Linguarejar
De há tempos a esta parte que durmo tranquilo e que deixei de me preocupar com os riscos que, pensava eu, corria a língua portuguesa. Tal aconteceu pelo efeito soporífero dos eruditos, profissionais encartados, possuidores de alvará, com colunas nos jornais, aparições celestiais nos telejornais e até mesmo com blogues com porta para o globalizado mundo virtual. A tranquilidade acentuou-se quando um dos meus descendentes em linha recta, não me recordo já com que grau de parentesco, me apareceu em casa com um ditado de três parágrafos, reproduzindo na perfeição os diálogos da Dra. Júlia Pinheiro com o seu interlocutor Professor Pavaroti de Jumento. Do cacarejar ao zurro tinha sido tudo fielmente reproduzido, senti que estava assegurada a continuidade da língua e a independência da Pátria. Admiti até que o Sr. José Saramago pudesse regressar ao país, desde que este fosse previamente desinfectado de Sousas Laras e que, a fixar residência na Zambujeira do Mar, pudesse haver chicas a passear-se na praia durante todo o ano a fim de lhe estimular a inspiração. As jovens e os jovens repórteres que as televisões usam para os seus exteriores consolidaram-me o convencimento. Não me ficaram nem dúvidas nem receios. Apenas dois exemplos, que mais me não ocorrem de momento, o ilustram com toda a força da Guernica.
Exemplo A: A jovem repórter, destacada para uma reunião de pessoas importantes, é inquirida sobre o número de pessoas que já tinha chegado. Lesta, responde: já chegaram cerca de oito pessoas. Fico de imediato com a visão rigorosa da cena, teriam chegado entre 7,5 e 7,9 pessoas. A oitava teria meio corpo dentro da porta ou, sendo mulher e dependendo da medida, teria também já avançado com o par de mamas. O rigor da linguagem é muito bonito, não deve ser menosprezado.
Exemplo B: Esta manhã, na TSF, uma rádio de referência que incorre no erro de ainda não ter recrutado o Sr. Luís Delgado para o seu quadro de colaboradores e que, por isso mesmo, sintonizo menos. Uma jovem noticia o incêndio numa discoteca algures em Buenos Aires onde estariam algumas seis mil pessoas. E adianta que, segundo números oficiais, há 179 mortos praticamente. Fico certo, ciente e sabedor. Mas tenho pena daquelas 179 pessoas, todas praticamente mortas, quase no último estertor. Se Deus fosse de facto misericordioso pouparia ao menos umas quantas. Assim é mais que certo que à hora do noticiário seguinte estariam todas de facto mortas.
Por obrigações pessoais que não sou eu a estabelecer, não ouvi o noticiário seguinte. Mas, mesmo agora, estou atento. A ver se ouço repetir a notícia e se fico a saber se permanecem praticamente mortas ou se já estão só mortas, sem mais nada.

Em primeiro lugar. Correspondendo amavelmente a um convite que lhe enderecei o
Em quarto lugar o comentário e o post do Dito Cujo, propriamente ditos. Não foi minha intenção sugerir que as receitas do petróleo fossem ou pudessem ser igualitariamente distribuídas por cada angolano. Creio ter corrido o risco de ser mal entendido e de, de facto, o ter sido. Mas essas receitas, públicas ou privadas, são geradas em Angola e era em Angola que deveriam ser aplicadas. O que é que o Estado angolano de facto arrecada, quanto fica retido no exterior à ordem de particulares, quanto entra nas contas do Estado são pormenores com que me não preocupo muito face à dimensão do descalabro. Não são José Eduardo dos Santos e o seu mais próximo círculo de amigos que o arrebanham todo mas são, seguramente, os que arrebanham a maior parte. A administração em funções é corrupta? Sem dúvida, da mesma forma que o seria outra se fosse diferente e o será certamente a que se seguir a esta.
Não creio que deva o sacrificado povo angolano aspirar a ficar rico. Como o não deve aspirar o povo saudita, iraquiano ou venezuelano. Angola é um país potencialmente rico com um povo extraordinariamente pobre, concentrando-se nas cidades, esgravatando as lixeiras à procura de sustento e deixando morrer crianças à míngua de alimento. Como a Suiça é um país pobre, sem recursos naturais, com um quarto do seu território coberto por neves eternas, cujo povo acaba por ter um invejável nível de vida, com as necessidades primárias perfeitamente satisfeitas.
Mas o conceito de elite alargou-se, a sociedade a que pertencemos passou a ser um jardim de lindas flores, - a propósito,
Muito simples! Uma pequena notícia na
Você sabe que em Fevereiro vai haver eleições, democraticamente toda a gente deve seguir a sábia orientação do senhor prior, santa como é, dita como o sermão do púlpito abaixo. Mas o nosso governo nem descansa com o tanto que se preocupa connosco e com o nosso bem estar.
Parabéns senhor ministro da
No caso concreto da Invicta - a questão é doentiamente recorrente! - os exemplos de falta de profissionalismo estão espalhados pela cidade. Como o município tem tido direito a um novo presidente todos os quatro anos, excluindo o caso especial do Dr. Gomes cujo segundo mandato, como se verificou, foi uma excepção para que a regra se confirmasse, todos são culpados. Desde a actual vereação até à que, se a memória nos não falha, foi encabeçada por Aureliano Veloso. Quisesse Deus que as vereações fossem profissionais em qualquer coisa, que não fosse no embuste e na venda da banha da cobra que antigamente se fazia em frente à Imperial.
Pronto! Caiu o pano sobre a hipocrisia com que se encena o Natal em cada ano que passa. Apregoou-se a solidariedade, pregou-se a fraternidade, exprimiram-se sentimentos de dorida compaixão para com os indigentes, os vadios, os que nada devem nem à sorte nem tão pouco à dignidade. Num gesto único e pensado, responsáveis políticos interromperam as suas muitas tarefas e desceram ao povoado. Convocaram profissionais da comunicação, chamaram televisões e foram, de fato e gravata, participar nas cerimónias surrealistas dos jantares de bacalhau e batatas, servidos a pobres sem eira nem beira. Que não têm, em todo o dia, uma refeição quente, um alpendre onde se abriguem, um catre onde durmam duas horas.
É altura de parar um pouco e pensar. Naquilo que somos, naquilo que desejamos ser e naquilo que de facto deveríamos ser. Todos! Termos consciência de que nenhum de nós, por si, consegue "endireitar o mundo" mas que essa certeza, também só por si, não implica que todos desistamos. Aos dias que correm falta humanismo, falta solidariedade, falta uma visão de futuro da espécie. Pensemos por estes dias mais nos outros do que em nós próprios. Admitamos que sendo cauda da Europa há muitos mais depois de nós do que antes. Concordemos que nenhuma sociedade é minimamente justa enquanto seres humanos, iguais a nós, morrem à míngua de alimento. Que crianças inocentes, frágeis e indefesas morrem todos os dias. Subalimentados, estropiadas, sem cuidados mínimos de saúde.

Sento-me aqui no alto da arriba, sobre uma pedra solta que me magoa mas me não foge. Olhando o mar bravio que vai mais longe dos que os olhos com que vejo. Cercado por ventos assustados que varrem as cinzas que ainda restam dos incêndios e agitam frágeis troncos secos de cardos que me picam os pés quando caminho. Para além disto o dia está calmo, não se vê vivalma, o céu cinzento não ameaça chuva nem sol. Ouvi de caminho que hoje começa o inverno, que este é o dia mais pequeno do ano, que nos ficam pela frente três meses de maiores sofrimentos e de mais curtas esperanças.

O presidente da Câmara afirmou um destes dias, num arrevesado olhar sobre o Porto, que
Hoje. Depois da missa. Embuçado por esta morrinha fria de domingo. Colado às paredes, evitando as portas do comércio aberto para o Natal do consumo imprevidente. Passei à
Se não existisse Portugal tinha que ser inventado. Quanto mais não fosse pela originalidade. É quase certo que, doravante, a União Europeia permitirá que o país viole as suas regras, exceda os limites estabelecidos para o défice, atropele a transparência de algumas leis eleitorais, falte aos Conselhos Europeus. Os atiradores furtivos de que fala Portas serão equipados pelo seu ministério com espingardas novas, para a caça nas coutadas e o tiro fortuito nas avenidas novas. Devem acautelar-se os frequentadores do Galeto, os parzinhos do Campo Pequeno e os transeuntes da Duque de Ávila.
A Câmara de Gondomar não é uma autarquia, é um circo. Não daqueles circos que pela quadra que se atravessa por aí surgem para assentar arraiais no Coliseu do Porto, nos terrenos do Lima 5 ou até da Rua de Faria Guimarães e que rapidamente debandam depois do enterro do ano velho e de consumado o baptizado do ano novo. É, ao invés, um circo permanente, que se mantém em cartaz, apenas decretando os fins de semana como dias de descanso. Para ir à missa de manhã e à bola de tarde. Não se compreende sequer que se aguente em cartaz durante tão longo período, tão curto e tão pouco diversificado é o seu elenco.
Tenho percorrido a Rua de Santa Catarina mirando as prenditas que poderia comprar para as crianças e enjoando com os preços que, não sei porque razões, me causam náuseas, vómitos e até aquela coisa que deu ao Vítor Baía no Japão e que, em Portugal, não sei como se chama. E as crianças o senhor sabe como são: querem patins em linha, bicicletas, play stations que, mesmo sem recibo e recorrendo ao crédito pelo telefone, custam os olhos da cara.
Mas Deus me acuda que mais surrealista ainda é a argumentação desfraldada pelos vereadores socialistas. O propósito está correcto e estes seis homens bons de que a cidade se orgulha e que os funcionários respeitam, comandados pelo engenheiro Gaspar na condição de chefe de quina, entendem que «a fórmula como se tem procurado levar os moradores a comprar tem sido incorrecta», porque muitos «preferem pagar o aluguer a ter a responsabilidade do condomínio e da contribuição autárquica». E lembra-se ainda que a prova de que a fórmula é errada é o facto de, em 2004, em 723 casas municipais, só cinco foram vendidas. Além disso, objectivamente, o orçamento é «demasiado restritivo e redutor». Não diz em quê nem isso são contas do nosso rosário, mas um orçamento demasiado restritivo já é uma afronta. Como se isso lhe não bastasse ainda faltava que fosse redutor. Redutor é que nunca, ó santa Câmara, nem por cima dos nossos cadáveres, que fique expresso. Ainda por cima quando isso tem a ver com «os caminhos de alguma incerteza nalgumas rubricas, principalmente das despesas e receitas». O problema, pelos vistos, é de marketing e de falta de empenho dos vereadores-vendedores que não atingiram os objectivos, mesmo que tivessem em mãos um produto de primeira necessidade, como as batatas da Póvoa ou os nabos de Gondomar que, como se sabe, as lojas do Continente vendem sem anúncios e sem demonstradores.
O país, hipocondríaco, é dado à depressão e atreito à maleita. Em qualquer merda vê um vírus e inventa uma doença. Como não fomenta a investigação, deprime-se. Quando se não deprime vai à bola, bebe e fuma para esquecer. Quando pensa que já esqueceu tudo está velho, de longas barbas brancas, especado na zona do Restelo à espera da passagem das naus. Para felicidade do ministro da saúde não consta das listas de espera e já nem vale a pena que se inscreva para a consulta. Já lhe não sobra nem juventude, nem fígado, nem pulmões.
O presidente da Câmara Municipal do Porto apresentou o Orçamento da vereação que dirige para o ano de 2005. Salientou, como é politicamente natural e eticamente incorrecto, os factores que mais lhe convêm. Referiu, como bandeira, que a preocupação da Câmara continua a ser a habitação social e que o item é contemplado com 20 milhões de euros - 4 milhões de contos -, ou sejam mais 172 por cento do que no ano anterior. O que significa que o orçamento anterior, também da sua responsabilidade, se ficou por pouco mais de 7 milhões de euros - menos de 1,5 milhões de contos - cujo peso no orçamento global, a considerar a pouca informação publicitada, não atinge dez por cento.
Segundo os jornais de caserna desta manhã, e depois da concludente derrota de ontem no Restelo, os órgãos mandantes do Benfica reuniram-se de emergência, incluindo o presidente e o capataz da SAD.
Mesmo com algum atraso permitam-me que invoque a edição de sexta-feira passada, dia 10, do
Passaram ontem 150 anos sobre a morte de Almeida Garrett, nascido no Porto, desembarcado em Pampelido e falecido em Lisboa. No Porto é natural que se ignorem ou se hostilizem os seus filhos, especialmente os que maior notoriedade obtiveram e aos quais a cidade deveria estar mais reconhecida. Não é nenhuma novidade, a vocação endémica da cidade é fazer demolições, abrir buracos nas ruas, prolongar indefinidamente quaisquer obras e construir de raiz aquelas que ninguém sonhou se serviriam para alguma coisa. E que, de facto, acabam a não servir para coisa nenhuma.