar que também serve para tudo, incluindo a política - e para presidente de junta de freguesia. A esta faculdade o código do trabalho de que Bagão Félix é pai extremoso chama polivalência. O cidadão comum e bronco chama-lhe, em português escorreito, vigarice.
Entre os 230 deputados à Assembleia da República que, segundo eles e as leis que eles fizeram, nos representam, há quase de tudo. O Partido Comunista, despudoradamente, chega ao ponto de ter um afinador de máquinas que para além de deputado é secretário-geral, um trabalhador agrícola e, inevitavelmente, uma fila indiana de licenciados em direito. O Partido Popular, que já deu pelo nome de CDS, tem licenciados em direito que vão de Álvaro de Castello com dois eles tracinho Branco, que acumula com um João Semana de meio curso, a Teresa Caeiro que já foi chefe de gabinete, governadora civil, secretária de estado descartada à última hora e secretária de estado a tempo inteiro, com chefe de gabinete, contínuo e motorista fardado sem horas de saída.
Nos pequenotes, na chamada esquerda caviar - ou que aviar? - há filólogos, sociólogos, historiadores, economistas, cursos gerais e complementares dos liceus e do comércio, complementares dos liceus e licenciaturas em direito. Nos grandes, naqueles que entre si garantem a alternância democrática ou o exercício bipartido da ditadura por períodos de quatro anos, há engenheiros, licenciados em direito, desistentes do ensino superior, licenciados em relações internacionais habilitados com o 12º ano que são também docentes universitários, licenciados em marketing, em farmácia, diplomados com o magistério primário, licenciados em ciências da comunicação.
Claramente que um deputado não sabe nem afinar máquinas nem sachar batatas. Do mesmo modo que não está habilitado a defender o Bibi nos processos de pedofilia de que é acusado nem a leccionar filologia, história ou sociologia. Não está também apto a relatar os episódios da voltinha a Portugal como o meu amigo Ribeiro Cristóvão - parabéns pelo sucesso no exame António! - nem a dar aulas no ensino superior como António José Seguro. Mas qualquer cavador serve para a política, dependendo da enxada. Ah, e do padrinho!

A sanção aplicada a Amadou Congo Ouedraogo (Alcino Cruz, em português) por conduzir numa auto-estrada a 224 quilómetros por hora em 2002 prescreveu devido à lentidão da justiça. Por esta violação do Código da Estrada, Amadou Congo Ouedraogo (Alcino Cruz, em português) nunca teve que pagar qualquer multa ou cumprir a pena aplicada. O caso remonta a Setembro de 2002, quando Amadou Congo Ouedraogo (Alcino Cruz, em português) foi apanhado a conduzir na A6 Bobo-Dioulasso-Kaya, (Lisboa-Elvas em português) a 224 km/h, o que é uma contra-ordenação muito grave (expressão sem equivalente em português). Três meses depois da infracção, foi-lhe aplicada uma multa de 360 euros e inibição de conduzir por 60 dias. Amadou Congo Ouedraogo (Alcino Cruz, em português) recorreu imediatamente da decisão para o tribunal de Koudougou (Elvas em português). Só oito meses depois - em Setembro de 2003 - este tribunal de primeira instância rejeita o recurso. Amadou Congo Ouedraogo (Alcino Cruz, em português) recorre para o Tribunal da Relação de Tenkodogo (Évora em português). A decisão da Relação chega mais de um ano depois, em Novembro de 2004: "Dado que já decorreram mais de dois anos desde a data da consumação da contra-ordenação, 20 de Setembro de 2002, o procedimento contra-ordenacional está extinto por prescrição." (expressão sem correspondente em português) O processo foi várias vezes noticiado pela comunicação social (vulgo, Luís Delgado em português). Apesar de ser presidente da Associação Portuguesa das Escolas de Condução, (Estabelecimento Prisional do Vale de Judeus, em português). Amadou Congo Ouedraogo (Alcino Cruz, em português) assumiu o excesso de velocidade praticado, mas alega que o seu carro topo de gama (modelo não comercializado em Portugal) oferece segurança e que na altura não havia quase ninguém a circular na via. Num dos recursos que interpôs, Amadou Congo Ouedraogo (Alcino Cruz, em português) considerou mesmo que o comportamento perigoso foi praticado pela polícia (espécie extinta em Portugal desde meados do século XX), quando o mandou parar na auto-estrada para o interceptar.
Só esta manhã, ao ouvir Dias da Cunha, presidente em exercício do Sporting - instituição sem dívidas ao fisco! -, proprietário de quatro avantajadas mansões, de oito acanhados andares do tipo duplex, de doze automóveis de alta cilindrada e de quatro ex-mulheres com direito a pensão de alimentos, percebi porque razões a Udinese impediu a equipa verde e branca de chegar à badalada Liga dos Campeões.
Três patrícios do Astérix, devoradores de javalis, terror dos romanos e bombeiros de profissão, meteram-se em boa. Tomaram a parte pelo todo e pensaram que em Coimbra, ontem, alguém decidira sobre qualquer tipo de solidariedade a prestar às diversas vítimas dos incêndios.
Portugal abandona o euro e adopta a palavra de solidariedade como moeda, depois de uma reunião em Coimbra, entre o primeiro-ministro e o governador civil que, na oposição, o partido do governo dizia não servir para nada, como de facto não serve. A decisão é surpreendente, mesmo neste país em que nada surpreende e onde, para além dos tempos e das vontades, e das moscas, nada mais muda.
A designação que claramente diz do que se trata, mesmo se se tiver reprovado à disciplina de língua portuguesa do 9º. ano, é Campeonato nacional de futebol da I divisão.
Portugal é, para o bem e para o mal como nos casamentos, um país suspenso. Suspenso do tecto como os candeeiros, suspenso da corda como os enforcados de Nuremberga. Nasceu assim, suspenso das intrigas e desavenças de D. Afonso Henriques com a sua excelsa mãe D. Teresa e suspenso ainda do respectivo desfecho, do reconhecimento da independência e da conquista da cidade de Lisboa aos mouros. Que, segundo um autarca da margem sul do Douro, é tarefa que por elitismo sulista e liberal, se mantém também ainda parcialmente suspensa.
Um russo qualquer, de nome esquisito e 23 anos de idade, acaba de ganhar a Voltinha a Portugal em bicicleta. Uma prova curta, disputada em meia dúzia de etapas de pequena extensão, com um dia de descanso pelo meio, organizada pelo senhor João Lagos. Que também organiza torneios de ténis para jovens avós, partidas de rallies para os países da África central, provas de motonáutica, concursos de fados para amadores e provas de vinhos para bebedores de águas minerais. Diz ele, que sabe, que a prova dura poucos dias e em cada um deles se pedala pouco para reduzir as probabilidades de dopping. Coisa que aparece todos os dias nas longas etapas da Volta à França e na extensão de cada etapa que quase chega do Porto a Lisboa.
Ontem de manhã Fátima era um caudal de gente. Escorrendo, lento e viscoso, por todas as ruas sob uma canícula de mais de trinta graus, pouco depois das dez horas. Todos os peregrinos de misturavam no estranho folclore do regresso para férias, todas as religiões procuravam o mesmo refúgio à sombra das árvores que ladeiam o recinto. Tudo se vendia e tudo se comprava.
A banhos algures numa praia do sotavento, o ministro Mário Lino, entre um mergulho na maré baixa e uma exposição solar besuntado com bronzeador, parece ter afirmado que nenhum projecto teve a extensão e a profundidade da discussão pública do chamado aeroporto da Ota. Coisa de que, não sendo Mário Lino nem socialista nem ministro, o Zé povinho se não apercebeu. Mas, com o devido respeito pelo que restará das ossadas de José Estaline e pelas remotas recordações do sarrafo que usava o homónimo defesa direito do Sporting, Mário Lino trouxe ao velho partido do jovem Mário Soares uma evidente mais valia. A que decorre do exercício da democracia pela interposta prática da ditadura, uma tendência a que não consegue fugir nenhum político profissional que se preze, por mais liberal ou renovador que se diga.
